“Repressão ao tráfico de drogas reduziria número de presos”
A semana foi marcada também pelo “aniversário” no dia 31 de agosto, do Primeiro Comando da Capital (PCC), uma das organizações criminosas mais influentes do Brasil,com ramificações também no Amapá. Especialista fala a respeito.
Cleber Barbosa
Da Redação
Diário do Amapá – O senhor é autor do livro “Laços de Sangue – A História Secreta do PCC”, que oferece insights profundos sobre o nascimento e a ascensão da organização, mas como se tornou uma especialista em PCC?
Márcio Christino – Não é que eu me especializei no PCC. Eu estava no lugar certo, na hora provavelmente errada. Era um momento onde o PCC ainda não tinha ganhado essa amplitude, foi antes da megarrebelião. Eu trabalhava investigando abuso de autoridade, crimes praticados contra presidiários, espancamento por policiais, torturas. Quando ouvia os presos, eles faziam referência ao “partido”. Comecei a perceber que existia alguma coisa ali. Nesses casos, o preso era a vítima, não réu, então ele tinha uma tendência a se abrir mais para nós [do MP]. Com essa informação, avisei o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) e comentei o caso com o Roberto Porto, que era meu colega na época. Eu continuei acompanhando as investigações até que veio a megarrebelião de 2001. Quando isso ocorreu, o impacto político-social deles cresceu muito. Daquele momento em diante, o PCC passou a ser notoriamente reconhecido. A partir dali, os trabalhos foram intensificados. Como eu já tinha esse contato com os presos, foi natural que eu também participasse dessa apuração. Meses depois da primeira operação, fui designado para compor o Gaeco e comecei a me concentrar nessas investigações.
Diário – Como estão essas investigações hoje em dia?
Márcio – Já estamos em uma segunda geração de investigadores. Temos promotores excelentes, que estão produzindo operações como a ethos [que prendeu advogados suspeitos de envolvimento com o PCC]. Nesses 16 anos, surgiu a Lei das Organizações Criminosas (Lei 12.850/2013), que modificou as formas de investigação.
Diário – Algum ex-integrante do PCC já firmou acordo de delação premiada?
Márcio – Sim. Um dos fundadores do PCC, o José Márcio Felício, vulgo Geleia, Geleião, Cavalo Branco, fez delação premiada em uma época em que esse instrumento estava previsto na Lei de Proteção a Testemunhas (Lei 9.807/1999). Eram formatos ainda primários, não tinha o contorno que tem hoje, mas já naquela época ele fez delação premiada. Inclusive foi ele que trouxe a prova direta da participação do Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, no esquema, o que levou à condenação dele e de outros líderes que à época comandavam o Primeiro Comando da Capital. Foi a primeira condenação específica por chefiar organização criminosa, em um processo que só tinha esse objeto, e acabou dando certo. Também houve alguns personagens menores que fizeram delação premiada.
Diário – Houve alguma delação premiada nos moldes da Lei de Organizações Criminosas?
Márcio – Se houve, eu desconheço. Mas, cedo ou tarde, isso acontecerá. Estamos vendo o efeito das delações premiada nas grandes operações. E o mecanismo está começando a se espalhar, deixando de ser um mistério. Assim, os envolvidos começam a ter ideia de que isso pode acontecer.
Diário – Como o PCC se difere de outras facções criminosas, como Comando Vermelho, Terceiro Comando da Capital ou Amigos dos Amigos?
Márcio – Essas facções têm uma história diferente. O Comando Vermelho surgiu muito antes, na prisão de Ilha Grande (RJ), fruto da ligação entre presos políticos e presidiários comuns. Já o PCC surgiu de um grupo de indivíduos que queriam criar o que seria, para os norte-americanos, um sindicato do crime. Ou seja, uma aliança entre os grandes líderes de quadrilhas de criminosos que tinham uma ascendência muito grande. Esse é o elemento comum que havia. Eles tinham uma ascendência muito grande sobre a massa carcerária, então criaram essa liderança com o intuito de comandar de dentro dos presídios as ações fora, e também de dominar os presídios impondo a força deles sobre o Estado. Isso aconteceu antes de 1993, mas foi nesse ano que eles formalizaram a existência do grupo com uma rebelião — na verdade, com dois homicídios, que foram praticados em 31 de agosto de 1993 na Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté. Eles eram sete, e tiveram essa ideia de fazer um avanço inicial. A partir de lá, foram crescendo. Mas o PCC é fruto dessa ideia de dominação externa. Ou seja, o PCC surgiu de forma diferente do Comando Vermelho. As facções que vieram depois são espelhos do que o PCC fez, porque como a organização foi considerada “bem-sucedida”, passou a criar espelhos, e esses espelhos são facções ou microfacções, que ou são rivais aqui em São Paulo ou buscam reproduzir uma experiência que eles acham exitosa em outros estados. Em São Paulo, o PCC domina mais de 90% do tráfico de drogas.
Perfil
Márcio Christiano – É formado pela PUC/SP e, em 1988, ingressou no MP como promotor de Justiça substituto na comarca de Praia Grande/SP.
Carreira no MP Paulista
– Ele é membro do Órgão Especial do Colégio de Procuradores do MP/SP e já foi secretário da 3ª promotoria criminal na capital. Marcio foi o membro mais votado do conselho superior do MP.
Trajetória Profissional
– Marcio Sergio Christino é uma das principais autoridades brasileiras no combate ao crime organizado.
– Sua experiência e conhecimento no assunto foram consolidados em seu livro “Laços de Sangue – A História Secreta do PCC”.
– A obra traz uma perspectiva única dos bastidores do nascimento e da ascensão da organização criminosa, baseando-se em depoimentos colhidos diretamente de integrantes do PCC.
– Christino discute a trajetória do PCC ao longo dos 30 anos, destacando os desafios enfrentados pelas autoridades e as mudanças nas táticas empregadas pelo grupo.
– Ele aborda como o PCC se adaptou e evoluiu ao longo do tempo, bem como os impactos dessa organização no cenário criminal brasileiro.
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