“A ferrovia será recuperada, mas não servirá apenas para escoar minério”
O economista amapaense Joselito dos Santos Abrantes, presidente em exercício da Agência Amapá de Desenvolvimento Econômico, foi ao rádio ontem falar a respeito dos projetos em curso no Estado para destravar a economia do Amapá, dentre eles o setor da mineração, considerada uma das maiores vocações econômicas do Estado. O executivo falou das providências para a recuperação inclusive da Estrada de Ferro do Amapá (EFA), considerada vital para o processo de retomada da atividade mineral, só que agora sendo empregada para escoar outras cadeias produtivas, como o mercado de grãos e também da madeira. Esses e outros temas importantes foram explorados pela equipe do programa Conexão Brasília e estão de forma resumida nesta edição do Diário do Amapá.
CLEBER BARBOSA
DA REDAÇÃO
Diário do Amapá – É papel da Agência dialogar com o mercado, buscar captar investidores para o Estado?
Joselito Abrantes – Exatamente, a Agência Amapá é algo até certo ponto recente, foi criada há três, quatro anos, com esse papel, jovem ainda, mas com muito esforço devido as dificuldades que o país e o próprio estado do Amapá vinham passando, ela vem tentando cumprir o seu papel que são essas discussões para fomentar a economia do Amapá, dar uma dinâmica, acelerar a nossa economia.
Diário – Nunca é demais lembrar que ela veio a partir da fusão de duas secretarias de estado, a Seicom e a Adap, não é?
Joselito – Sim, foi na terceira gestão do governador Waldez Góes, mas ainda durante a campanha, numa discussão com o empresariado, veio a proposta de criação de uma agência de desenvolvimento econômico, então assim que foi eleito o governador com sua equipe traçou uma proposta que veio com a extinção da Seicom e da Adap para dar lugar à Agência.
Diário – E com ela veio também a regulamentação da Zona Franca Verde, para dinamizar o Distrito Industrial. Como está?
Joselito – Em função de tudo o que comentei anteriormente, da conjuntura de crise econômica que o Brasil passou, muito mais intensa nos últimos anos, que começa agora a dar sinais de recuperação, então hoje nós temos duas empresas já certificadas pela Zona Franca Verde, mas estamos em discussão e elaboração de projetos, que precisam ser aprovados pelo Conselho Superior da Suframa [Superintendência da Zona Franca de Manaus] nas reuniões que eles fazem trimestralmente. Mas estamos preparando mais duas ou três empresas para também serem certificadas, inclusive uma fábrica de ração, que deve estar sendo inaugurada dentro dos próximos três meses no Distrito Industrial.
Diário – A agência também teve um papel importante nas tentativas para tentar destravar a mineração aqui no Amapá, principalmente no processo das sucessoras de Anglo American e Zamin Ferrous. O que dá para falar a respeito?
Joselito – Olha, ainda no final do ano, em dezembro, um novo grupo, que inclusive eram credores da Zamin no processo de recuperação judicial, apresentou uma nova proposta e a justiça em São Paulo deu ganho para esse grupo, que buscou também o destravamento da questão da ferrovia, que estava em poder do Estado do Amapá. Para que eles viessem a consolidar o processo de recuperação precisava que o estado retomasse o processo de concessão da Estrada de Ferro do Amapá, considerada fundamental para o processo de escoamento do minério.
Diário – E isso já aconteceu?
Joselito – Hoje existe uma discussão, aliás já consolidado, pois o governo entende que não é mais do interesse que a estrada de ferro seja utilizada apenas para o escoamento do manganês, pois temos várias produções que estão se avolumando, estão crescendo mesmo, seja o mercado de grãos, seja na madeira, com a questão da floresta de produção, além de outros produtos que vão precisar da ferrovia. Então numa negociação com a empresa foi feita essa proposta, houve o aceite por parte dela e firmamos um contrato, com uma nova concessão, então a empresa deve iniciar esse processo de recuperação, priorizando questões de dívidas trabalhistas, um valor significativo, algo entre 10 a 12 milhões de reais para enfim retomar o processo de produção e exportação de minério.
Diário – Qual empresa exatamente?
