Entrevista

“O bom empreendedor, o bom empresário, não demite o bom funcionário”.

Enquanto muitos parlamentares até evitem falar a repeito das reformas que o Governo Federal tenta emplacar no Congresso Nacional, em meio a muito desgaste perante a opinião pública, eis que um deputado do Amapá decide encarar entrevista no rádio para defender o ponto de vista de quem está apoiando algumas medidas. Trata-se de Cabuçu Borges (PMDB-AP) que foi sabatinado ontem no programa Conexão Brasília, na Diário FM. O jornalista Cleber Barbosa conduziu a entrevista, que contou com pontos mais agudos, com a participação de ouvintes e até eleitores do próprio parlamentar. Ele construiu sua linha argumentativa no fato de que o país precisa retomar seu crescimento e produzir cada vez mais, daí a modernização nas relações de trabalho, mas descarta perda de direitos ou garantias aos trabalhadores.


CLEBER BARBOSA
DA REDAÇÃO

Diário do Amapá – Neste sábado passa a viger para todos os efeitos a reforma trabalhista quer o senhor votou pela aprovação lá no Congresso Nacional não é?
Cabuçu Borges – Isso, hoje entra em vigência a nossa lei trabalhista, que na realidade é uma modernização, pois a lei trabalhista continua prevista em nossa Constituição Federal e ela não mudou basicamente nada do que estava previsto, então quem diz que retira direitos está equivocado ou usa como discurso. Mas ela não retira nenhum direito, repito. Na realidade ela só se atualiza, pois o Brasil não é um país isolado, ele está no contexto internacional e a economia está globalizada e nós estamos perdendo mercado, para o Paraguai, para a Argentina, para o Peru, então a gente tem que pensar em reinventar o Brasil. E você sabe que a legislação trabalhista remonta aos idos de 1943, instituída por Getúlio Vargas, então nós temos que reavaliar todo um contexto, pois estamos entrando numa quarta fase do processo de industrialização, então quem pegou ainda a época da tevê a válvula, da máquina de datilografar, enfim, e depois a época das videolocadoras, que hoje tiveram que fechar as portas, porque o mundo está em constante modificação. Então você não pode pensar num Brasil letárgico, um brasil paralisado, nós não temos vocação pra isso, afinal somos um país capitalista e até onde até o meu conhecimento permite, não conheço nenhum país capitalista que tenha dado certo.

Diário – É uma questão de mercado então?
Cabuçu – Nós temos que pensar num país produtivo, num país empreendedor. Esse é o meu conceito, esse é o meu entendimento. Sou economista, né? Então eu entendo que ou a gente faz do Brasil um país competitivo até mesmo em nível internacional ou nós estamos fadados ao fracasso.

Diário – O senhor falou de Getúlio Vargas e ele inaugurou uma era, a do trabalhismo, então quando o atual governo começou a mexer nessas questões como a reforma trabalhista os trabalhadores temiam perder o que consideram conquistas históricas. Isso não vai ocorrer?
Cabuçu – Claro que não. O problema todo é que o Brasil nessa evolução, de filhos para netos, com as próximas gerações que virão, temos que olhar para o futuro e não apenas para o próprio umbigo, esquecendo que as futuras gerações precisam receber das mãos da atual um país melhor. Como está o Brasil hoje é resultado de políticas que a gente não teve o cuidado, políticas imediatistas, políticas… porque existem dois tipos de projeto: o de poder e o de Brasil. Então se investiu muito num projeto de poder e se esqueceu do Brasil. Nós estamos incluídos, como disse, num contexto internacional, então se a gente não se preparar, não se reinventar nós vamos continuar com a pecha do país da malandragem. O Walt Disney, na década de 1930, retratou o Brasil como o [personagem] Zé Carioca, aquele que fila a feijoada do Pedrão, enrola a Rosinha e nunca casa e é amigo do Nestor, que não trabalha. Então é o país da malandragem que ainda está no inconsciente de muita gente.

Diário – E daí a ser um país empreendedor, como fazer deputado?
Cabuçu – O bom empreendedor, o bom empresário, não demite o bom funcionário; o mau empresário não vai para frente; aquele mau empreendedor, aquele que explora a mão de obra de forma irresponsável. E agora, mais do que nunca, o espaço da malandragem está se reduzindo até chegar a zero, pois não se cria em lugar nenhum.

