“As Forças Armadas demonstram sinais concretos de respeito à democracia”
Mais jovem senador brasileiro da atual legislatura, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) concedeu entrevista exclusiva ao jornalista e radialista Luiz Melo, e falou sobre a realidade política brasileira. Nascido em 1972 em Garanhuns, interior de Pernambuco, Randolfe Frederich Rodrigues Alves mora no Amapá desde os oito anos de idade, graduou-se em história pela Universidade Federal do Amapá (Unifap), onde atualmente é professor de Direito Constitucional. Assim como seu pai, foi filiado ao PT. Em 1998, em sua primeira disputa eleitoral, Randolfe foi eleito deputado estadual do Amapá, reelegendo-se em 2002. Deixou o PT em 2005 para se filiar ao Psol, elegendo-se em 2010 para o Senado com a maior votação no estado. Agora é da Rede Sustentabilidade.
Jornalista Luiz Melo – O recurso apresentado pelo senhor na Comissão de Constituição e Justiça do Senado para cassar o senador Aécio Neves não passou, e por isso o senhor disse que o decoro no Senado perdeu o sentido e que o Senado a partir de agora passa a ser cenário de debates pequenos. Isso é desencantamento?
Senador Randolfe Rodrigues – Não. É porque foi um absurdo o não acatamento do recurso; acho normal vencer e perder no Parlamento; o que não acho normal é ter pesos e medidas diferentes. Comparando a acusação contra o Aécio, por questões menos graves os senadores Demóstenes Torres e Delcídio Amaral foram cassados. Por que o que pra um valeu, pra outro não está valendo? É uma discrepância no padrão de julgamento do Conselho de Ética do Senado, que com essa decisão deu um tiro na sua própria existência.
Luiz Melo – Apesar de ainda ter muito o que fazer, até onde chegou, a Operação Lava Jato já valeu a pena? Na sua opinião, haverá mudança de cultura daqui pra frente? Os brasileiros estão entendendo isso?
Senador Randolfe – A Lava Jato é um divisor de águas na história nacional no combate à corrupção; ela por si só não se justifica, mas foi viabilizada pela efetivação de alguns institutos como a delação ou colaboração premiada. Historiadores vão reconhecer no futuro que uma nova página foi criada no país depois da Lava Jato. Eu fico mais espaçoso quando ela chega aos nomes mais poderosos da República, sejam de qualquer partido; por mais traumático que seja a politica brasileira ficar bem melhor.
Luiz Melo – Apesar dos bons e maus exemplos, o crime de colarinho branco não vai acabar; diminui, mas não acaba. O senhor avalia que diante disso nós, brasileiros, já estamos maduros o suficiente para pelo menos estancar problema?
Senador Randolfe – A corrupção existe em todos os países; existe na Noruega e na Dinamarca, apesar de possuírem os menores índices de corrupção no mundo; mas a corrupção tem que ter instrumento de controle que a inibam; considero fundamental depois da Lava Jato se ter instrumentos de controle inibindo a corrupção; um desses instrumentos é o Ministério Público, que é autônomo e independente, para que da mesma forma que se bate no Chico também se bata no Francisco.
Luiz Melo – Alguns politico se colocam acima da lei. Como evitar isso?
Senador Randolfe – Claro que o problema não é só na politica, mas também nos outros Poderes; tem alguns magistrados que flexibilizam para uns e agem com mais rigor com outros; estamos dependentes do Ministério Público Federal e da Justiça Federal, instituições que têm trazido elementos para que o país tenha um comportamento mais Republicano.
Luiz Melo – O desembargador federal Souza Prudente, que esteve recentemente no Amapá, ao ser entrevistado por mim, disse que a política brasileira está carente de valores éticos. O senhor concorda com ele?
Senador Randolfe- Concordo com o desembargador, porque estamos numa das piores das piores safras da política; tivemos no passado safras muito boas, com Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, Marcos Freire e Carlos Lacerda, só pra citar alguns; tivemos várias gerações com grandes nomes, mas isso infelizmente não ocorre hoje, inclusive para as eleições do Senado ano que vem; estamos carentes disso, e não encontramos alternativas de peso que inspirem os brasileiros.
