Pandemia encontrou Brasil despreparado e deve agravar desigualdade social, afirma ONU
Pnud, Unicef, Unesco e Opas reuniram indicadores em relatório sobre a situação do país logo antes da Covid. Dados apontam para impacto mais perverso em grupos mais vulneráveis
Relatório inédito divulgado nesta quarta-feira (29) pela Organização das Nações Unidas (ONU) mostra que, embora a pandemia tenha atingido todos os países, as consequências devem ser piores para as nações com maior desigualdade social, como o Brasil.
O documento reconhece que o país acumula progressos nos índices de desenvolvimento humano, mas ressalva que a pandemia de Covid deve gerar retrocessos em conquistas sociais e econômicas históricas.
No estudo, pesquisadores selecionaram 94 indicadores com o objetivo de mostrar como estava o Brasil quando a pandemia chegou, no início de 2020. Os resultados apontam fragilidades estruturais e questões sensíveis para o enfrentamento da crise sanitária, econômica e social que atingiu o país nos meses seguintes.
O relatório foi elaborado por especialistas do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas).
De acordo com o documento, a pandemia desencadeia uma crise com impactos em todas as dimensões do desenvolvimento humano:
– na renda, com a maior retração da atividade econômica mundial registrada desde a Grande Depressão de 1929;
– na saúde, com um número de mortes acima de 4,5 milhões até setembro de 2021;
– na educação, com estudantes fora da escola, sem acesso à internet e um contingente de jovens que não voltarão mais a estudar, ampliando desigualdades já existentes.
No Brasil, diz o relatório, os grupos em situação de vulnerabilidade são os mais afetados, tornando ainda mais evidentes as diferenças de acesso à proteção social, educação, emprego, renda e moradia.
“Os países serão afetados, mas não da mesma forma; e, para o Brasil (seus 26 estados e o Distrito Federal), a desigualdade desempenha nesse contexto um papel importante”, diz o texto.
Para exemplificar como a pandemia afetou de forma desigual a população brasileira, o documento cita dados divulgados em fevereiro pelo Núcleo de Saúde Pública da UFRJ. De acordo com esse levantamento, a letalidade entre pacientes internados com casos confirmados de Covid foi de 56% entre brancos e de 79% entre não brancos.
Ao classificar os óbitos pelo nível de escolaridade das vítimas, os números mostraram:
– 71% de óbitos entre os sem escolaridade;
– 59% entre os que cursaram até o 5º ano (ensino fundamental 1);
– 48% entre os que cursaram até o 9º ano (ensino fundamental 2);
– 35% entre os que cursaram até o ensino médio;
– 22% para os pacientes que tinham nível superior.
Segundo material divulgado pelo site das Nações Unidas, a alta comissária da ONU para os direitos humanos, Michelle Bachelet, afirmou nesta terça-feira (28) que a crise relacionada à pandemia perpetuou desigualdades “verdadeiramente chocantes” e expôs grupos vulneráveis ao que ela classificou como um “choque médico, econômico e social”.
O relatório constata que, embora seja considerado um país de alto Índice de Desenvolvimento Humano (0,778), o Brasil ainda não conseguiu sanar necessidades básicas da população – o que resulta na existência simultânea de vários “Brasis”.
“Notadamente, apesar dos ganhos substanciais em saúde, educação e no padrão de vida da população registrados nas últimas décadas, ainda há um conjunto de necessidades básicas diferentemente atendidas no Brasil e nos seus estados.
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