Polícia

Operação Minamata: Justiça recebe denúncia do MPF contra promotor aposentado e outros três

Os quatro vão responder por reduzir trabalhadores a condição análoga à de escravo, organização criminosa e, dois deles, por embaraço à investigação


A Justiça Federal recebeu denúncia do Ministério Público Federal no Amapá (MPF/AP) contra os integrantes do principal núcleo de investigados na Operação Minamata. São réus na ação Moisés Rivaldo Pereira, promotor de Justiça aposentado, Antonio de Sousa Pinto, presidente da Cooperativa de Garimpeiros do Lourenço (Coogal), Romero César da Cruz Peixoto, ex-diretor da Superintendência Regional do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), e Raimundo Nonato Martil Piaba, vereador do Município de Calçoene. Os quatro vão responder por reduzir trabalhadores a condição análoga à de escravo, por organização criminosa e, dois deles, por embaraço à investigação. O juízo da Subseção Judiciária de Oiapoque também acolheu parecer do MPF para manter presos os quatro.

Na denúncia do MPF, Antonio Pinto, presidente da Coogal desde 2010, é apontado como responsável pelo planejamento, tomada de decisões e pela execução de tarefas da organização criminosa. Era ele quem fazia a intermediação de interesses da cooperativa e dos demais integrantes, atuando também no trato com os cooperados. Ele e os outros três sujeitaram trabalhadores a condições degradantes de trabalho e a jornada exaustiva, bem como restringiram sua liberdade de locomoção em razão de dívidas contraídas.

As investigações, inicialmente, apontavam o promotor de Justiça aposentado Moisés Rivaldo como investidor do garimpo. Consta nos autos que ele pagou R$ 800 mil à Coogal pela exploração da mina Salamangone – interditada pelo DNPM desde 2008, em razão de acidentes ocorridos no local. Por meio de interceptações telefônicas, comprovou-se que Moisés Rivaldo era integrante do núcleo político da organização. “Promotor Moisés” era assunto frequente nas conversas interceptadas.

O membro aposentado do Ministério Público do Estado do Amapá utilizava sua influência política para cuidar de temas do seu interesse e da organização criminosa, tendo inclusive recebido procuração de Antônio Pinto para tratar de assuntos da Coogal junto ao DNPM. Com Romero Peixoto, ex-presidente do DNPM, Moisés mantinha contato permanente. Entre os motivos estavam a desinterdição da mina Salamangone e a retirada de qualquer tipo de obstáculo no DNPM ou em outro órgão público.

Até a deflagração da Operação Minamata, em 30 de novembro, Moisés ocupava o cargo de secretário de Educação de Macapá. Antes disso, foi candidato à Prefeitura do Município e ao Senado pelo Amapá. Assim, construiu uma rede de relações políticas com a finalidade de facilitar suas pretensões no Lourenço. “Toda a estrutura de trabalho – ou a falta dela – encontrada no Lourenço não poderia se perpetuar não fosse a existência de pessoas como Moisés, investidor e facilitador dos negócios da cooperativa”, argumenta o MPF na denúncia. Ao agir como agente facilitador dos interesses da Coogal, “Moisés concorreu para o crime permanente de redução de trabalhadores à condição análoga a de escravo, e deve responder na medida de sua culpabilidade”, complementa o órgão.

O vereador Raimundo Piaba mantinha estreita relação com Romero Peixoto. Eles também integravam o braço político-administrativo da organização criminosa, responsável por assegurar a leniência dos órgãos estatais em relação às irregularidades evidenciadas no Distrito do Lourenço. Os dois atuavam em parceria como facilitadores dos negócios da cooperativa junto a autoridades públicas no Amapá e em Brasília.

Romero Peixoto prestava assessoria aos demais integrantes da organização sobre os títulos minerários e demais interesses da Coogal no DNPM. Como superintendente do órgão, teve a oportunidade de “fazer vista grossa” às irregularidades – como disse em uma das conversas interceptadas. Os envolvidos no esquema tinham pleno conhecimento da situação existente

no Lourenço, conhecendo o modo de produção realizado no local, as mortes – mais de 20 na última década –, a ausência de segurança aos trabalhadores e de condições dignas de trabalho. Ainda assim, fomentavam a atuação ilícita da organização criminosa, com evidente divisão de tarefas.

“É vergonhoso ver que as pessoas que efetivamente trabalham no Lourenço são as que menos lucram com a atividade, correndo todos os dias risco de morte nas frentes de lavra, suportando todas as mazelas de uma área como essa, que não possui infraestrutura mínima para o exercício da atividade em condições dignas”, salienta o MPF.

Ainda estão em andamento as investigações referentes aos crimes de lavagem de dinheiro, sonegação de tributos, crimes ambientais e usurpação do patrimônio. Os órgãos públicos que participaram do trabalho coordenado pelo MPF estão em intensa atividade para a conclusão da análise de todo o material colhido na operação. Assim, pode ser revelado o envolvimento de mais pessoas e condutas, inclusive pelas mesmas infrações das quais são acusados os quatro réus.

Penas
Por compor organização criminosa, Antônio Pinto, Moisés Rivaldo, Romero Peixoto e Raimundo Piaba podem ser punidos com pena de reclusão de três a oito anos e multa. A redução de trabalhadores a condição análoga à de escravo pode resultar em penas superiores a quatro anos. Se condenados por embaraçar as investigações, Moisés Rivaldo e Antônio Pinto estão sujeitos a reclusão de três a oito anos e multa.

Número da ação para pesquisa na Subseção Judiciária de Oiapoque: 0000436-04.2017.401.3102


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