Luiz Melo – Jair Bolsonaro, capitão do Exército, que se arvora a dizer que foi preparado para matar, com quem, aliás o senhor ousou duelar no dia que foram abertos os arquivos da ditadura, no 34º Batalhão de Infantaria do Rio de Janeiro, tem aparecido em pesquisas como forte candidato à Presidência da República; isso significa que sociedade brasileira já está vendo a democracia com certa desconfiança?
Senador Randolfe – Eu não acredito. É certo que tem um percentual de extrema direita saudoso dessa época, que se afina, que se identifica com a candidatura dele; atualmente essa grande liderança não tem dito nada com relação ao Michel Temer, que foi denunciado por corrupção; paradoxalmente ele tem sido um dos mais contemplados com emendas, com a liberação de recursos para o seu estado, o Rio de Janeiro; entretanto, não acredito que esse perfil seja o que se identifica com o cidadão brasileiro, porque há uma contradição no padrão ético; respeito quem pensa assim, respeito quem o aponta (como solução), mas no desenrolar da campanha eleitoral eu não creio que o povo brasileiro se identificará com esse perfil em especial.
Luiz Melo – Corremos o risco de voltar à ditadura?
Senador Randolfe – Nós vivemos o risco da descrença total na política, de desestabilizações institucionais gravíssimas, mas agora, graças a Deus, as Forças Armadas demonstram sinais concretos de respeito à democracia, como depoimentos recentes do general Villas Boas (Comandante do Exército), tornando público descontentamento com o recente decreto presidencial colocando o Exército nas ruas de Brasília; as Forças Armadas têm consciência do papel fundamental que exercem para a garantia da democracia, mas, assim como não se pode dizer que nunca dessa água se beberá, também não podemos dizer que determinado evento não ocorrerá; alguns acham que isso (intervenção das Forças Armadas) é melhor, mas sou da máxima do Winston Churchill (Winston Leonard Spencer-Churchill, político conservador e estadista britânico, famoso principalmente por sua atuação como primeiro-ministro do Reino Unido durante a 2ª Guerra Mundial), que costumava dizer que “a democracia é o pior dos regimes, ressalvados todos os outros”. Eu acredito com plena convicção nisso, porque nenhuma ditadura se justifica, seja de esquerda ou de direita; não há regime mais adequado do que a democracia para a população viver tranquila.
Luiz Melo – O jurista Modesto Carvalhosa (Modesto Souza Barros Carvalhosa é advogado, parecerista, consultor e árbitro. Professor aposentado de Direito Comercial da Faculdade de Direito da USP. Além da conhecida atuação no Direito Empresarial, ele é a maior referência nacional em anticorrupção) que se ofereceu para ser presidente do Brasil caso ocorram eleições indiretas com a previsível queda de Temer disse à revista Exame que os partidos acabaram, que a estrutura partidária é viciadíssima, de total promiscuidade entre o setor público e o privado; e ele diz que quem fez essa rejeição foram os próprios políticos, que na opinião dele são corruptos, bandidos e ladrões. O senhor concorda com ele?
Senador Randolfe – Concordo com o Carvalhosa. Realmente hoje não temos mais a referência partidária que tínhamos nos anos 1980, como o PT, por exemplo, que teve um desvio severo do rumo que originalmente foi traçado, e por isso não encanta tanto quanto encantou outrora; hoje vivemos uma pasteurização dos partidos, por isso defendo candidaturas avulsas; em relação à situação atual da politica brasileira a responsabilidade é dos políticos, da ampla maioria dos políticos que mergulharam o Brasil nessa crise; mas a culpa não é só dos políticos, é do sistema, por isso tem que haver mecanismos para garantir maior participação popular, que viabilize a reforma política, resolvendo de uma vez por todas os problemas mais cruciais, como o financiamento de campanhas, principalmente o acumpliciamento público e privado como o Carvalhosa prega.
Luiz Melo – Os brasileiros estão à procura de um Messias?
