Cidades

Novo Amapá: 43 anos da maior tragédia em rios da Amazônia com centenas de mortes

Até hoje, nenhum sobrevivente ou familiar de vítimas recebeu indenização e ninguém foi responsabilizado pelo naufrágio


Novo Amapá. Memorial Santanense

 

Elen Costa
Da Redação

 

Neste sábado, 6, há exatos 43 anos, o então território federal do Amapá se alarmava com o naufrágio do barco Novo Amapá, que seria a maior tragédia de sua história, até agora, em sua era de estado, e uma das maiores do Brasil, em número de vítimas.

No dia 6 de janeiro de 1981, centenas de pessoas perderam a vida, quando a embarcação foi a pique. Na ocasião não deu e até hoje não dá para quantificar as vítimas, pois nem mesmo os donos ou responsáveis sabiam quantas pessoas transportavam, muito menos a Capitania dos Portos.

 

Conforme relatos contados ao longo dessas mais de quatro décadas, a embarcação partiu por volta das 14h do Porto de Santana, a 17 quilômetros da capital, Macapá, com destino a Monte Dourado, distrito de Almeirim, no Pará, mas acabou tombando e afundando cerca de seis horas depois, nas imediações da foz do rio Cajari, próximo a Laranjal do Jari, extremo sul do território federal.

Com 25 metros de comprimento e registro para transportar cerca de 150 passageiros, estima-se que o Novo Amapá, com base no número de desaparecidos e na investigação da época, tenha saído da cidade amapaense com mais de 600 pessoas a bordo, um quantitativo quatro vezes a mais que o permitido, além de quase uma tonelada em cargas, o que se tornou decisivo para o acontecimento fatídico.

 

Nunca se soube, exatamente, quantas vítimas morreram no naufrágio. Contudo, afirma-se que chega a ser mais da metade das pessoas que embarcaram. Há versões de que mais de trezentas pessoas pereceram; outras, mais de quatrocentas.

 

Entre as vítimas fatais estava um dos donos do Novo Amapá. O corpo dele foi encontrado dentro de uma cabine.

 

Muitos passageiros dormiam na hora do sinistro, ou estavam em camarotes, e próximos do porão, por isso não conseguiram sair. Alguns sobreviventes contam que devido à rapidez com que tudo ocorreu, muitos tiveram dificuldade de sair do amontoado de mercadorias, cordas e lonas.

Alguns corpos foram enterrados, a maioria deles teve que ficar em uma vala comum no cemitério de Santana, já que não havia espaço suficiente para enterrá-los separadamente. Outros foram levados pelo rio. Dezenas de caixões foram encomendados às pressas e houve um colapso no sistema funerário, em razão do esgotamento de urnas para acomodar todos os mortos.

 

Na época o acidente ganhou as páginas de jornais internacionais, como o norte-americano The New York Times.

 

Anos depois, o outro proprietário recuperou a embarcação e voltou a navegar com ela. Segundo informações, até a presente data nenhum sobrevivente da tragédia ou familiares de vítimas receberam indenização, e ninguém foi responsabilizado pelo naufrágio.

 

Outras tragédias

No dia 26 de janeiro de 2002 o barco Cidade de Óbidos I, também naufragou no Vale do Jari, na divisa entre os estados do Pará e Amapá.

Navio Cidade de Óbidos I. Santana do Amapá (imagens/reprodução)

O comboio composto pelo rebocador Florenzano Neto empurrando a balsa Gonçalves II havia saído do porto de Vitória do Jari e navegava no rio Jari com destino a Belém do Pará, carregando de mercadorias e veículos leves e pesados.

Em sentido oposto seguia a embarcação Cidade de Óbidos I, que partira no dia anterior do Porto de Santana com destino a Laranjal do Jari. A bordo estava uma comitiva de políticos, autoridades e passageiros, bem como cargas de pequeno porte.

O barco tinha capacidade para 300 passageiros. Na lista oficial constava que 114 pessoas tinham embarcado, porém testemunhas dizem que o número não condizia com a realidade.

Por volta 5h20, nas proximidades da praia denominada Saudade, na localidade de Ponta Alegre ou Vista Alegre, em Jarilândia, o alarme de parar máquinas para troca de um tubo injetor que havia estourado no sistema do gerador soou, acordando o comandante. Ele, de acordo com informações, determinou que a balsa fosse atracada para conserto, navegando no sentido errado, colidindo com o Cidade de Óbidos I. Sete passageiros que ficaram presos no convés foram tragados pela força da água, quando o barco afundou.

Uma das vítimas do acidente foi a jornalista Simone Teran. O corpo dela foi encontrado com um colete salva-vidas enroscado em um gancho no banheiro.

 

Ainda segundo sobreviventes, a balsa estava às escuras, sem luzes de navegação, apenas com um holofote de mão, e não possuía buzina e radar.

 

Na época, a tripulação e proprietários/armadores do rebocador Florenzano Neto/alsa Gonçalves II foram indiciados por homicídio doloso (quando há a intenção de matar).

Anna Karolinne III. Imagens GEA

Anos depois, em 2020, outra tragédia marcou a sociedade amapaense. O navio Anna Karoline III afundou matando 42 pessoas. O excesso de cargas e de passageiros foi apontado como o principal causador do naufrágio.

Seis pessoas – o comandante dono do navio, tripulante, despachante, dois militares da Marinha e o proprietário de uma segunda embarcação – foram denunciadas pelos mais de 40 homicídios dolosos ocorridos no naufrágio que aconteceu na madrugada de 29 de fevereiro, na boca do rio Jari.

As investigações apontaram que o barco transportava 70% de sobrecarga no dia da tragédia. A distribuição indevida de mercadorias no convés causou instabilidade na embarcação, sendo fator determinante para que acontecesse o afundamento.

Outras irregularidades no navio e nas condições da viagem também foram detectadas, entre elas, adulteração do disco de plimsoll (que mostra o nível da água e a sobrecarga ou não); a embarcação não estava autorizada a fazer a linha Santana-Santarém e Santarém-Santana; no meio da viagem houve uma parada para abastecimento em local não apropriado e em condições climáticas inadequadas (ventos fortes e chuva).

 

 

 

 


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