“O Estado monitora o Rio Jari o tempo todo, em caso de catástrofe saberíamos”
Um dos técnicos mais respeitados – e bastante experientes – do Estado, o arquiteto e urbanista Alcyr Mattos foi ao rádio ontem (19) traçar um raio-x da situação que se observa no Sul do Amapá, onde o Rio Jari subiu bastante e cuja enchente atingiu quase 4 mil residências durante a semana. Em entrevista ao programa Conexão Brasília na Diário FM, o especialista explicou didaticamente como o problema acontece rotineiramente e como a Defesa Civil monitora para que não se agrave. Até que uma solução definitiva possa ser encontrada, o papel do poder púiblico tem sido o de prestar assistência às vítimas, com a preocupação premente de evitar o consumo da água na situação que a cidade se encontra, submersa e com tudo sendo conectado pela mesma maré.
CLEBER BARBOSA
DA REDAÇÃO
Diário do Amapá – O senhor tem sido visto com muita frequência nas redes sociais agora, compartilhando as obras em andamento, mas também quanta coisa que tem por ser arrumada, n ão é?
Alcir Matos – Verdade, eu por dever de ofício ando muito pelo estado, que tem mesmo lugares exóticos que chamam muito a atenção. Mas sobre as redes sociais, decidi sim abrir uma conta no Instagram, até mesmo para seguir o governador… [risos] Mas depois eu vi que a gente podia agregar muita coisa nova e de conhecimento para a população nessas viagens, seja uma obra em andamento, um trecho ruim de estrada, uma escola nova, enfim, outro dia foi um vídeo lá na Ilha do Sol, que fica entre Saint George [Guiana Francesa] e Oiapoque [Brasil], no meio do rio que é binacional, então tem até dúvida se ela [a ilha] é francesa ou brasileira.
Diário – É onde tem um restaurante?
Alcir – Isso, onde tem um restaurante, administrado por dona Valéria e seu Francisco. Existe uma disputa internacional sobre essa ilha, infelizmente. Mas essa passada lá também chamou a atenção de muita gente, pois ele é um mato-grossense, ex militar, com um discurso assim nacionalista, já ela é de Santa Catarina e o restaurante é de excelente qualidade.
Diário – Mas acaba funcionando mesmo como uma ferramenta de controle social essas postagens nas redes sociais não é secretário?
Alcir – Verdade, são muitas obras, como a Escola de Música Walkíria Lima, com as fotos do andamento da obra, inclusive neste sábado, quando seguirei daqui a pouco para a comunidade do Cedro onde faremos a entrega de um novo centro comunitário e também a Escola Darcy Ribeiro que vai ser entregue linda, que já está inclusive sendo utilizada pela comunidade, pois o apelo era muito grande, mas que o governo faz questão de fazer a entrega formalmente, uma grande escola. O governador já saiu antes pois participa de um casamento no Bom Jesus, então a gente registra essas coisas e vai compartilhando.
Diário – E sobre essa nova UPA 24 Horas secretário, a expectativa era grande também por suas postagens que só aumentavam a curiosidade sobre a inauguração, não é?
Alcir – Sim, desde as primeiras visitas eu mesmo já fiquei maravilhado com a UPA Zona Sul, pelo tipo de atendimento, de hospital de primeiro mundo, até exames mais simples como raio-x em que você pode imprimir na hora e laudar à distância através da Internet, enfim a tecnologia só vem para ajudar nessas respostas mais rápidas e mais precisão no diagnóstico.
Diário – E foi bastante concorrida a cerimônia de entrega, com a abertura para atendimento da população logo em seguida.
Alcir – Sim, além de bonita, essa obra também como toda obra hospitalar, é bom que as pessoas possam ter essa compreensão, custa “x” para ser construída, o espaço físico, mas você gasta mais “2x” para você equipar e colocar material humano capacitado. Então isso para você ver o custo do sistema público, então o espaço físico é preponderante para o atendimento, mas na saúde ele não é determinante, pois representa apenas um terço de todo o processo de investimento para garantir o atendimento. Então para nós estamos muito felizes com essa obra, pois a zona sul terá a sensação de estar num hospital particular, diante da humanização no atendimento que o governador tanto defende.
Diário – O senhor também esteve na comitiva do governador que foi à Laranjal do Jari, como foi essa experiência secretário?
