
Nilson Montoril
Os Tupinambás
Os índios da Amazônia portaram-se de maneira amistosa com os aventureiros que navegavam nos rios da região, havendo maior identidade com os franceses. Os aventureiros interagiam com os silvícolas mediante escambo, sem a intenção de escravizá-los. Começaram a insurgir-se quando os portugueses se apossaram de suas terras e os tornaram cativos. Fazendo uso de armas de fogo, os luso-brasileiros combateram os índios e os massacraram impiedosamente levando grupos inteiros a extinção. A população indígena que Francisco Caldeira Castelo Branco estimara em dois milhões de indivíduos sofreu drástica redução. Os índios Tupinambás ocupavam toda a área que se estende de Belém a São Luiz, pelo litoral atlântico e as banhadas pelo rio Guamá. Na Ilha do Marajó viviam os Aruak, que os Tupinambás chamavam “nheengaíbas”, vocábulo que significa “fala ruim”. Entre os Aruak sobressaiam os Aruãs, os Anajás, os Sacacas, os Joanes e os Mocoões.
Antes da chegada dos portugueses, em 1616, os Tupinambás viviam tranquilos e suas aldeias estavam instaladas na área onde surgiria Belém, na região do rio Guamá e arredores. Eles ajudaram os luso-brasileiros a construir o forte do Santo Cristo (Presépio), as primeiras casas dos colonos, a abertura da Rua do Norte (Siqueira Mendes) e a base da Igreja da Matriz (Igreja da Sé). A Rua do Norte foi a primeira a ser aberta na povoação de Santa Maria de Belém e ligava o forte ao local onde surgiria a Igreja de Nossa Senhora do Carmo. Foi no decorrer da construção da Igreja Matriz que os Tupinambás se rebelaram contra os colonizadores. Acostumados a fazer o que bem entendiam, os índios passaram a ser tratados como escravos. O índio que liderou a rebelião tinha o nome cristão de Amaro e fora educado pelos Jesuítas que atuaram nas terras do Maranhão. O centro da revolta funcionou numa povoação chamada Cumat, que os franceses haviam instalado. Em pouco tempo, todos os Tupinambás residentes na região litorânea do Atlântico estavam em estado de guerra. Mesmo no Maranhão, o movimento em defesa da liberdade ganhou adeptos. No primeiro ataque desencadeado pelos Tupinambás ao forte do Presépio ou Castelo, trinta soldados foram surpreendidos e mortos enquanto dormiam. A reação luso-brasileira foi imediata e violenta. Os reforços que o governador do Maranhão, Jerônimo de Albuquerque, expediu para socorrer a povoação de Belém vieram fazendo estragos pelo litoral. O índio Amaro acabou sendo preso e, por ordem de Matias de Albuquerque, foi amarrado a boca de um canhão, tendo o corpo despedaçado com a detonação da arma de guerra. Este procedimento ocorreu na frente dos demais índios aprisionados, no sentido de amedrontá-los. Castelo Branco também foi bárbaro com os gentios e mandou arrasar as aldeias do Caju, Mortigura e Iguape. Os Tupinambás do rio Guamá renderam-se ao alferes Francisco de Medina e foram confinados no forte do Santo Cristo, em Belém.
Desde 1617, alguns franciscanos da Província de Santo Antônio já atuavam em Belém. Tinham construído um convento na margem do igarapé Una, com o objetivo de manter os índios afastados da povoação, evitando assim a escravidão dos mesmos. Mas, Castelo Branco não cessava com suas atrocidades. Só não tomava providências contra as peripécias de um sobrinho que havia matado um capitão. Os colonos se encarregaram de fazer justiça e destituíram do cargo de governador o fundador de Belém, substituindo-o pelo capitão Baltazar Rodrigues de Melo. Temendo ser atacados pelos índios, os colonos se refugiavam à noite no interior do forte. Graças à ação dos franciscanos, os ânimos dos silvícolas foram controlados e um período de tranquilidade reinou na povoação de Belém. Esta tranquilidade foi quebrada pelos Tupinambás, no dia 7 de janeiro de 1619, quando o chefe Guaimiaba (cabelo de velha) comandou um ataque ao forte. A nascente povoação de Belém só não foi arrasada porque Guaimiaba foi morto pelo arcabuzeiro Gaspar Cardoso no momento em que tentava pular a certa da fortificação. A morte do morubixaba fez os índios recuarem e baterem em retirada. No dia 18 de julho de 1621, o controle da capitania do Grão-Pará foi colocado nas mãos de Bento Maciel Parente, que se destacara nas lutas contra os Tupinambás, em 1619, ocasião em que, comandando oitenta soldados e quatrocentos índios flecheiros recrutados em Pernambuco, acabou com os indígenas, entre São Luiz e Belém, aprisionando e escravizando os que sobreviveram. Seu nome está registrado na História da Amazônia, como um dos mais sanguinários e violentos matadores de índios. Em junho de 1622, quase um ano depois de assumir a direção da capitania, Bento Maciel Parente praticou uma crueldade que deixou os colonos indignados. Durante uma festa que os Tupinambás realizavam um dos chefes, muito entorpecido pela bebida, disse que iria acabar com todos os portugueses. Ciente do que dissera o cacique, Maciel Parente mandou prender os vinte e quatro chefes presentes a festa e encarregou índios inimigos dos Tupinambás para matá-los, acutilados e estocados. Os índios que presenciaram as cenas tétricas abandonaram a foz do rio Amazonas e foram se refugiar em uma ilha do rio Madeira, que passou a ser chamada de Ilha Tupinambarana. Deixaram valiosíssima contribuição no Pará, ajudando na construção das igrejas da Matriz (atual catedral de Belém), Carmo, Mercês, Santo Alexandre e Santo Antônio, em Belém; a Matriz do Bom Jesus na cidade da Vigia, fortificações, moradias e o Palácio do Governo. O vocábulo Tupinambá é de origem tupi e significa “descendente de tupi”.