Nota 10

Morre Wagner Gomes, advogado que lutava em defesa dos menos favorecidos

Causídico foi um amapaense que por mero acaso nasceu em Cametá, no Pará, dizia um amigo


 

Douglas Lima
Editor

 

O Amapá perdeu, nessa sexta-feira, o advogado criminalista Wagner Gomes, após procedimento cirúrgico no Hospital São Camilo. O corpo dele foi cremado. As cinzas serão misturadas às aguas do rio Amazonas em cerimônia ainda organizada pela OAB-AP.

 

Wagner Gomes foi um advogado conhecido no Brasil todo pela competência com que exerceu a profissão, sempre buscando a defesa dos menos favorecidos, o exercício pleno da democracia e a aplicação da justiça com base na ciência do direito, acima de tudo respeitando os ritos processuais e constitucionais.

 

O jornalista Carlos Bezerra costumava dizer que Jorge Wagner Costa Gomes é um amapaense que por mero acaso nasceu em Cametá, no Pará. Se o acaso fez o doutor Wagner vir ao mundo no vizinho estado, foi o esforço e a perspicácia dele que o fez ser conhecido em todo o Brasil, chegando a privar da amizade íntima do presidente Luís Inácio Lula da Silva e também do expressivo ministro da justiça na época, Márcio Thomaz Bastos (in memoriam).

 

 

Como foi o paulista Márcio Bastos, o amapaense Wagner Gomes foi advogado criminalista, um dos mais atuantes e requisitados do estado do Amapá. Os julgamentos do Tribunal do Júri de que ele participou, na defesa ou acusação, chegaram a centenas. Foram poucas as vezes em que o Conselho de Sentença não se convenceu pela tese defendida pelo causídico.

 

Um dos julgamentos mais memoráveis da história do Tribunal do Júri amapaense ocorreu no município fronteiriço de Oiapoque. Foi o caso de um dos homicídios coletivos mais escabrosos já ocorridos, talvez no mundo: a carnificina cometida contra cinco membros da família Magave, no sítio Campo Alegre, município de Amapá, em 1994.

 

Detalhe marcado ainda hoje na memória dos que acompanharam a mortandade foi que a senhora Nadir Magave, de 92 anos de idade, quase cega e com dificuldade de se movimentar, depois de morta ainda teve o crânio esmagado por uma marreta. Outras cenas hediondas do crime também foram lembradas durante o julgamento, desmembrado em três numa estratégia da Justiça para evitar maiores acirramentos dos ânimos na cidade de Oiapoque, para onde a decisão foi levada.

 

O doutor Wagner Gomes atuou efetivamente no julgamento do caso da família Magave. Foi advogado de acusação. Enfrentando pressões de todos os tipos, inclusive econômicas, posto que o mandante do crime fora o fazendeiro Aderbal Távora, ele se manteve firme nas teses que elaborara para atuar no Tribunal do Júri. Convenceu: todos os acusados foram penalizados com dezenas de anos de reclusão.

 

Jorge Wagner Costa Gomes é um ente político de grande influência. Foi um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores (PT) no Amapá, quando esta unidade federativa ainda era território federal, e o então governo militar começava os primeiros procedimentos para a reabertura democrática do país. Foi nesse período que se iniciava a amizade dele com o metalúrgico que se tornou Presidente da República.

 

É emblemático o engano cometido por Lula, devidamente e imediatamente corrigido pelo companheiro Wagner Gomes, por ocasião da primeira visita ao Amapá, mais precisamente a Macapá, do então só metalúrgico político e líder petista. No carro, procedente do aeroporto, onde há poucos minutos desembarcara, Lula percebeu bandeirinhas vermelhas em quase todas as esquinas da cidade e meio de quarteirões. Empolgou-se com aquilo e comentou aos que o acompanhavam no veículo: “Estamos bem, aqui, quase todo mundo é PT”. Logo, o advogado Wagner corrigiu: “Não, essas bandeirinhas vermelhas indicam venda de açaí”.

 

Pelo PT, doutor Wagner Gomes chegou a disputar o Senado da República. Na campanha de todas as eleições gerais e municipais sempre atuou como militante petista, mas não aceitando os novos caminhos tomados pelo partido, deixou a legenda para se alinhar no Solidariedade, partido pelo qual foi candidato a vice-governador do estado.

 

Wagner Gomes era preocupado com a consciência coletiva, elemento que, conforme almejava, tem que ser estimulado em torno de questões como os direitos humanos e a cidadania. Durante as três vezes em que presidiu a Secção do Amapá da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o causídico colocou em prática as suas aspirações contra a injustiça social e a defesa do estado democrático de direito. (Matéria adaptada de publicação, do mesmo autor, da Revista Diário edição de abril de 2016)

 


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