CNJ arquiva processo administrativo contra juiz federal João Bosco
Batalha judicial vinha sendo travada desde 2008 entre João Bosco, Damaris Baggio e Ivana Cei
PAULO SILVA
ESPECIAL PARA O DIÁRIO
Por 11 votos a 3, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu pelo arquivamento em definitivo de um Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD) aberto contra o juiz federal João Bosco Costa Soares, da 2ª Vara da Sessão Judiciária do Amapá. A decisão do CNJ pode estar pondo fim a uma batalha travada desde 2008 entre o juiz e membros do Ministério Público (federal e estadual).
No julgamento, os conselheiros entenderam que não havia qualquer irregularidade na atuação de João Bosco Soares, que agiu sempre, segundo o conselho, pautado no interesse de resolver da forma menos conflituosa possível os conflitos que chegaram a ele. De acordo com o voto da relatora, conselheira Ana Maria Duarte Amarante Brito, também não houve comprovação de má-fé em eventuais erros e nem de dolo.
A questão que chegou ao Conselho Nacional de Justiça envolve, além de João Bosco, a procuradora da República Damaris Rossi Baggio de Alencar (que já deixou o Amapá) e a então procuradora geral de Justiça do Amapá Ivana Cei, e teve inicio com a assinatura de um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) firmado entre a mineradora MMX, do empresário Eike Batista, o Ministério Público Federal e o Ministério Público do Estado.
Em março de 2012, o juiz denunciou as procuradoras ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) acusando ilegalidades na condução do acordo. Era o TAC que João Bosco não homologou por discordar do valor em questão. O MPF recorreu da decisão, mas, antes que o Tribunal Regional Federal da 1ª Região discutisse as cláusulas do acerto, a procuradora Damaris, de ofício, determinou a distribuição do dinheiro para instituições e servidores públicos que ela considerava idôneos, como o superintendente da Polícia Federal no Amapá.
O CNMP decidiu arquivar a representação. Disse que não existe obrigação de que o dinheiro do TAC vá para um fundo de defesa dos direitos difusos, como queria o juiz. Portanto, não haveria qualquer ilegalidade no depósito da verba em contas de servidores. O órgão também entendeu que “a celebração do TAC por membro do Ministério Público está indissociadamente ligada à sua atuação finalística”, e o Conselho não pode atuar na atividade-fim dos procuradores.
Como resultado da decisão do CNMP, abriu-se um procedimento disciplinar contra João Bosco no CNJ. Contra a procuradora, houve uma denúncia criminal que acabou arquivada por atipicidade da conduta, mas com indicação para abertura de ação por improbidade administrativa, o que nunca aconteceu.
Na representação contra o juiz federal João Bosco, o procurador geral da República Rodrigo Janot atuou como custos legis, ou fiscal da lei. O papel do Ministério Público Federal no CNJ é verificar o cumprimento das leis e regras processuais, bem como o cabimento do pedido e garantir o respeito ao direito de defesa.E nessa condição, Janot pediu que o CNJ aplicasse a punição de aposentadoria compulsória a João Bosco. É a sanção disciplinar máxima aplicável a juiz, conforme as regras da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman).
Ninguém aceitou a sugestão de Janot no plenário. A conselheira Luiza Frischeisen, representante do Ministério Público Federal no CNJ, foi o voto vencido mais duro. Pediu a remoção de João Bosco da seção judiciária do Amapá.Os conselheiros Gilberto Martins Valente e Rubens Curado pediram a aplicação de uma advertência ao juiz. Os demais 11 ministros seguiram o voto da relatora, para trancar definitivamente o PAD.
Ouvida sobre a decisão do CNJ, a promotora de Justiça Ivana Cei disse que ainda está analisando o caso para em seguida ver como agir. “É bom lembrar que todas as ações do juiz João Bosco contra mim contra a procuradora Damaris também foram arquivadas em todas as instâncias por onde passaram”, disse Ivana ao Diário do Amapá. A procuradora Damaris Baggio não foi localizada para se manifestar.
História judicial
Tudo começou em 2008. A procuradora da República Damaris Biaggio ajuizou uma ação civil pública contra a empresa MMX, que então fazia parte do Grupo X, de Eike Batista, por problemas no licenciamento ambiental de uma obra de mineração no Amapá. Dizia ela que a obra causaria impacto irreversível na região, além de prejudicar a população local.
A empresa procurou o MPF para fazer um acordo. Foi firmado o TAC, que previa o pagamento de R$ 6 milhões às famílias envolvidas. O juiz federal João Bosco discordou do valor. Afirmou que, pelo tamanho da obra, o impacto descrito e a quantidade de famílias, R$ 6 milhões era pouco. Decidiu não homologar o TAC e convocar uma audiência de conciliação.
O procurador da República José Cardoso Lopes, então, recorreu da decisão ao TRF-1. Lá, afirmou que, como o TAC não envolvia a esfera judicial, o Judiciário não poderia barrá-lo. O recurso foi negado e hoje está em fase de exame de admissibilidade para ir ao Superior Tribunal de Justiça. Entre a não homologação e o recurso, a procuradora Damaris Biaggio decidiu agir em nome da celeridade e do que ela chamou de proatividade.O inquérito criminal contra a procuradora Damaris foi arquivado em maio de 2013, porque o MPF não viu indícios de crime nos atos dela.
Na época da representação ao CNMP, os procuradores da República envolvidos na assinatura do TAC publicaram uma “nota de esclarecimento” para se defender. Eles disseram que o valor do TAC “foi integralmente destinado a órgãos públicos com atuação no meio ambiente”, como Polícia Federal e Exército Brasileiro. Em resposta, disseram ter representado contra o juiz na Corregedoria do TRF-1. Em junho deste ano, por unanimidade, ministros da Segunda Câmara do Tribunal de Contas da União (TCU) consideraram regular a aplicação de recursos oriundos do TAC firmado, entre o MPF, o MP-AP e empresa MMX.
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