Diário Política

Procurador-geral da República emite parecer sobre retotalização de votos questionada no Supremo Tribunal Federal

Julgamento da ação no STF pode provocar alterações na bancada de deputados federais do Amapá


 

Paulo Silva
Editoria de Política

 

O procurador-geral da República, Augusto Aras, emitiu parecer pela procedência parcial da ação direta de inconstitucionalidade (ADI), com pedido de medida cautelar, proposta pelos partidos políticos Podemos e Partido Socialista Brasileiro (PSB) acerca da retotalização de votos segundo o critério de corte dos 20% do quociente. A ADI tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) e tem como relator o ministro Ricardo Lewandowski.

 

Augusto Aras opina favoravelmente tão somente para conferir interpretação conforme à Constituição ao inciso III e ao parágrafo 2º do artigo 109 do Código Eleitoral, a fim de que, esgotados os partidos políticos e federações partidárias com os 80% do quociente eleitoral e candidatos com votação nominal de 20% desse quociente, as cadeiras eventualmente vagas sejam distribuídas a todos partidos e federações, segundo as maiores médias, dispensadas tanto a exigência da votação individual mínima quanto a do alcance de 80% do quociente eleitoral.

 

A decisão do STF no julgamento da ação direta de inconstitucionalidade pode provocar alterações na composição da bancada do Amapá na Câmara dos Deputados.

 

O Podemos e o PSB arguem que “a Lei 14.211/2021 promoveu profundas reformas no sistema eleitoral e, dentre as diversas alterações promovidas, destaca-se a distribuição das vagas das sobras”. Alegam que a lei previu duas “cláusulas de exclusão” para que um partido político pudesse participar da distribuição das sobras: a) alcance de, no mínimo, 80% do quociente eleitoral; b) existência de candidato com votação individual mínima de 20% do quociente eleitoral.

 

Segundo defendem “se o partido não atender, cumulativamente, às duas cláusulas, não pode, em tese, participar da distribuição das sobras”. Os partidos questionam “como distribuir as (…) últimas vagas das sobras quando nenhum partido atende, cumulativamente, às duas exigências de partido com 80% do quociente eleitoral e candidato com 20% do quociente eleitoral”. A resposta estaria no inciso III do artigo 109, do Código Eleitoral, dispositivo que, na interpretação levada a efeito pelos requerentes, determina que as cadeiras sejam destinadas aos partidos políticos que apresentarem as maiores médias, “sem qualquer res trição”. Acontece que não foi essa a interpretação do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). No caput e no parágrafo 4º do artigo 11 da Resolução TSE 23.677/2021, ficou definido que, quando não houvesse mais candidatos com votação mínima de 20% do quociente eleitoral, as cadeiras seriam distribuídas aos partidos que apresentem as maiores médias, dentre aqueles que tenham obtido 80% do quociente eleitoral.

 

Os autores da ADI consideram equivocada essa interpretação, dizendo que, “caso a norma quisesse atribuir essa restrição nessa fase do artigo 109, inciso III, do Código Eleitoral, teria apenas afastado a exigência de votação nominal mínima, e não faria referência expressa ao afastamento das duas exigências cumuladas: partidos que tenham obtido pelo menos 80% do quociente eleitoral + candidato com votação nominal mínima de 20% do quociente eleitoral”.

 

Argumentam que, “com base no pluralismo político, na igualdade de chances e no voto como valor igual para todos, na literalidade do artigo 109, III, há de ser dada interpretação conforme ao parágrafo 4º [do art. 11] da Resolução TSE 23.677/2021 para declarar que, havendo vagas e não existindo mais nenhum partido que atenda à regra cumulativa do 80/20, todos os partidos devem participar da distribuição das sobras, sendo as vagas conferidas ao partido que atingir as maiores médias”.

 

Eles defendem que essa interpretação “beneficia as pequenas agremiações que obtiveram votação expressiva no pleito (…) e prestigia a vontade popular expressada nas urnas”. Trata-se, segundo os requerentes, de “critério de distribuição de vagas remanescentes que promove um acesso mais igualitário das minorias participativas no processo eletivo (princípio da igualdade de chances)”. Isso porque, “ao se considerar no cômputo das sobras eleitorais todos os partidos que participaram do pleito, permite-se que agremiações menores, geralmente vinculados à defesa de demandas de grupos socialmente minoritá rios, tenham representação parlamentar, evitando-se que candidatos bem votados de siglas que não alcançaram o quociente eleitoral fiquem de fora do cálculo”.

 

Apontam também violação dos princípios da legalidade, da separação dos poderes e da anualidade eleitoral. Arguem que a Resolução TSE 23.677/2021 constitui norma inovadora, que criou “restrições de direitos ou cláusulas de exclusão não previstas na lei”. Ademais, “quaisquer inovações normativas trazidas [pela Resolução TSE 23.677/2021], que não sejam previstas em lei, somente podem ser objeto de aplicação no pleito de 2024, já que a referida norma foi publicada menos de um ano antes do pleito de 2022”.

 

Por fim, requerem a procedência do pedido “para conferir interpretação conforme à Constituição da República, possibilitando que na terceira fase da distribuição das sobras no cálculo das maiores médias sejam contemplados todos os partidos que participaram do pleito, independentemente do quociente eleitoral alcançado, em atenção aos princípios estabelecidos na Constituição”.

 

Para Augusto Aras, a exigência de que partidos políticos e federações partidárias alcancem 80% do quociente eleitoral e candidato com votação nominal de 20% desse quociente, para participarem da distribuição de cadeiras remanescentes, não há de ser aplicada na terceira etapa de distribuição de cadeiras da casa legislativa (“sobra das sobras”), sob pena de interditar o acesso, em espaço já significativamente reduzido, das pequenas legendas no sistema proporcional, em afronta ao pluripartidarismo e ao princípio da igualdade de chances.

 


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