Polícia

Operação da PF apura desvio de R$ 2 milhões da merenda escolar

Dinheiro desviado provocou desabastecimento de merenda em mais de 50 escolas da rede pública estadual, segundo investigação.


A Polícia Federal, com participação do Ministério Público Federal, Ministério Público do Estado do Amapá, Controladoria Geral da União e Tribunal de Contas da União, deflagrou na manhã dessa terça-feira, 31, a Operação Senhores da Fome, para investigar o desvio de recursos destinados à merenda escolar do Amapá.

Foram cumpridos três dos quatro mandados de prisão temporária, sete mandados de condução coercitiva e 18 mandados de busca e apreensão em Macapá. Cerca de 120 policiais federais participaram da ação.

Segundo a PF, a operação investiga a atuação de empresários, diretores de escolas e servidores da Secretaria de Estado da Educação (Seed) no desvio de aproximadamente R$ 2 milhões, destinados à merenda escolar de vários municípios do estado. Com o desvio, pelo menos 52 escolas da capital amapaense ficaram sem os alimentos da agricultura familiar.

De acordo com as investigações, no início de 2016, vários diretores assinaram o termo de recebimento dos alimentos sem, entretanto, recebê-los. Algumas dessas entregas teriam sido feitas, inclusive, no período de férias escolares.

Os investigados irão responder, na medida de suas responsabilidades, pelos crimes de peculato, associação criminosa e falsidade ideológica.

Detalhamento

Durante coletiva de imprensa nesta terça-feira, 31, no auditório da sede da Polícia Federal (PF), na rodovia Norte/Sul (zona norte de Macapá), o chefe da operação Senhores da Fome, delegado Igor Barros, revelou, sem citar nomes, que depoimentos de pessoas que estão sendo ouvidas pela Polícia Federal apontam envolvimento de outros servidores de várias escolas no desvio de recursos da merenda escolar e que não foram alvos da primeira fase da operação.

Segundo o delegado, as investigações apontam que de uma só vez, durante o recesso escolar entre o fim de 2015 e início de 2016, a Seed repassou indevidamente à empresa Cooperativa Agroindustrial de Produção de Alimentos do Amapá (Agrocoop) a quantia de R$ 1,5 milhão a título de pagamento de itens da merenda escolar, cujo contrato foi assinado no dia 23 de dezembro de 2015.

“Estamos fazendo as investigações por fatos ocorridos entre o fim de 2015 e início de 2016, e o que nos causou surpresa é que em pleno recesso escolar, entre 2015 e 2016, a secretária da época pagou R$ 1,5 milhão de verba federal, a título de um contrato para aquisição de alimentação escolar da empresa Agrocoop, mas comprovamos que não houve a prestação de serviços. Houve depoimentos importantes para o deslinde da investigação, que vai prosseguir, não para, inclusive verificamos que há indícios de outras escolas envolvidas que não estão no inquérito”, detalhou.

O delegado explicou que durante as investigações que culminaram com a deflagração da Operação foram identificados 52 servidores públicos que assinaram falsamente documentos de recebimento de itens da merenda escolar:

“A investigação, que durou um ano, foi dividida em três núcleos, um empresarial integrada pela Agrocoop e quatro pessoas ligadas a essa empresa, um da secretaria de Educação com foco em 52 pessoas que assinaram de maneira falsa o recebimento de alimentos. Constatamos que pelo menos 52 escolas não receberam, apesar de os diretores assinarem o recebimento integral, com aproximadamente R$ 2 milhões desviados de um contrato de R$ 3,2 milhões”.

“Estado tinha conhecimento e apurava denúncias”, diz secretária

Em entrevista coletiva na tarde desta terça-feira (31) a secretária de Educação (Seed) Goreth Souza e o controlador geral do estado (CGE) Otni Miranda de Alencar afirmam que o governo tinha conhecimento dos desvios de recursos da merenda escolar.

Segundo eles, tão logo tomou conhecimento do problema, o governador Waldez Góes determinou a adoção de todas as providências cabíveis, com o afastamento de vários diretores de escolas envolvidos e o repasse de todas as informações necessárias aos órgãos de controle externo para a apuração dos fatos.