Senador Randolfe – Essa questão de Messias nunca deu certo, como aconteceu em 1960, quando o Messias era o Jânio Quadros e deu no que deu, isto é, oito meses depois ele renunciou e lançou o Brasil numa crise sem precedentes que acabou desembocando em 1964 para o golpe militar, num golpe de estado; em 1990 o Messias era o Collor, que resultou numa crise terrível, inclusive com o impeachment dele; os brasileiros têm que acreditar no povo brasileiro, e em programas que sejam coerentes e eficientes para resolver o principal problema que o país enfrenta hoje, que é a desigualdade.
Luiz Melo – Então político com perfil de ‘salvador da pátria’ não é confiável?
Senador Randolfe – A história, como diz o meu querido Chico Buarque, “a história é trem alegre que atropela indiferente todo aquele que a negue” mostra que ‘salvador da pátria não dá certo no Brasil.
Luiz Melo – Boa política é chave para o crescimento e inclusão social. Por que Brasília ainda não virou essa chave; ou se a virou, virou ao contrário?
Senador Randolfe – Isso é histórico. Trouxemos como legado o patrimonialismo português, que tem um traço distinto, que não difere o publico do privado; o regime autoritário não criou instituições políticas identificadas com os nossos cidadãos, salvo o Ministério Público, isso graças à Constituição Federal de 1988; eu acho que temos que ter eventos de superação; nesse aspecto repito, considero que a Operação Lava Jato pode ser fator inspirador para termos mudanças na politica brasileira, porque é na politica que existem todas as desgraças, mas é também na politica que existem todas as virtudes.
Luiz Melo – Gostaria que o senhor falasse das reformas em discussão, a da Previdência, por exemplo, que é a mais polêmica, mas é necessária e urgente, porque só a partir dai vamos poder controlar os gastos públicos, que hoje superam 60 bilhões de reais se não me engano; é uma decisão coerente e desejável, mas as oposições, e ouso incluir o senhor, não as querem, mesmo reconhecendo que as reformas são necessárias e inevitáveis. Podemos chamar isso de oposição irresponsável, que faz oposição por fazer?
Senador Randolfe – Eu não sou daqueles que acreditam que as reformas não são necessárias. A Previdência não pode ter um rombo que tem hoje, mas temos que fazer de forma equitativa, saber quem tem que perder de forma igualitária; hoje quem mais deve à Previdência, dos dez maiores devedores cinco são bancos privados. Temos que equalizar essas contas; não sou contrário, só que é necessário saber como fazer. A legislação trabalhista também é antiga, mas a reforma original alterava sete artigos. No entanto, saiu da Câmara com mais de 70 alterações, inclusive com um artigo que possibilita que mulheres gravidas e lactantes trabalhem em situação insalubre; dispositivos como esse têm que ser alterados no Senado e voltar à Câmara; o Brasil entrou no Século XXI com uma legislação que foi pensada em 1943, por isso tem que ser modernizada, mas não se pode jogar água suja com o bebê junto; outro aspecto que deve ser levado em conta é que o atual governo não está mais tendo força politica para aprovar essas reformas.
Luiz Melo – A crise atinge todos os poderes, isso é certo, mas qual desses poderes tem o ambiente mais contaminado?
Senador Randolfe – Eu acho que é o Executivo Federal, tanto que sem precedentes no país o presidente está sendo denunciado por corrupção e prestes a ser denunciado como chefe de uma organização criminosa e de obstruir a investigação; um dos termômetros é o que o número de chefes de Estado que visitou o Brasil reduziu 80% em comparação a períodos anteriores. Não tenho dúvida que quem mais corrói o país é o Executivo Federal.
Luiz Melo – O ministro Marco Aurélio, do STF garante que apesar dos pesares as instituições estão funcionando. Dos três Poderes, quem mais tem prezado a sua função Constitucional?
Senador Randolfe – O Ministério Público. O MP e o MPF. A historia vai reconhecer Rodrigo Janot. Por mais críticas que haja ninguém pode acusar do doutor Janot de ser seletivo. Ele determinou a prisão do Genoíno, denunciou lideranças do PT e de vários outros partidos, e agora o presidente da república, exercendo os poderes que a Constituição Federal de 1988 deu ao Ministério Público na condição de titular dos direitos difusos e coletivos e como fiscal da lei e da sociedade.