Diário – O governo de Michel Temer usou como blindagem para os desgastes das reformas que julga serem necessárias o fato de que ele não disputará reeleição, mas agora o senhor diria que essa falta de aprovação não estão complicando ainda mais o objetivo de emplacar as reformas?
Cabuçu – olha, mudando um pouco de assunto, esta semana eu estava numa comissão lá em Brasília onde participava o ministro do desenvolvimento social, Osmar Terra, quando um deputado do PT o abordou e reclamou dizendo que esse governo tirou mais de 1 milhão de pessoas do Bolsa Família e disse mais, que era um governo ilegítimo, golpista, enfim, esse é o discurso deles, né? Então o ministro disse que ele estava equivocado, que não foi 1 milhão, mas sim 4 milhões e meio de pessoas que perderam o Bolsa Família, mas porque ao fazer um pente fino, uma malha fina como se diz no imposto de renda, descobriu-se que no Bolsa Família tinha até vereador [recebendo], tinha até empresário; então nesse cruzamento quem não se adequa sai realmente, pois o Bolsa Família é realmente para quem precisa e ao se abrir espaço para inscrições esvaziou-se a fila.

Diário – E o fato do senhor ter votado nessa reforma trabalhista, ainda causa algum desconforto junto aos eleitores?
Cabuçu – Tenho falado abertamente sobre isso, desafiando a que me apontem um único direito do trabalhador que tenha sido retirado na reforma. A única questão que tem gerado algumas manifestações tem a ver com o imposto sindical, pois o trabalhador agora não e obrigado a pagar o imposto sindical, então os sindicatos que não se organizarem – e isso foi até bom para os sindicatos – porque eles viviam no conforto do imposto sindical e agora não ter que se organizar, se reinventar e prestar contas dos recursos que realmente utilizavam. Então quando ocorre um questionamento de um eleitor nosso reafirmo que continuo honrando esse voto pois estou pensando nos seus filhos e em seus netos. Eu sempre digo que todos os meus votos foram responsáveis, como por exemplo no projeto da terceirização.

Diário – Que também passou como muitas críticas de alguns setores, não é?
Cabuçu – Um exemplo de terceirização é o [programa] Mais Médicos, a Copa do Mundo, as Olimpíadas que aconteceram aqui no Brasil, nós só fizemos regulamentar. Mas essa questão, assim como a reforma trabalhista, é necessário que a gente espere uns seis meses para vê-las em prática, vamos ver como a nação vai reagir, sentir seus efeitos.

Diário – Esta semana o senhor também puxou outra questão bastante polêmica recebendo bancadas estaduais do Amapá e do Pará que estão querendo um novo debate sobre a extinção da Renca, a Reserva Nacional do Cobre. O que ficou daquele encontro?
Cabuçu – A questão da Renca, e é por isso que eu chamo de visão romântica, é que nós temos muitos garimpeiros lá na região de Tartarugalzinho que estão passando fome; nós temos o povo brasileiro passando necessidade estando em cima da riqueza; se nós tivermos de novo uma eclosão de manifestações é porque o cara chega em casa e vê o filho chorando e não ter como suprir aquela necessidade dos filhos, é duro. Eu sou contra o garimpo ilegal, o garimpo irresponsável, mas quem é que quer trabalhar nessas condições? Daí o debate sobre a legalização dessas atividades na Renca. Engraçado, quando se abre uma mina no Canadá o povo aplaude; quando se abre uma mina lá na Austrália o povo aplaude, afinal é mais riqueza. E aqui no Brasil por que temos que inibir a produção de riquezas? Tá errado! Nós temos que tornar o Brasil um país competitivo, um país produtivo. Olha, o poder público não abraça todo mundo, quem tem o sonho de ser servidor público, beleza! Só que a tendência do Estado é ele ser mínimo, é a política do estado mínimo. Nós vamos ter uma revolução industrial muito grande e quem for pego com as calças na mão vai ver o bonde passar!

 

Perfil…

Entrevistado. O amapaense Luiz Gionilson Pinheiro Borges, o Nilson Borges, tem 52 anos de idade, é casado e pai de três filhos. Formado em Economia pela Universidade Federal do Pará (UFPA) em 1985, mas começou paralelamente a carreira de humorista, criando o personagem Vardico, da dupla Os Cabuçus. A parceria só acabou com a morte de Pádua Borges, o Lurdico, ocorrida exatamente no início da campanha eleitoral. E o parceiro deixou gravada dois dias antes de morrer a música que embalaria a corrida pelo voto, mesmo em meio à comoção que o falecimento prematuro do artista provocou na família e nos fãs. Foi eleito um dos oito deputados federais do Amapá com mais de 18 mil votos, sendo o terceiro mais votado, adotando o nome Cabuçu.


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