Alcir – Uma situação impressionante, pois você vê toda aquela calamidade pública com a cidade atingida pela enchente, mas não observa tristeza nos olhos da população, ao contrário, vê até alegria, de uma gente que já está acostumada a conviver com aquilo. Eu morei em Marabá [PA] muito pequeno, meu irmão caçula nasceu lá, e eles tinham também esse convívio com as cheias do Rio Tocantins, muito parecido com o que ocorre no Jari, só que o Jari é mais pujante, é bem mais populoso que Marabá daquela época, na década de 1960.
Diário – Pois é secretário, num dos vídeos sobre esse drama do Laranjal do Jari as pessoas foram vistas dançando, tomando uma cervejas e ouvindo música em meio à enchente. Como assim?
Alcir – Pois é, para você ver como cada pessoas sente aquilo. E as crianças principalmente meio que até alheias a tudo isso, brincando na água e até se arriscando na marola que a passagem das embarcações provoca. Mas mesmo assim, com todo aquele caos instalado, com o governo lá dando toda a assistência, num trabalho conjunto, como o incansável Corpo de Bombeiros, num trabalho diuturno de monitoramento das marés, chegando a picos de 2,77 metros, mas eu acredito que também em função das chuvas, então como estamos indo agora para o quarto crescente, acredito a tendência é chover menos na Bacia Amazônica toda, que é o que tem cooperado na realidade e não outras coisas como se especula, como o excesso de muro de arrimo.
Diário – Ainda tem essa questão, não é? As versões ou explicações para a origem do problema.
Alcir – Sim, algumas pessoas chegaram a falar disso também. Mas a situação do Jari se agrava toda vez que aumenta o nível do Rio Amazonas, aqui em baixo, pois era para ele estar absorvendo essa demanda de água que desce o Rio Jari, mas ele também está no nível mais alto também, então é isso o que acontece quando a gente tem as enchentes em Laranjal do Jari, que é um imenso Vale, numa planície do Rio Jari.
Diário – Existe também uma preocupação com os reservatórios da usina hidrelétrica daquela região, como acontece o monitoramento dessas barragens secretário?
Alcir – Da mesma forma, tudo é monitorado quase que instantaneamente pela Defesa Civil, online, através do comandante dos Bombeiros, o coronel Wagner, com informações do índice pluviométrico, do volume de água, enfim. Existem duas estações meteorológicas, uma vinte horas acima da cidade e outra na própria hidrelétrica de Santo Antônio, construída pela empresa EDP. Então qualquer catástrofe pode ser prevista, como se chover muito no Tumucumaque e essa água carrear mesmo, essa estação meteorológica lá em cima nos avisa.
Diário – Daí essa aparente tranquilidade da população, mas existem outras demandas que precisam ter um atendimento permanente, não é mesmo?
Alcir – Sim, uma delas é o fornecimento de água potável. Nós não podemos permitir que a população consuma aquela água na situação atual, pois a maior incidência de doenças relacionadas ao consumo inadequado da água, problemas estomacais, vômitos e diarreias, mas também ocorrências com animais peçonhentos como cobras, escorpiões, aranhas e alguns outros acidentes com animais, pois quando a água sobe os animais sobem junto. Eu mesmo vi uma árvore com um monte de ratos em cima, escondidos.
Diário – Tirar essa população da beira do rio é que é difícil, não é?
Alcir – Verdade, infelizmente. Foram várias tentativas. Elas têm uma relação com o rio. Na verdade uma vida com o rio.
Perfil…
Entrevistado. Alcir Figueira Matos graduou-se em 1991 em Belém (PA) pela Unama (Universidade da Amazônia) em Arquitetura e Urbanismo. Possui MBA em Gestão Pública pela Fundação Getúlio Vargas. Ocupou o cargo de Diretor Técnico das empresas municipais Endesur e extinta Urban. Exerceu a função de secretário estadual de infraestrutura (Seinf) na gestão do Governador Waldez Góes no período de 2004/2010. Ele é analista de infraestrutura do governo do Estado lotado na Seinf. Assumiu em 2015 a Secretaria Estadual do Desenvolvimento das Cidades, que tem exercido forte interlocução com prefeituras, câmaras e demais segmentos do poder público e da sociedade civil para propor soluções para os problemas urbanos dos municípios do estado do Amapá.
Deixe seu comentário
Publicidade