Luiz Melo – O senhor acha que o presidente Temer terá condições de se sustentar no governo?
Senador Randolfe – Eu trabalho intensamente para que isso não ocorra, porque seria muito ruim para o Brasil chegar até o fim de 2018 com esse Presidente acusado de prevaricação, de chefe de organização criminosa; a permanência dele seria péssima para o nosso projeto de Nação; não tem condição alguma de Temer continuar na presidência pelo bem do Brasil e de todos os brasileiros.
Luiz Melo – O senhor reconhece que o governo Temer tem avançado no combate à inflação?
Senador Randolfe – Em termos, porque a deflação é causada pela recessão, é como alguém emagrecer por causa da depressão; no Brasil são quase 15 milhões de desempregados, e de acordo com levantamento do Itaú a economia diminuiu, a ascensão do PIB (Produto Interno Bruto) não está se concretizando e a queda da de juros é impulsionada pela retração da atividade econômica. Assim não vale! Não adianta termos deflação se temos 15 milhões desempregados.
Luiz Melo – O deputado Rodrigo Maia começa a se articular nos bastidores como possível substituto de Michel Temer, inclusive se comprometendo de manter Henrique Meireles na condução da economia…
Senador Randolfe – Hoje acho mais difícil não haver eleições indiretas, porque o ambiente para que isso acontecesse seria se o STF tivesse cassado a Chapa Dilma-Temer, assim como também eu defendo que não tem regras fora da Constituição, que determina que o presidente da Câmara assuma por 180 dias caso seja aprovado pedido de investigação do presidente; mas o senhor Rodrigo Maia, nesse caso, convocaria eleições indiretas; acho que assim já estaria bom, porque tivemos muita convulsão nesse período, e podemos chegar a dois afastamentos de presidente em dois anos. Concretizando agora o afastamento de Temer, nós, o país, teremos que nos acalmar, tranquilizar, organizar a transição para a eleição de 2018; eu sou o primeiro a advogar que após a sucessão de Temer, teremos que dar estabilidade politica para o Brasil. E eu vou fazer minha parte.
Luiz Melo – Por que o senhor se considera um bom senador?
Senador Randolfe – Primeiro porque eu nunca envergonhei e jamais vou envergonhar os amapaenses em Brasília; o estado do Amapá deve ser respeitado como qualquer outro estado; tenho procurado e estou disposto a medir com quem quer que seja quanto recurso eu tenho conseguido transferir; só eu tenho mais de 60 milhões de reais transferidos para o estado nos últimos quatro anos. O povo escolheu um representante, não um funcionário público para representar o estado e os amapaenses. A primeira coisa que o representante do povo não pode fazer é curvar a coluna para qualquer poderoso. Quem quiser ser funcionário público que faça concurso público.
Luiz Melo – Dê três bons motivos para o senhor continuar representando o Amapá no Senado?
Senador Randolfe – Objetivamente falando, diretamente dizendo, primeiro tenho lutado pelo povo do Amapá e do Brasil com muito empenho e orgulho. Tenho trabalhado para ser respeitado por todos, em todos os Poderes, além do fato de que os recursos transferidos pelo meu mandato foram e têm sido vitais para a infraestrutura, saúde e educação; hoje temos lousas digitais, passeios públicos, como é o caso das praças Veiga Cabral e Floriano Peixoto, o Mercado Central que estamos recuperando… Essa semana inclusive teve a liberação de mais uma parcela, além da recuperação de 15 UBS (Unidades Básicas de Saúde), a luta para que o Aeroporto seja recuperado, garantindo recursos para as obras de reforma e ampliação, alternativas de voos, que é algo fundamental porque somos um estado que pra se comunicar não tem outro meio mais rápido que a via aérea; aqui o deslocamento aéreo não é luxo, é uma necessidade…
Luiz Melo – Caetano Veloso, que virou seu amigo, disse recentemente que o senhor é um dos poucos políticos brasileiros de oposição responsável e coerente. Usei isso como mote em uma entrevista com o ex-deputado Antônio Feijão; ele reconheceu, mas fez uma observação: afirmou que o senhor precisa ser menos cosmopolita, esquecer um pouco o Caetano Veloso, Gilberto, Chico Buarque e se preocupar mais com os Joãozinhos e Manoéis que votaram no senhor e que querem sentir os efeitos do seu trabalho no Senado. O que o senhor tem a dizer sobre isso?
