José Sarney

O Essequibo

 

Neste domingo a Venezuela fez um plebiscito para decidir sobre a anexação do Essequibo, velha disputa de fronteira rediviva por Hugo Chávez. Se não valessem as arbitragens, teríamos também direitos na região, mas o Brasil sempre honrou seus compromissos. Em várias ocasiões tratei dessa questão. Em 2007, perguntei em artigo: “Para que a Venezuela está se armando?” Em 2015 a invasão esteve por um triz, e escrevi o seguinte.

 

“A Venezuela, no tempo de Chávez, fez uma grande escalada armamentista. Expus aqui na Folha e no Senado minha preocupação com o que considero estar por trás dessa iniciativa: a conquista do Essequibo, região que ocupa 2/3 do território da Guiana.

 

“Esta é uma velha questão que tinha sido resolvida e foi ressuscitada. Os holandeses se instalaram na região em 1616. Depois das guerras napoleônicas, em 1824, o território foi cedido à Inglaterra. Ao definir o limite da Venezuela como o Orinoco, Bolívar reconhecia esse domínio. Mas a partir de 1844 os venezuelanos passaram a dizer que seu território ia até o rio Essequibo. No fim do século XIX a Venezuela, tendo como intermediários os Estados Unidos, propôs, e a Inglaterra aceitou, submeter a dúvida sobre a fronteira com a Guiana a um árbitro. O Laudo Arbitral definiu como fronteira o Orinoco. Os países aceitaram a decisão.

 

“Nós também levamos a um árbitro a questão de nossa fronteira com a Guiana. Contestávamos a região do Pirara. Apesar da defesa brilhante de Joaquim Nabuco, perdemos o acesso à bacia do Orinoco e quase 20 mil km2. Rio Branco encerrou o assunto.

 

“Mas a Venezuela, em 1962, reabriu a questão, contestou, depois de tanto tempo, o Laudo Arbitral. O pretexto foi uma declaração póstuma de um consultor da Venezuela em 1899 de que teria havido uma negociação política entre ingleses e o presidente do Tribunal Arbitral, um jurista russo.

 

“Sob a égide da ONU chegou-se, em 1966, ao Acordo de Genebra. Em seguida estabeleceu-se um Processo de Bons Ofícios, pelo qual qualquer decisão se daria por meio diplomático e consensual. Seu Artigo V dispõe que nenhum ato ou atividade realizada na vigência do Acordo criará qualquer direito de soberania sobre a região objeto da controvérsia.

 

“O Ministro Gibson Barbosa, em suas memórias, fala de uma proposta venezuelana ao Brasil para reabrirmos a questão do Essequibo e ficarmos com uma parte do território conquistado. O Brasil teria se recusado a tratar do assunto, em nome da paz no continente e a estabilidade de nossas fronteiras. Quando eu fui Presidente tentei fazer um acordo com a Guiana para termos um entreposto em Georgetown que nos daria acesso ao Caribe, como escoadouro da produção da Zona Franca de Manaus. Construiríamos uma estrada da fronteira até Georgetown. A Venezuela não permitiu, justamente questionando a soberania da Guiana nesse território.

 

“Em 1999 a primeira Constituição ‘bolivariana’ mudou o artigo que estabelecia como limites os resultantes de ‘tratados celebrados validamente’ para os de ‘tratados e laudos arbitrales no viciados de nulidade’.

 

“Vieram as compras de armas. Muitas armas. A intenção, para quem conhece a História, era clara: avançar sobre a Guiana.

 

“A bandeira da Venezuela recebeu uma nova estrela — representando o povo do Essequibo. Em 2009 e no ano passado [2014] a Venezuela protestou contra a cooperação entre Brasil e Guiana em projetos de infraestrutura, como a ponte sobre o rio Tacutu, que os une. Por outro lado Chávez e Maduro faziam declarações de obediência ao processo diplomático, pois a Guiana era comandada desde 1992 pelo Partido Progressista do Povo (PPP), socialista.

