Coletivo Criaturas Alaranjadas apresenta o espetáculo “Eros Impuro”
“Esse material nasceu de um pedido do nosso público, que sente a necessidade de informação para educar as crianças que o rodeiam”, completa Jones.
Depois de passar por Porto Velho (RO), movimentando público superior a mil espectadores, “Eros Impuro”, um dos projetos agraciados pelo Programa Petrobras Distribuidora de Cultura, segue a itinerância da região Norte, em Macapá. De 17 a 20 de maio, a peça entra em cartaz no Teatro Bacabeiras, às 19h, com entrada franca. Após sessão do dia 18 (Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Infantil), haverá o painel de debate “A arte diz não ao abuso sexual contra crianças e adolescentes”, com a presença de representantes da sociedade civil e do município e do estado, que trabalham pelos direitos da criança e do adolescente. O projeto vai levar alunos de escola pública para participar das atividades. Não recomendado para menores de 18 anos.
Nascido em Brasília em abril de 2011, “Eros Impuro” toca numa das mazelas da humanidade: a violação ao corpo infantil por meio do sexo e da erotização. Considerado tabu na sociedade, já que a maioria das vezes esse tipo de crime ocorre em ambientes ditos seguros para meninos e meninas (igreja, escola, lar), o abuso sexual é levado ao teatro por meio de uma linguagem sutil, que flerta com o universo subjetivo da criação. “O público não é submetido ao choque provocado por esse tipo de crime. Ele não é posto na poltrona como se tivesse diante de um noticiário sensacionalista. Usamos a delicadeza da arte para criarmos um âmbito que evidencia, sobretudo, as sequelas do abusado”, destaca o diretor e dramaturgo Sérgio Maggio, cujo texto foi premiado, na temporada paulista da montagem, como Melhor Dramatur gia de 2013 pelo Portal R7.
Pintura ao vivo
A chegada a Macapá é comemorada pelo grupo. “Chegaremos à capital do Amapá movidos por uma vivência forte, que tivemos em Porto Velho, onde observamos a força que a montagem tem como catalisadora de uma discussão urgente para a sociedade”, ressalta o ator e artista plástico Jones de Abreu, que pinta um quadro ao vivo a cada sessão. Na cidade, eles pretendem distribuir 1 mil unidades de cartilha de prevenção ao abuso. “Esse material nasceu de um pedido do nosso público, que sente a necessidade de informação para educar as crianças que o rodeiam”, completa Jones.
Na cidade de Macapá, o grupo vai realizar atividades paralelas de formação de plateia em escola pública. Um dos destaques no escopo de viagem é a oficina gratuita “O Exercício da Crítica Teatral”, voltada para artistas, estudantes e amantes do teatro e ministrada por Sérgio Maggio (que tem mestrado em crítica pela Universidade de Brasília). Vai ainda ocorrer encontro com artistas locais para uma troca estética.
“Eros Impuro” já circulou por 16 capitais, fez 110 sessões e foi visto por mais de 10 mil espectadores. Já esteve em festivais em Brasília. Vitória, Goiânia e Recife, além de turnês em Salvador, Belo Horizonte, Curitiba, Belém, Fortaleza, João Pessoa, São Luis, Porto Alegre, Natal, Porto Velho e São Paulo, onde realizou temporada de 25 sessões com êxito de crítica.
A narrativa revela o drama do pintor Andrei, que sofreu abusos quando criança e tenta se livrar, por meio da arte, da angústia que o persegue. Andrei acredita que encontrará sua redenção quando reproduzir na tela a mesma energia sentida no momento do ato de violência. Mas, como os modelos vivos usados por ele são garotos de programa, sua obra é vista como pornográfica. O pintor é julgado e marginalizado pela sociedade conservadora, e vê-se impedido de expor em galerias e acuado em seu processo obsessivo de criação.
Inspirada também nos limites da arte erótica e no caos da criação artística, que envolve sanidade e loucura, a montagem “Eros Impuro” é fruto da fruição artística do diretor-dramaturgo Sérgio Maggio, que teve a ideia da obra depois da experiência criativa de observar uma tela do ator, artista plástico e protagonista da peça Jones de Abreu. A partir do quadro (que pontua como um gesto cotidiano pode incitar um pensamento erótico), o roteiro foi criado propondo um questionamento sobre as sequelas do abuso sexual.
Para criação da personagem Andrei, no processo de laboratório para viver o pintor, o ator Jones de Abreu visitou um hospital psiquiátrico em Brasília. Conversou com pacientes vítimas de abuso sexual, “algumas de sexualidade muito aflorada”, e que, portanto, são censurados pela sociedade. De sua visita à clínica, Jones tirou muitas características de seu personagem – principalmente de uma mulher que desenvolveu neuroses por ter sido vítima de violência sexual cometida, quando era criança, pela mãe.
“Eros Impuro” tem figurino inspirado na obra de Arthur Bispo do Rosário – um parangolé, espécie de manto usado pelo ator. O cenário reproduz uma tela em branco que vai sendo pintada à medida que a iluminação traça seu desenho. A trilha sonora inclui trechos de peças radiofônicas do ator e diretor francês Antonin Artaud. Também há o recurso da projeção de vídeos caseiros, retratando casais em relações sexuais e projeções de obras de artes eróticas.
O espetáculo tem a direção e texto de Sérgio Maggio com Jones de Abreu, iluminação (Vinícius Ferreira), coordenação pedagógica (Tainá Baldez), produção Macapá (Cláudio Silva). Depois da sessão do dia 18 (quarta-feira), haverá o debate “A arte diz não ao abuso sexual contra crianças e adolescentes”. (Texto: Sérgio Maggio/Foto: Cláudia Ferrari).
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