Política Nacional

Ministro do STF homologa delação premiada de Delcídio do Amaral

O senador foi preso em novembro por tentar fraudar as investigações da “lava jato”, mas liberado em 18 de fevereiro sob condição de se manter em recolhimento domiciliar, podendo deixar a sua residência apenas para ir ao Senado trabalhar e retornando no período noturno. Desde então, ele está de licença médica e deve retornar ao trabalho no próximo dia 23 de março.


O ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zavascki homologou na segunda-feira (14/3) o acordo de delação premiada do senador Delcídio do Amaral (PT-MS), firmado com a Procuradoria-Geral da República.

O senador foi preso em novembro por tentar fraudar as investigações da “lava jato”, mas liberado em 18 de fevereiro sob condição de se manter em recolhimento domiciliar, podendo deixar a sua residência apenas para ir ao Senado trabalhar e retornando no período noturno. Desde então, ele está de licença médica e deve retornar ao trabalho no próximo dia 23 de março.

O documento possui 21 termos de declarações do parlamentar, nos quais ele aponta, de acordo com a PGR, “crimes praticados pelas organizações criminosas no âmbito do Palácio do Planalto, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados, do Ministério de Minas e Energia, e da companhia Petróleo Brasileiro S/A, entre outras”.

De acordo com a PGR, Delcídio também se comprometeu a pagar R$ 1,5 milhão pelos crimes que praticou.

Depois de analisar o compromisso, Teori ordenou que a PGR refizesse a cláusula 10 dele, que estabelecia prazo mínimo de 180 dias para o levantamento do sigilo do acordo e dos termos de declarações. Depois de reescrita, essa seção passou a determinar que o segredo valha só até a homologação do documento.

Com base nisso, o relator da “lava jato” no STF tornou pública a colaboração premiada do senador. A seu ver, não há motivos para restringir a publicidade do termo, uma vez que a imprensa já noticiou que Delcídio decidiu contribuir com as investigações e que a própria PGR não se opôs à divulgação.

Teori Zavascki somente se opôs a um ponto do acordo: a expressão “renuncia” à garantia contra a autoincriminação e ao direito ao silencio, constante no Título VI do documento. Na visão do ministro, tal redação pode ser interpretada como renúncia a direitos e garantias fundamentais, algo que ninguém pode fazer. Para corrigir isso, ele recomendou que tal cláusula fosse interpretada “com a adição restritiva ‘ao exercício’ da garantia e do direito respectivos no âmbito do acordo e para seus fins”.

Levantamento feito pela ConJur apontou que todos os acordos de colaboração premiada da operação “lava jato” obrigam quem os assina a renunciar ao direito ao silêncio e à garantia contra a autoincriminação (artigo 5º, LXIII, da Constituição). O advogado e professor de Direito Penal da UFMG Marcelo Leonardo afirma que não se pode renunciar a um direito constitucional, menos ainda a um que também está previsto na Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), e é considerado um instrumento contra a tortura praticada por agentes públicos. O Brasil é signatário do Pacto, o que lhe confere força de lei no país.

Políticos acusados

Em trechos do documento vazados à imprensa, Delcídio revelou que a presidente Dilma Rousseff e o antecessor dela, Luiz Inácio Lula da Silva, sabiam de crimes na Petrobras e agiram para evitar que eles fossem revelados.

Segundo reportagem da IstoÉ, o senador garantiu que Dilma tentou por três vezes interferir na operação “lava jato” com a ajuda do ex-ministro da Justiça e atual advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo.

Em uma delas, a presidente teria tido uma reunião com Cardozo e com o presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, em Portugal, para pedir uma mudança nos rumos da “lava jato”. Contudo, o encontro teria fracassado com a negativa do ministro do Supremo em participar do esquema.

Outra ação de Dilma seria a tentativa de indicar para o Superior Tribunal de Justiça o presidente do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Nelson Schaefer, para votar pela libertação dos acusados Marcelo Odebrecht (presidente do grupo Odebrecht) e Otávio Azevedo (ex-presidente da Andrade Gutierrez) — a indicação de Schaefer acabou não ocorrendo.

A terceira iniciativa citada pela revista teria sido indicar Marcelo Navarro para o Superior Tribunal de Justiça com a intenção de que aceitasse os recursos de empreiteiros presos na operação. Navarro, no entanto, deixou a relatoria dos processos da “lava jato” na corte.

Conforme a publicação, o senador petista ainda teria dito que Dilma sabia do superfaturamento na aquisição da refinaria de Pasadena pela Petrobras. Já Lula seria acusado por Delcídio de ordenar a ele que tentasse convencer o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró de não implicar o fazendeiro José Carlos Bumlai em acordo de delação premiada.