“O governo do estado já tinha conhecimento da situação, que começou a ser apurada pela Controladoria Geral do Estado, e tão logo tomou conhecimento o governador Waldez determinou a adoção de todas as providências necessárias para a apuração dos fatos. O controlador geral, doutor Otni Alenca já tinha determinado a suspensão do contrato com a Agrocoop e com minha chegada na Seed nós aplicamos todas as medidas cabíveis, intensificamos a colaboração com informações aos órgãos de controle e à Polícia Federal, e sempre colocamos a secretaria a disposição para prestar todos os esclarecimentos, além de afastarmos os diretores escolares que naquele momento poderiam não estar aplicando com responsabilidade os recursos públicos”, detalhou Goreth Souza.

Atualmente, segundo a secretária, a Seed faz o repasse dos recursos da merenda escolar aos Caixas Escolares e de imediato disponibiliza as informações na internet.

“Em tempo real a comunidade pode acompanhar o repasse e a execução dos recursos através do site da secretaria, e ainda neste ano nós vamos lançar um sistema de monitoramente e o Cartão Escola, que vai ser usado apenas pelo diretor adjunto, que ficará responsável pela merenda escolar, afastando os diretores dessa incumbência para se voltarem exclusivamente para olhar a evasão escolar, os índices do Ideb, trabalhando para melhorar a qualidade do ensino, para que a escola possa ser um ambiente produtivo e agradável”.

Controlador-geral diz que dinheiro será ressarcido

Segundo Otni Miranda de Alencar, a Controladoria Geral do Estado (CGE) vem adotando desde que o problema veio à tona todas as providências necessárias para a apuração dos fatos, inclusive medidas judiciais para o ressarcimento dos recursos desviados.

“Em trabalho conjunto com a Seed nós identificamos inconsistências em vários produtos adquiridos da agricultura familiar e determinamos à secretaria de educação a suspensão do contrato e bloqueio da última parcela, porque constatamos a não entrega produtos mesmo havendo documento assinado por alguns diretores, mas em oitiva eles informam que esses produtos não foram entregues. Comunicamos os fatos à Procuradoria Geral do Estado (PGE) para tomar medidas judiciais para que esses recursos sejam devolvidos ao erário, porque a Cooperativa (Agrocoop) recebeu e não entregou os produtos”.

 

Início das investigações

O Diário conversou com o promotor de justiça Afonso Guimarães, coordenador do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Amapá (MP-AP), que foi quem iniciou as investigações que culminaram com a deflagração da Operação Senhores da Fome. Conforme ele esclareceu, em 2015 o Gaeco passou a investigar denúncias de desvio de recursos destinados à merenda escolar da rede pública estadual, mas ao longo das investigações constatou a existência de verba federal, ensejando a distribuição do procedimento ao MPF e à PF.

“Iniciamos as investigações em 2015 e estávamos trabalhando nesse procedimento em razão de terem chegado à Promotoria denúncias de ilícitos, de desvio de recursos para comprar de itens da merenda escolar; só que encontroamos parte dos oriundos de verba federal; levamos ao Ministério Público Federal e à Polícia Federal e a partir daí passamos a trabalhar conjuntamente até chegarmos a essas medidas cautelares, atingindo esse objeto que é especificamente o combate o crime e a corrupção com ênfase nessa questão da merenda escolar, que é tão sensível na sociedade e dentro sociedade afetando aqueles que mais precisam”.

O promotor destacou a atuação das polícias Federal e Civil: “A PF agora vai fazer um apanhado geral divulgando o que concluiu dentro da investigação que foi distribuída a ela e inclusive foi muito ale; as polícias Federal e Civil nos ajudaram muito, inclusive a Polícia Civil cumpriu parte dos mandados de busca e apreensão; sem a PF e a Polícia civil não chegaríamos a esse desfecho”.

Prisões e conduções coercitivas

A ex-secretária Conceição Medeiros (Seed), acusada pela investigação de ter pago indevidamente, de uma só vez, R$ 1,5 milhão à empresa Agrocoop no final de 2015 a título de pagamento de alimentos não entregues foi ouvida e logo depois liberada. Os empresários Edilson da Rocha Lima, Elivaldo da Silva Santos, Edilson dos Reis Lima foram presos, mas o outro empresário que teve a prisão provisória decretada, Daciel Cunha Alves, não foi localizado e é considerado foragido.

As investigações apontam o envolvimento de 52 diretores de escolas e outros servidores da secretaria de estado da Educação (Seed) no desvio de quase R$ 2 milhões de um contrato de R$ 3 milhões e 200 mil destinados à merenda escolar em vários municípios amapaenses.


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