Joselito – Se não estou enganado chama-se IndoSino, ligada a outros grupos, associados a ingleses, indianos também, isso foi em dezembro, mas nos próximos dias eles deverão comprovar os depósitos das dívidas trabalhistas junto à justiça de São Paulo para só assim iniciar as tratativas para o destravamento dos recursos, contratar novamente pessoal aqui no Amapá e retomar as atividades. Mas o governo, através da Procuradoria do Estado, a Seplan e a própria Agência Amapá e a Setrap, formou um grupo de trabalho que está de fato acompanhando bem de perto esse processo.
Diário – O estado já chegou a fazer um certame licitatório para arrendar os trens, mas deu deserto pelo que se soube. Para a ferrovia funcionar tem que destravar a mineração, não é?
Joselito – Exatamente. A estrada de ferro só se viabiliza com certeza com a produção de minério. E desde aquele acidente com o porto da Zamin, aquilo coincidiu com a queda brusca no preço do minério de ferro no mercado internacional, de 130 dólares para cerca de 40 dólares a tonelada. Hoje vem se ensaiando aí uma recuperação no preço do minério, que em determinados momentos chega ao valor de 80 a 90 dólares [a tonelada]. Só que isso precisa se manter numa certa constância, pois essa oscilação, principalmente em função dessa guerra comercial dos Estados Unidos com a Chin, isso tudo impacta nesse mercado, daí essa inércia na questão da própria ferrovia, pois temos um custo interno muito alto para a produção e lavra do minério, algo em torno de 70 dólares por tonelada, então se o preço está abaixo do custo de produção não tem como nós atrairmos indústria para explorar e produzir minério, temos que esperar esse preço melhorar, ter realmente uma tendência mês a mês de crescimento para que essas empresas comecem a fazer os investimentos, mas com certeza com a valorização do preço do minério essas empresas vão chegar e recuperar a estrada e reestabelecer a mineração no Amapá.
Diário – Uma vocação histórica do estado.
Joselito – A mineração sempre foi o carro chefe da nossa economia, os maiores níveis de crescimento da economia do estado sempre estiveram vinculados, associados com a mineração, mas obviamente que hoje estão surgindo novas matrizes de produção, mas que ainda estão insipientes, como a própria questão da soja e o milho, que eu como economista acredito que realmente tem tudo para vir a ser o grande motor da nossa economia, apenas bastando que se superem alguns gargalos, não tão difíceis de se resolver, que são questões do ponto de vista administrativo, como os licenciamentos ambientais e a regularização fundiária. Superados esses fatores com certeza ao invés de engatinhar com a produção agrícola, saindo dos atuais 18 mil, 20 mil hectares, para algo acima dos 100 mil hectares de área plantada no Amapá, pois as condições para isso nós reunimos, com comprovação de entidades como o IEPA e a Embrapa de que no próprio Cerrado já desmatado produzir numa área de 300 mil a 400 mil hectares de produção de grãos.
Diário – Ainda sobre a ferrovia, o tempo de espera por uma solução tem sido cruel com ela, que a cada dia sofre com as intempéries, a ação de vândalos, o que até dificulta se avaliar o tamanho do investimento que precisa ser feito para a recuperação daquele patrimônio.
Joselito – Esse estudo já foi feito pela Setrap [Secretaria de Estado dos Transportes], que é o órgão responsável pela ferrovia hoje, isso já tem um ano, então provavelmente é só uma questão de atualizar os dados, mas a questão do estado da ferrovia, o diagnóstico do montante de recursos que precisam ser empregados, enfim, o estado tem e pode apontar para as empresas que tiveram o interesse, mas não tenho nenhuma dúvida de que é um aporte significativo, mas que pode ser feito de maneira gradativa até a plena recuperação do trem.
Perfil…
Entrevistado. O economista Joselito dos Santos Abrantes é amapaense, natural de Serra do Navio; entre seus títulos acadêmicos é doutor em Desenvolvimento Socioambiental pela UFPA; Mestre em Desenvolvimento Sustentável pela UnB; Especialista em Teoria Econômica e Sustentabilidade pelo CEAP. Especialista em Agenciamento da Inovação e Difusão Tecnológica pela UNIFAP e Especialista em Gestão de Projetos de Arranjos Produtivos Locais pelo ILPES/CEPAL. Analista II do Quadro de Técnicos do SEBRAE/AP e Professor Titular do Centro de Ensino Superior do Amapá (CEAP). Atualmente exerce o cargo de vice-presidente da Agência Amapá de Desenvolvimento Econômico (Agência Amapá/GEA).
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