A IstoÉ diz ainda que ex-presidente também agiu na operação zelotes para evitar a convocação do casal Mauro Marcondes e Cristina Mautoni para depor. A razão seria que o fundador do PT estaria com medo de que eles revelassem repasses irregulares à empresa de seu filho Luís Cláudio e confirmassem repasses para o governo aprovar a Medida Provisória 471/2009, que beneficiou o setor automobilístico.

Além disso, a IstoÉ aponta que Delcídio do Amaral contou aos procuradores que, em 2006, Lula e o ex-ministro Antônio Palocci comprara, por R$ 220 milhões, o silêncio de Marcos Valério no caso do mensalão. O petista ainda citou irregularidades dos peemedebistas Renan Calheiros (AL), Romero Jucá (RR), Edison Lobão (MA), Jader Barbalho (PA), Eunício Oliveira (CE) e Valdir Raupp (RO), e do líder da oposição Aécio Neves (PSDB-MG). O ministro da Educação, Aloizio Mercada nte, foi acusado por Delcídio de oferecer ajuda financeira para que ele não delatasse tudo o que sabia, conforme informou a revista Veja.

Renúncia de advogados

Diante das informações de que Delcídio do Amaral assinou um acordo de delação premiada, advogados que o defendiam na operação “lava jato” deixaram o caso. Entre os dias 3 e 4 de março, os advogados Luiz Henrique Machado e o ministro Gilson Dipp, aposentado do Superior Tribunal de Justiça, renunciaram ao mandato. O advogado Raul Amaral continua na equipe de defesa.

Maurício Silva Leite, que representava o senador no Supremo Tribunal Federal, deixou a equipe depois que Delcídio foi solto pelo ministro Teori Zavascki, no dia 19 de fevereiro. Ele informou que seus serviços se encerraram no momento da concessão do agravo que o libertou.

Os advogados deixaram a defesa por não terem sido informados sobre o acordo de delação. Até a quarta-feira (2/3), relataram, Delcídio negava qualquer tipo de acordo com o Ministério Público. Na nota divulgada por ele no dia seguinte, o senador não nega nem confirma que tenha feito delação, apenas diz que “não reconhecemos a autenticidade dos documentos” apresentados pela revista. Gilson Dipp trabalhava apenas na Comissão de Ética do Senado. No Supremo, trabalhavam Maurício Leite e Figueiredo Basto.

A ConJur não conseguiu contato na ocasião com o advogado Antonio Augusto Figueiredo Basto. Chamou atenção o fato de só Figueiredo Basto e Delcídio assinarem a nota divulgada. Desde que Basto foi contratado, em dezembro, se especulava que o motivo seria para costurar uma delação premiada, sua especialidade.

Críticas de Lula

O uso da delação premiada foi criticado por Lula no depoimento que prestou à Polícia Federal no dia 4 de março. “Não existe mais a política, não existe mais a Justiça, ou seja, existe uma quantidade de mentiras”, afirmou o ex-presidente, em um momento em que comentava uma suposta delação de Delcídio do Amaral divulgada no dia anterior. A transcrição do depoimento do ex-presidente foi divulgada na segunda-feira (14/3).

Segundo Lula, os acusados estão sendo condenados com base apenas em depoimentos de criminosos confessos. “Os empresários estão numa situação muito confortável, eu chego lá falo o seguinte ‘Olha, eu não tenho nada, foi o X que me forçou, ele que me pediu, ele que não sei das quantas.’ Está condenado o cidadão. Qualquer bandido que for prestar delação premiada vira manchete de jornal”, disse.

De acordo com o petista, o caso do mensalão deu início a um período no qual as pessoas não mais são condenadas pelo Judiciário, e sim pelas “manchetes dos jornais”, que “amedrontam a Polícia Federal, amedrontam o Ministério Público, amedrontam a Suprema Corte, amedrontam todo mundo, todo mundo”. Com isso, os acusados passam a ser intimidados nas redes sociais e tratados como criminosos antes de serem julgados, argumentou.

OAB investiga

O presidente do Conselho Federal da entidade, Cláudio Lamachia, afirmouque se forem confirmadas as acusações de Delcídio que a presidente Dilma Rousseff tentou interferir no andamento da operação “lava jato”, os advogados poderão protocolar um novo pedido de impeachment dela na Câmara dos Deputados.

No entanto, ele deixou claro que tal medida só será tomada após “um exame aprofundado, técnico, crítico e jurídico da instituição”, e depois de ser aprovado pelo Pleno do Conselho Federal e pelo Colégio de Presidentes das seccionais da OAB


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