Senador Randolfe – Com todo respeito pelo meu querido Feijão, como diz o poeta amapaense Joãozinho Gomes, “tem que ter sempre os pés no chão e o olhar nas estrelas”. Temos que superar o complexo de vira lata, de mostrar na prática que o político do Amapá possui tantas qualidades como qualquer outro político do país; o amapaense tem que ter orgulho de ter o melhor endereço do planeta, na esquina do Rio Amazonas com a Linha do Equador, a melhor culinária do Brasil. Qualquer liderança do Amapá tem todas as condições de ter vantagens comparativas fantásticas e se destacar no cenário nacional com tanta ou mais autoridade que eu; temos que nos orgulhar daquilo que temos no estado. A vida me deu de presente um casal fantástico, o Caetano e a Paula; e sem esquecer que faço questão de vir ao Amapá toda quinta-feira, de ir no Pacui, Calçoene, no Tracajatuba, enfim, em todas as comunidades, todos os municípios; faço questão de percorrer o Amapá de ponta a ponta. Concordo com o Feijão, pois temos que sentir o clamor do povo daqui, e eu faço isso, e desafio outros a andarem tanto no Amapá como eu tenho andado.
Luiz Melo – O senhor vai disputar a reeleição ao Senado ou vai concorrer ao governo?
Senador Randolfe – Tenho 90% de chance de disputar o Senado, mas não descarto o governo, porque não posso dizer um ano antes da convenção do meu partido que minha vontade iria prevalecer; aprendi que as vontades coletivas têm que ser maiores que as individuais. Eu trabalho no projeto de reeleição sem descartar a possiblidade de concorrer ao governo.
Luiz Melo – Uma provável aliança das esquerdas no Amapá embala o DEM, do Davi Alcolumbre?
Senador Randolfe – A Rede é um partido de centro esquerda, e nossa aliança com o DEM é pautada por agenda local, inicialmente para a eleição e posterior reeleição do Clécio (prefeito de Macapá), inclusive com o DEM indicando a vice dele em 2016; nosso projeto é construir uma alternativa, a alternância no Poder aqui no Amapá. Temos que ter maturidade de aprender que essa historia das aliança politica tem que ser estabelecida por programas; tenho visto alianças de “coerência de partidos”, e aqui eu coloco aspas, consolidar, mas redundar em compromissos escusos na execução de governos; uma aliança deve se pautar em cima de um programa oferecido localmente; é isso que pauta, inclusive sem obedecer a regra nacional; tenho muito respeito pelos partidos com padrões nacionais, mas o Brasil não é Dinamarca, Noruega, Holanda, Europa, e mesmo São Paulo; a realidade politica dos grandes centros não é a mesma local; nem na França, por exemplo, que teve que buscar como alternativa de governo uma aliança que uniu a direita e a esquerda.
Luiz Melo – Dentro dessa projeção, se prevalecer os 10%, isto é, saindo candidato ao governo, o senhor apoiaria o senador Davi à reeleição?
Senador Randolfe – Seria tendência nesse caso manter a aliança com o Davi, a aliança que reelegeu Clécio na prefeitura de Macapá.
Luiz Melo – Há possibilidade de o prefeito Clécio disputar o governo?
Senador Randolfe – O Clécio nunca levantou comigo e nem dentro do partido essa possibilidade, que no meu ver está descartada.
Luiz Melo – O voto de Davi contra recurso proposto pelo senhor na CCJ que visava a cassação do mandato do senador Aécio o incomodou? Ele não foi parceiro?
Senador Randolfe – O Davi nunca me procurou para falar sobre o assunto. Ele é vice líder do governo e eu vice líder da oposição. Seria falta de respeito um dizer pro outro como votar, ou pedir algum favor nesse sentido. Ele sabia da minha posição e eu da posição dele. Respeito completamente a posição dele porque nunca em nenhum momento um foi desrespeitoso com o outro.