 

“Em maio assumiu novo presidente da Guiana, David Granger, antigo comandante militar, da oposição ao PPP. Logo depois a Exxon Mobil anunciou a descoberta de petróleo na plataforma continental da Guiana diante da região do Essequibo. Em seguida a Venezuela criou uma ‘Região Estratégica de Defesa Integral Marítima e Insular’ que compreende esta área. Na reunião dos chefes de Estado da Unasul, Maduro pede uma reunião para discutir ‘o desafio a sua sobrevivência’. Há 15 dias Maduro foi à ONU pedir sua interferência, enquanto o Coronel Pompeyo Torrealba, encarregado de ‘recuperar’ o Essequibo, anunciava que pretende registrar como venezuelanos os 200 mil habitantes da região. O mesmo coronel, falando aos chefes militares, disse que recebeu ordem de Maduro para ‘recuperar lo que de manera legal, territorial e históricamente nos pertenece, el Esequibo’.

 

“A Venezuela segue um caminho comum nos regimes autoritários: a conquista territorial, que se torna força de coesão nacional. Hitler deixou o modelo mais acabado com os sucessivos avanços sobre a Áustria, o Sudeto, a Polônia… A reação demora, e o preço é sempre alto.”

 

O resultado do plebiscito deste domingo foi o esperado, pela anexação, com 95% dos votos. Esperemos que a consequência não seja uma invasão, que resultaria também num retrocesso da tímida redemocratização em curso. Mas o Brasil tem um compromisso com a defesa da paz e a solução pacífica dos conflitos — está na Constituição — e sempre se empenhará nesse sentido.

 

Perdemos o maior humanista brasileiro

 

A velhice é, dizia Norberto Bobbio, sobreviver. Essa palavra significa continuar vivo, mas também que outros estão mortos. E, quanto mais sobrevivemos, mais perdemos: pais, irmãos, parentes, amigos vão nos deixando sós, terrivelmente sós.

 

Neste domingo faleceu mais um querido amigo, Alberto da Costa e Silva. Fomos amigos por tantos anos! Tínhamos a afinidade intelectual da literatura, do gosto dos livros, de uma visão de mundo. Tínhamos laços de origem: ele era paulista, mas, filho de piauiense, neto de maranhense, sentia-se ligado ao Parnaíba, cantado por seu pai, o poeta Da Costa e Silva, em Saudade: “Parnaíba — o velho monge / as barbas brancas alongando… E, ao longe / O mugido dos bois da minha terra…”

 

Diplomata, tinha uma vida errante, mas Vera, sua mulher —que era sobrevivente —, e ele, Marly e eu, nos víamos muito enquanto estavam em Brasília. Partilhávamos amizades, como com Odylo Costa, filho, Herberto Sales, Carlos Castello Branco, Hindemburgo Dobal — saudades que se acumulam, e como pesam —, Marcos Vilaça. Depois, morando no Rio, uma das razões para fazer o caminho era poder conversar com ele, ter o privilégio de sua presença.

 

Alberto foi um intelectual completo. Grande diplomata, com uma carreira exemplar, era poeta, historiador, memorialista, ensaísta. Sua obra sobre a África — A Enxada e a Lança, A Manilha e o Libambo, Um rio chamado Atlântico, Francisco Félix de Sousa… — é absolutamente indispensável para quem queira entender não só a relação entre o continente e o Brasil, como a própria África, e é referência acadêmica universal. Foi uma revolução: não havia nada de profundo sobre essa ligação, nada que compreendesse todas as nuances da multiplicidade de culturas e de nossa herança, nada que mostrasse a escravaria — palavra que ele ressuscitou — além dos números ou da emoção, nada que desse toda a dimensão humana do africano.

 

Sua poesia, de extrema sensibilidade, bastava como linhagem. Havia nela pleno domínio da língua, da música, como neste fecho de soneto para Vera: “…sabemos o amor ser o que em nós / aspira ao oceano e às estrelas / e faz da morte um cisco sobre a mesa.” A forma muitas vezes exigia a leitura do texto escrito para a completa apreensão das linhas, equilibradas com avanços e recuos que não podem ser expressos em voz alta.

