“Em primeiro lugar você deve olhar bem o aspecto do local que você vai comer”
Sempre bem humorado e simpático, em uma recente estada em Macapá num fim de semana, o biomédico Roberto Figueiredo, o conhecidíssimo Doutor Bactéria, esteve palestrando para acadêmicos e também fãs que ele tem aos montes no Amapá. Ele concedeu uma longa entrevista ao jorna- lista Cleber Barbosa, nos estúdios da Rádio Diário FM, durante o programa Conexão Brasília, ocasião em que esclareceu muitas dúvidas e fez alertas importantes sobre os cuidados que todos devem ter para evitar sérios problemas de saúde, especialmente pelo manuseio inadequado de alimentos, um mal hábito que mata por ano mais de 2 milhões de crianças menores de três anos de idade no mundo. Os principais trechos da entrevista o jornal Diário do Amapá publica a seguir. Acompanhe.
CLEBER BARBOSA
DA REDAÇÃO
Diário – Além de biomédico, o senhor é especialista em Marketing, então isso pode explicar toda essa performance em suas palestras, sempre muito concorridas?
Dr. Bactéria – É, mas fiz teatro também, aplicando em minhas palestras, aliás, eu acho que todo mundo, independente do que faz, deveria fazer marketing e teatro, pois a pessoas sempre estão se vendendo, né?
Diário – O tal do endomarketing, é isso?
Dr. Bactéria – Sim, e o teatro é para desinibir mesmo, se soltar mais.
Diário – Então seja bem vindo mais uma vez ao Amapá!
Dr. Bactéria – Olha, para mim é sempre um prazer voltar a Macapá, onde fui super bem recebido, está muito gostoso essa visita, pena que está acabando, já estou com saudades.
Diário – E essa história, de virar o Doutor Bactéria, foi o senhor mesmo que projetou isso?
Dr. Bactéria – Eu até brinco com isso, pois poderia ser pior, já pensou se fosse “doutor Ameba”, “doutor Verme” ou “doutor Parasita”… (risos) Já o doutor Bactéria é simpático, né? Mas começou realmente há um quinze anos atrás, quando entre outras coisas acabei chegando na Rede Record, no programa Note e Anote, da Claudete Troiano. Lá eu era o Caçador de Bactérias, que tinha até musiquinha.
Diário – Depois é que foi para a Globo?
Dr. Bactéria – Isso, depois veio o convite do Fantástico, da Globo, começando com um programa chamado “Tá Limpo”, quando o pessoal da equipe quando ia gravar perguntava “Vamos gravar com quem?”. E diziam “vamos gravar com o doutor”. Mas qual doutor? “O Dráuzio Varela?” Não, aquele doutor que mexe com as bactérias, aí começaram a me chamar de Doutor Bactéria.
Diário – Foi o batismo do nome então?
Dr. Bactéria – Foi sim e depois as crianças gostaram bastante, as pessoas da terceira idade também adotaram, até que um dia eu estava passando gravando sobre a contaminação de lancheiras e um grupo de vinte crianças mais ou menos subiu em um determinado local e gritaram assim: “Doutor Bactéria, nós te amamos”, uma coisa que não sei nem falar, sei que pegou. Mas é um personagem que leva informação para as pessoas.
Diário – Mas doutor e essa preocupação com as bactérias, começou quando, foi antes mesmo da formação acadêmica?
Dr. Bactéria – Bom, eu sempre gostei da parte de microbiologia e escrevi um livro, faz tempo já, voltado para a indústria, chamado Programa de redução de patógenos (Editora Manole, 2002), um nome bem pesado, né? Só que chegou muita informação para mim, como o fato de que 3 milhões de crianças morrem todo ano por diarréia, menores de cinco anos de idade. E desses 3 milhões, 2 milhões e 100 mil morrem por manipulação incorreta de alimentos. E das intoxicações, 44% das doenças alimentares estão dentro da residência [dos pacientes] e não tinha um livro, nenhuma publicação que fosse direcionado para as donas de casa, falando a linguagem delas.
Diário – E foi quando o senhor decidiu dedicar-se especificamente a essa demanda?
Dr. Bactéria – Larguei tudo e comecei a trabalhar com donas de casa, para levar essas informações a elas, de um jeito todo próprio.
Diário – O seu famoso bom humor?
Dr. Bactéria – Pois é, eu brinco bastante que aqui no Brasil ninguém erra, mas na Itália o pessoal é terrível.
Diário – Como assim?
