Propostas no Senado alteram regras de processos de impeachment
Sessão de julgamento do pedido de impeachment de Dilma Rousseff, em 31 de agosto, quando o Senado aprovou o seu afastamento definitivo por 61 votos a 20
O impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff despertou no Senado uma série de dúvidas e questionamentos sobre os corretos procedimentos e consequências do processo de condenação de presidente da República por crime de responsabilidade. Após o encerramento da ação contra Dilma, senadores apresentaram propostas com o objetivo de esclarecer ou modificar aspectos do impeachment que, na opinião deles, são falhos.
Uma dessas iniciativas é uma PEC, de autoria do senador Aécio Neves (PSDB-MG), que define a abrangência cronológica dos fatos pelos quais um presidente pode ser denunciado ao Congresso Nacional. A PEC 46/2016 estabelece que, em caso de reeleição, o chefe do Poder Executivo pode ser processado por crimes de responsabilidade cometidos no curso do primeiro mandato.
A iniciativa se deve à forma como o então presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, acolheu o pedido de impeachment de Dilma. Na ocasião, Cunha não recepcionou as acusações que tratavam de fatos anteriores a 2015, ou seja, ocorridos durante o primeiro mandato da ex-presidente.
O argumento foi que a Constituição, ao não permitir que o presidente seja responsabilizado por “atos estranhos ao exercício de suas funções”, impede o prosseguimento de um processo com base em fatos anteriores ao mandato em curso. Essa visão foi contestada ao longo do processo por senadores favoráveis ao impeachment, que alegaram prejuízo à força da denúncia por falta de contextualização dos fatos.
Aécio considera essa interpretação uma “leitura literalista e reducionista” da norma constitucional, que foi redigida quando ainda não havia a possibilidade de reeleição para o cargo de presidente. Ele acredita que a sua proposta é “mais atenta à finalidade” do processo e “a única compatível com a forma republicana e o Estado de Direito”.
“Os fatos do primeiro mandato não são estranhos ao exercício das funções. Instituiu-se a reeleição sem que se tenha feito qualquer alteração formal na imunidade processual do chefe de Estado”, observa na justificativa da PEC.
A mudança, segundo ele, traria mais clareza e coerência às regras do processo de impeachment. A proposta está com a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), ainda à espera da nomeação de um relator.
Direitos
Também tramitam na CCJ os Projetos de Leis do Senado 251/2016, do senador Alvaro Dias (PV-PR), e 210/2016, do senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES). Ambos definem as regras procedimentais do impeachment, incorporando medidas do Código de Processo Penal – que é utilizado subsidiariamente no processo – e decisões recentes do Supremo Tribunal Federal (STF). Veja matéria sobre estes dois projetosaqui.
Outros dois projetos tratam dos direitos institucionais que devem ser garantidos ao presidente da República enquanto ele estiver afastado do cargo, durante a fase de apuração de provas, e após perder o mandato, com o julgamento final. Eles modificam a Lei 7.474/1986, que trata das medidas de segurança para ex-presidentes da República.
O senador Lasier Martins (PDT-RS) propôs o PLS 338/2016, que estende as prerrogativas de ex-ocupante do cargo ao presidente afastado temporariamente por processo de impeachment em curso – quatro servidores para segurança e apoio pessoal e dois veículos oficiais com motoristas.
Lasier afirma que há uma “lacuna” no ordenamento jurídico a respeito das prerrogativas de um presidente afastado para se defender em um processo de impeachment, e isso pode levar a interpretações divergentes. Ele considera justo conceder uma estrutura de serviço ao chefe de Estado nessa situação, desde que ela seja restrita.
“Os benefícios ao presidente afastado devem ser suficientes para assegurar o seu bem-estar e segurança, mas não podem se tornar excessivos ao ponto de criar uma corte paralela. A República não pode se tornar fonte de privilégios e benesses”, diz o senador na justificativa do projeto.
Já o PLS 343/2016, do senador Alvaro Dias, impede que um presidente cassado tenha acesso às mesmas garantias de ex-presidentes que concluíram o mandato. O argumento é que essas prerrogativas “rendem tributo à dignidade” dos chefes do Executivo, e que seria uma “total irrazoabilidade” dispensar o mesmo tratamento a quem foi removido do cargo por crime de responsabilidade.
“As providências legislativas de ex-presidentes que se conduziram dentro da legalidade não podem ser partilhadas com os que foram condenados por terem usado as competências, prerrogativas e poderes do cargo para o cometimento de atos ilícitos. Ofendem-se as instituições, os interesses financeiros da União e os princípios que se pretende estimular neste país”, argumenta ele.
Recursos
Fonte constante de críticas da acusação à ex-presidente Dilma durante todo o processo de impeachment, o volume de recursos apresentados pela defesa também é alvo de sugestão de mudança legal. O autor é o senador Raimundo Lira (PMDB-PB), que presidiu a Comissão Especial do Impeachment e viu várias de suas decisões se tornarem alvo de apelações dos advogados de Dilma.
Lira apresentou o PLS 341/2016, que modifica o Código de Processo Penal. Segundo o texto, o tribunal responsável por uma denúncia – no caso do impeachment, o Senado – pode decidir por conta própria que um determinado recurso apresentado é meramente protelatório e, assim, dar a decisão como julgada, sem que o recurso gere efeito suspensivo. O senador valoriza o instituto do recurso como ferramenta da defesa, mas alerta para exageros.
“O abuso no direito de recorrer no processo penal é por todos considerado inadmissível e tem conduzido a situações verdadeiramente esdrúxulas e já combatidas pela jurisprudência, ainda que à míngua de autorização legal expressa”, argumenta.
Lira destaca que essa ideia integra as “10 Medidas Contra a Corrupção”, apresentadas pelo Ministério Público Federal e também em tramitação na CCJ.
Tramitação
Também se encontram no Senado propostas de emendas à Constituição de autoria dos senadores Walter Pinheiro (sem partido-BA) e Cristovam Buarque (PPS-DF), que versam sobre a fase inicial de tramitação do impeachment no Senado.
Pinheiro, atualmente licenciado do mandato, é o autor da PEC 27/2016. Ela ratifica o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) de que o Senado tem a prerrogativa de receber ou não a denúncia encaminhada pela Câmara dos Deputados. Mas altera o quórum para deliberação, elevando da maioria simples que prevaleceu no processo de Dilma para dois terços (54 dos 81 senadores).
O senador baiano considera contraditório que a Câmara precise reunir pelo menos dois terços dos deputados (342, dentre 513) para aceitar a denúncia e o Senado possa instaurar o processo com maioria simples. Nesse caso, o apoio mínimo exigido corresponde à maioria dos parlamentares presentes à sessão, desde que a maior parte dos 81 senadores participe da votação. Em tese, portanto, bastariam 21 votos para admitir o processo de impeachment.
Já a PEC 23/2016, apresentada por Cristovam Buarque, retira dos senadores a possibilidade de rever a decisão dos deputados. Ele propõe explicitar na Constituição que ao Senado cabe apenas instruir e julgar o pedido de impeachment, ficando obrigado a apurar a denúncia se ela for acatada pela Câmara.
Agência Senado
Deixe seu comentário
Publicidade