Entrevista

“O resultado das urnas diverge das estatísticas e índices apontados por pesquisas”

Dois temas permeiam as discussões sobre as eleições do domingo passado: o resultado da votação; e as eventuais diferenças numéricas entre este resultado e os índices estabelecidos pelas pesquisas eleitorais.


Cleber Barbosa
Da Redação

 

Diário do Amapá – Como efeito automático da polarização que vivemos atualmente, ambos os temas fomentam opiniões controvertidas, discussões baseadas em “achismo” e, a não menos equivocada, atuação de parlamentares com vistas à criminalizar qualquer circunstância contrária a opinião dos seus eleitores.

Acácio Miranda – Inegavelmente, o resultado das urnas diverge das estatísticas e índices apontados por grande parte dos institutos de pesquisa. E mesmo que existam justificativas razoáveis para tanto metodologia usada, variações numéricas e até a mudança de voto, de forma a torna-lo “útil” , com base nos próprios números divulgados, os legisladores optaram pela solução mais imediatista e danosa: criminalizar a realização de pesquisas eleitorais feitas por institutos, de forma, creio eu, a dar uma resposta à sociedade inconformada com as divergências, e também, de forma a só permitir e validar pesquisas informais, as tais enquetes nas redes sociais, que são ainda mais enviesadas, em virtude dos algoritmos.

 

Diário – A partir desta “solução”, dois aspectos jurídicos mereceram análise: a regulamentação e os regramentos das pesquisas eleitorais; e a compatibilização das propostas de criminalização das pesquisas com a teoria chamada Direito Penal Emergencial.

Acácio – No que diz respeito à regulamentação das pesquisas eleitorais, atualmente vigora a resolução 23.600/TSE – com as alterações operadas através da resolução 23.673/2021/TSE – construída com base nas determinações do artigo 33 e seguintes, da Lei 9.504/97. Importa frisar que referida Lei vigora há mais de 25 anos, e desde a sua vigência inúmeras foram as resoluções feitas pela Tribunal Superior Eleitoral com base no seu texto, como decorrência lógica de um processo de maturação e aperfeiçoamento com o passar das eleições. Obviamente, qualquer resolução, assim como todas as leis e até o próprio texto constitucional, está sujeita a imperfeiçoes e críticas, o que pode ser corrigido através de um amplo processo de discussão, com a possibilidade de participação de todos os atores sociais interessados e atingidos..

 

Diário – Inclusive, a própria resolução atual foi submetida as mais plurais e democráticas discussões, especialmente com a aceitação de propostas vindas do Congresso Nacional, dos partidos políticos, de associações de classe e de especialistas em pesquisas, estatísticas além de opiniões jurídicas.

Acácio – Como qualquer outro processo democrático e decisório, foram acolhidas as propostas da maioria, à partir da análise dos seus critérios de sustenção, da sua compatibilidade com o ordenamento jurídico e com a devida fundamentação dos critérios de escolha pelo órgão competente. Não bastasse essa contrariedade ao conteúdo construído com a participação do próprio Congresso, agora, com o açodamento próprio de quem está mais preocupado com a velocidade da resposta do que com a solução do problema, alguns parlamentares propõe a criminalização da realização de pesquisas eleitorais.

 

Diário – Radicalismo, contrariedade a um dos princípios vetores do ordenamento jurídico, o Direito Penal de “ Ultima Ratio”.

Acácio – Os parlamentares poderiam propor alterações ao texto da Lei 9.504/97, que é o foro próprio para tanto, não sem razão chamada de Lei Geral das Eleições. Para jogar para os próprios torcedores, a solução proposta foi a criminalização destes fatos, em perfeita consonância a umas das modalidades mais gravosas de populismo, o Direito Penal Emergencial. Doutrinariamente, há consenso sobre o conceito de Direito Penal Emergencial, segundo o qual são construídas através do Direito Penal respostas desproporcionais e inadequadas, aptas a violar direitos e garantias fundamentais, à partir de circunstâncias concretas amplamente divulgadas pela mídia e pelas redes sociais. Em resumo: a mencionada gravidade da circunstância, não fosse a massiva exploração do seu conteúdo, jamais ensejaria uma resposta tão contundente, tal como matar um inseto usando uma bazuca.

 

Perfil

Acácio Miranda Fº – Exerce a docência desde 2010. Autor e coautor de livros jurídicos. Formação acadêmica composta por cursos no Brasil, Espanha, Alemanha e Portugal. Advogado criminalista. Experiência no exercício de cargos técnicos e políticos na Administração Pública Estadual, na Municipal e na Regional. 

 

Formação Acadêmica
– Doutorado em Direito, Direito Constitucional, pelo Instituto de Desenvolvimento e Pesquisa, IDP
2019 – 2022

– Pós-graduação Lato Sensu – Especialização, Direito Penal Econômico, pela
Universidade Castilha La Mancha
2019 – 2019
– Master’s degree, Direito Penal Internacional, pela Universidade de Granada
2012 – 2015

Especializações e habilitações
– Professor Universitário, Membro do Conselho Editorial do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), membro convidado do Conselho Superior de Direito da Fecomercio e associado ao Instituto Brasileiro da Advocacia Pública; Pós-Graduado em Processo Penal Pela Escola Paulista da Magistratura, em Direito Penal pela Escola Superior do Ministério Público, em Criminologia.

 


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