Nota 10

A arte plástica de R. Negrão

Wellington SilvaEspecial para o Diário A arte plástica de R. Negrão evoluiu bastante. Fui ver de perto sua exposição, a convite de Gibran Santana.Na Biblioteca Pública Elcy, Lacerda,vi e me surpreendi bastante com o que vi. Senti um R. Negrão amadurecido pelo tempo, muito mais consciente do seu papel de divulgador da natureza amazônica, do […]


Wellington Silva
Especial para o Diário

A arte plástica de R. Negrão evoluiu bastante. Fui ver de perto sua exposição, a convite de Gibran Santana.Na Biblioteca Pública Elcy, Lacerda,vi e me surpreendi bastante com o que vi. Senti um R. Negrão amadurecido pelo tempo, muito mais consciente do seu papel de divulgador da natureza amazônica, do cotidiano tucuju, suas tradições, costumes, nosso marabaixo, a profissão de fé e traços de nosso povo. Navega com sua arte pelo expressionismo, surrealismo e abstracionismo, com temáticas quase sempre focadas no naturalismo regional.

Chamou-me atenção à obra PAZconstruída numa simbologia simples e bela que expressa exatamente esse sentimento divino, assim como o coração em alto relevo, instrumento central de nossas emoções.

Logo no hall de entrada da biblioteca o visitante/observador pode notar a imagem em óleo sobre tela de Nossa Senhora, ladeada de querubins. A Mãe do Mestre dos mestres é alvo de agradecimentos de amapaenses e paraenses nesta primeira quinzena de outubro quando peregrinos com a imagem da Santa visitam hospitais públicos e repartições públicas, para depois ocorrer a grande procissão. A história da humanidade é permeada de imagens e representações simbólicas.

Mais adiante, uma bela mensagem reflexiva: A Gloriosa Escada de Jacó, com os dizeres: Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Nota-se um espelho estrategicamente e propositalmente colocado no último degrau, final da escada. O que R. Negrão quer dizer, ou melhor, que mensagem quer passar? Talvez seja: Conhece-te a i mesmo, ao olhar nossa “careta” no espelho. E mais: Bateis e sereis atendido, pedis e recebereis, buscais e encontrareis. Traduzindo: A cada um segundo suas obras.
O cotidiano do trem de Serra do Navio, nas suas históricas idas e vindas, levam e deixam passageiros a seus destinos, assim como nosso manganês e outras riquezas, a rumos ignorados. Navios vem e vão, vão e vem, levando o velho sonho do Eldorado. Tudo é memória nas pinceladas de Negrão.

Noto também belas morenas, esculpidas, de curvas sensuais, quase vivas, mostrando uma beleza típica como genética natural e histórica de nossa gente. Em verdade, somos uma combinação de raças, sim porque a outrora Vila de São José de Macapá foi habitada por gente vinda da capital do Grão-Pará. De lá, traziam negros escravos.Os colonizadores, aqui radicados, capturavam nativos da região para trabalhos forçados na construção da Fortalezade São José de Macapá, inaugurada em 1782. Os nativos foram a maior força de trabalho nesta penosa empreitada. O velho forte é, por assim dizer, bem retratado por R. Negrão em diferentes formas ou ângulos, assim como a Igreja de Nossa Senhora da Conceição, localizada no bairro do Trem, ambiente cultural onde o artista foi criado.

Tive o grande prazer de conhecer o artista em1983 quando foi realizado o II MOAP, o Movimento Artístico Popular do Amapá, em dezembro, na Praça da Bandeira, sob a liderança do saudoso R.Peixe, o consagrado decano da pintura amapaense. O pintor foi um dos fundadores do MOAP juntamente com Peixe, Estevão da Silva, FranckAsley, J. Salis, Beto Peixe, Reginaldo Almeida eIrê Peixe. Durante a organização do II MOAP vi como até hoje vejo um R. Negrão sempre muito focado em tudo aquilo que faz. E faz com muito zelo. A exposição plástica por ele organizada na praça tinha todo um cuidado. Tudo era muito simétrico, espaços calculados, painéis estrategicamente perfilados. Os quadros de expositores seguiam a seguinte regra de avaliação: tamanho e temática. As melhores obras ele discretamente destacava.

Vale destacar a crítica do professor Fernando Medeiros, de 21 de agosto de 1980, sobre o prematuro talento do artista:

“R.Negrão foi estudante do Curso de Saúde do Colégio Amapaense, no Centro Interescolar. Desde criança sededica a arte de pintar. Foi durante o curso primário que recebeu seu primeiro incentivo para o desenvolvimento de sua arte após obter a melhor nota em desenho. E é o que faz até hoje, desenvolver potencialmente sua arte, sem nunca ter frequentado curso de pintura. Às vezes, doa suas obras aos amigos como forma de difundir sua arte. Classifica seu estilo como surrealista muito embora nunca tenha tido uma formação acadêmica”.

R. Negrão já expôs no Maranhão, Salvador (Bahia), em Belém do Pará,Fortaleza, Recife, Brasília, Goiânia, São Paulo, João Pessoa, Sergipe e Guiana Francesa.


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