Luiz Melo – O senhor tem muito apego à leitura. Que tipo de leitura mais lhe atrai?
Senador Randolfe – Sou mais diverso; agora dando aula de Direito Constitucional na Unifap (Universidade Federal do Amapá) tenho me dedicado e gosto muito de obras na área do Direito; sou historiador, e tem uma obra, uma coletânea do Hélio Gaspari que eu considero maravilhosa; devorei toda essa literatura que fala sobre a ditatura, a “ditadura envergonhada”, a “ditadura derrotada”, a “ditadura brutalizada”, que eu considero uma das melhores obras de síntese do que foi aquele período. Outra obra ganhei de presente do meu querido Deltan (Deltan M. Dellagnol, do MPF de Curitiba/PR) procurador-chefe da Lava Jato, que fala de todos os bastidores da Operação; outra que também me agrada muito é do Khaled Hosseini (romancista e médico afegão naturalizado norte-americano), “O Caçador de Pipas (best-seller, cujo título original é: The Kite Runner), que é meu romance predileto que se transformou em filme; também amo a poesia, e de vez em quando reúno amigos tentando declamar alguns poemas…
Luiz Melo – Então o senhor também tem apego pela poesia? O senhor pode declamar alguma?
Senador Randolfe – Claro que sim. Com muito prazer. Vou declamar a minha predileta.
(Encerrando o programa, Randolfe Rodrigues declamou ao vivo o poema “Desejo”, do escritor francês Victor Hugo, na tradução do jornalista e escritor gaúcho Sérgio Jockymann, cuja letra se transcreve adiante):
“Desejo, primeiro, que você ame, e que, amando, também seja amado. E que se não for, seja breve em esquecer. E que, esquecendo, não guarde mágoa./ Desejo também que tenha amigos, ainda que maus e inconsequentes. Que sejam corajosos e fiéis, e que pelo menos num deles você possa confiar sem duvidar./ E porque a vida é assim, desejo ainda que você tenha adversários. Nem muitos, nem poucos, mas na medida exata para que, algumas vezes, você se interpele a respeito de suas próprias certezas./ E que entre eles, haja pelo menos um que seja justo, para que você não se sinta demasiado seguro./ Desejo, depois, que você seja útil, mas não insubstituível. E que nos maus momentos, quando não restar mais nada, essa utilidade seja suficiente para manter você de pé./ Desejo, ainda, que você seja tolerante, não com os que erram pouco, porque isso é fácil, mas com os que erram muito e irremediavelmente, e que fazendo bom uso dessa tolerância, você sirva de exemplo aos outros./ Desejo que você, sendo jovem, não amadureça depressa demais, e que, sendo maduro, não insista em rejuvenescer, e que, sendo velho, não se entregue ao desespero./ Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor, e é preciso deixar que aconteçam no tempo certo./ Desejo, por sinal, que você seja triste, não o ano todo, mas apenas um dia. E que nesse dia descubra que o riso diário é bom, o riso habitual é insosso e o riso constante é insano./ Desejo que você descubra, com a máxima urgência, acima e a respeito de tudo, que existem oprimidos e infelizes, e que estão à sua volta./ Desejo, ainda, que você afague um gato, alimente um cuco e ouça o João-de-barro erguer triunfante o seu canto matinal porque, assim, você se sentirá bem por pouca coisa./ Desejo também que você plante uma semente, por mais minúscula que seja, e acompanhe o seu crescimento, para que saiba de quantas muitas vidas é feita uma árvore./ Desejo, outrossim, que você tenha dinheiro, porque é preciso ser prático. E que pelo menos uma vez por ano coloque um pouco dele na sua frente e diga: Isso é meu, só para que fique bem claro quem é o dono de quem./ Desejo também que nenhum de seus afetos morra, por ele e por você, mas que, se morrer, você possa chorar sem se lamentar e sofrer sem se culpar./ Desejo, por fim, que você, sendo homem, tenha uma boa mulher, e que sendo mulher, tenha um bom homem e que se amem hoje, amanhã e nos dias seguintes, e quando estiverem exaustos e sorridentes, ainda haja amor para recomeçar”.
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