Dr. Bactéria – Na Itália as pessoas colocam ovos na porta da geladeira, pessoas lavam carne, colocam as frutas em fruteiras, fervem leite, acham que a carne de porco pode ter um bichinho que vai para a cabeça, essas coisas estão todas erradas, e ainda na Itália as pessoas entregam a pizza em caixas de papelão, olha que absurdo?
Diário – Sei… Na Itália.
Dr. Bactéria – Ainda bem que isso não acontece no Brasil… (risos) Imagine que na Itália as pessoas pegam a lata de leite condensado e fazem dois buraquinhos e como demora para sair acabam soprando.
Diário – É uma forma bem humorada de orientar, sem dúvida.
Dr. Bactéria – É, isso sem falar que na Itália o pessoal sopra bolo de aniversário. E tem gente que come, fala que o bolo está “molhadinho”, com aquele bando de cuspe que cai…
Diário – O senhor já tem quatro obras publicadas, não é mesmo?
Dr. Bactéria – Quatro obras, mas tem o mais recente, que não gosto de dizer que é o último, mas sim o mais recente, é o quinto, o “Doutor Bactéria”, pela Editora Globo, que assim que chegou alcançou o segundo lugar, pelo que disse a Veja [revista semanal], como um dos livros mais vendidos aqui no Brasil, o que é muito gostoso de você fazer, partindo do zero e as pessoas aceitam, né?
Diário – O brasileiro tem o hábito de comer muito na rua, um lanche rápido ou uma refeição mesmo. Que dicas o senhor pode dar com relação aos cuidados com a contaminação?
Dr. Bactéria – Em primeiro lugar você deve olhar bem o aspecto do local que você vai comer. Se a pessoa que vai te servir está com a roupa suja, aquelas unhas compridas e mal tratadas, o uniforme sem proteção do cabelo, sem condição de higienizar a mão, se não tiver usa álcool em gel. Aquele famoso churrasquinho, por exemplo, o espetinho de gato famoso, que espero não ser gato. Bem, peça para a pessoa assar sempre na hora, nunca um que está pronto, não aceite de maneira alguma, pois na hora você sabe a qualidade da carne. Outra coisa, nunca passe naquela farinhazinha que tem do lado, pois ela foi feita para passar uma vez e ir embora só que aqui no Brasil as pessoas passam uma vez, pega uma bebidinha dão uma mordidinha e passam na farinha, dão uma mordidinha e passam na farinha, enfim, aquilo vira um mingau de baba…
Diário – Falando assim, dá um nojo, mas as pessoas nem percebem isso na hora, não é?
Dr. Bactéria – E já está comprovado a partir de um estudo de uma Universidade de Fortaleza (CE) as pessoas encontraram o “helicobacter piloren”, o “h pylor” nessa farinha. É uma bactéria da gastrite que é transmitida pela saliva.
Diário – Já que o senhor enumerou vários erros comuns, e os instrumentos da modernidade, como o celular, que as pessoas costumam levar para dentro do banheiro?
Dr. Bactéria – O celular é mais contaminado do que uma sola de sapato. A explicação é porque as pessoas falam e saem gotículas de saliva e uma gota de saliva tem bilhões de bactérias. Então quando a pessoa usa o telefone no banheiro isso potencializa, pois ele é um verdadeiro vetor, ou seja, ele carrega, transporta bactérias de origem fecal, da saliva, vírus como o da gripe, a candidíase bucal, o popular sapinho e por aí vai. Por isso as pessoas tem que fazer pelo menos uma vez por semana pegar álcool isopropílico e passar com uma toalinha de papel no celular levemente, não vá jogar o álcool em cima, você não mata a bactéria por afogamento, mas sim pelo contato! [risos]
Diário – Muito obrigado por sua entrevista.
Dr. Bactéria – Eu é que agradeço e espero voltar logo a Macapá. Podem me achar no facebook.
Perfil…
Entrevistado. Roberto Martins Figueiredo ficou conhecido como Dr. Bactéria ao participar do quadro ‘Tá limpo’ do programa Fantástico. Na série, ele falava dos perigos microscópicos que se escondem no cotidiano, esclarecendo dúvidas sobre contaminação de alimentos, higiene, saúde pública e temas relacionados. Especializado em Saúde Pública e em Marketing pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e em Engenharia da Qualidade pela Universidade de São Paulo (USP), Roberto Figueiredo é autor dos seguintes livros Guia prático para evitar doenças veiculadas por alimentos (Editora Manole); Programa de redução de patógenos (Editora Manole, 2002); As armadilhas de uma cozinha (Editora Manole, 2002); entre outras publicações.
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