 

Seus livros de memória, Espelho do Príncipe e Invenção do Desenho, são admiráveis. Estão ao lado dos de Pedro Nava, Gilberto Amado, Afonso Arinos, Zélia Gattai como modelo de escrita e conteúdo. Mas os ultrapassa em sua visão permeada de poesia: “O menino sentia o sol na pálpebra. Doía-lhe a cabeça. Era como se uma colher escavasse a órbita espicaçada pela luz, para trazer na concha, o olho.”

 

Foi, durante meu governo, nosso embaixador em Lisboa, onde teve contato fácil com os escritores e os artistas, além, naturalmente, do mundo político, como Mário Soares, José Carlos Vasconcelos, João Gaspar Simões. Representara o Brasil também em Lagos, onde pode enriquecer sua paixão pelo estudo da África, e serviria depois em Bogotá e Assunção, sempre com a excelência que punha em todas as coisas.

 

A literatura brasileira perde um dos seus expoentes máximos, senão o maior. Eu sobrevivo. Sob o peso do vazio, das ausências que, cada vez mais, doem asperamente, doem.

 

Ainda em guerra

 

Contei aqui, semana passada, um pouco da minha participação na Segunda Guerra. Que achava que, em breve, seria um soldado aliado. Escrevi a meus pais, que moravam no interior do Estado, cartas preocupadas, contando os boatos que circulavam na cidade sobre submarinos alemães nas costas, sobre ameaças de bombardeio, sobre espiões alemães e italianos agindo em São Luís e sobre o perigo dos “quinta-colunas”. Quando a guerra terminou, festejei com grande alegria, escrevi poemas sobre “a aurora de um novo dia”. (Que frustrações!)

 

Meu pai contou-me que em Pinheiro eles estavam “ouvindo a guerra”. Chegara um rádio importado pelo farmacêutico José Alvim, uma dessas figuras inesquecíveis nas pequenas cidades. Era a grande novidade da terra e ele o colocava na sua sala, aberta a uma multidão curiosa de amigos. Aquela geringonça falava rouco, quase inaudível, com interferências estáticas que provocavam ruídos intensos. José Alvim os justificava: “Esse barulho violento é a guerra”. E ficavam em silêncio ouvindo a guerra. Quando a interferência de estática era intensa, provocando prolongado ruído, José Alvim explicava: “É tiro de alemão”.

 

José Alvim me ajudou a nascer. Àquele tempo, Pinheiro tinha cerca de 1.200 casas, num total de quatro mil e poucos habitantes. Pinheiro estava no século XIX. Seus hábitos e costumes remontavam ao tempo da Colônia. Tinha apenas duas ruas: a primeira terminava na beira do campo, com uma larga curva, e se dirigia para a ponta da “península”. Ali ficava localizada a igreja, cujo padroeiro era Santo Inácio. Dizia-se ter sido construída pelos jesuítas, que tinham fazendas naquelas áreas.

 

Minha mãe ali chegara com oito meses de gravidez. Tinha 18 anos, e eu era o primeiro filho. Nasci cercado por duas parteiras, dona Severa e Mãe Calu, e uma cria de minha avó, Emília, que depois foi minha babá – que chamávamos carinhosamente de Debum. O parto não foi fácil. No começo da noite as contrações pararam. Meu pai, meu avô e minha avó, que também estavam presentes, decidiram chamar o único farmacêutico da cidade, José Alvim, proprie­tário da Farmácia Paz, hoje a mais antiga do Estado.

 

José Alvim era um tipo moreno atarracado, que gostava de contar histórias. Ele mandou uma injeção de pitruitina, que foi aplicada na barriga de minha mãe, e as contrações voltaram. E assim meus olhos se abriram para o mundo.

 

A guerra acabou, e ele encontrou outra explicação para a má transmissão do seu rádio e a dificuldade de sintonizar as estações: “Agora não tem mais guerra, mas está chovendo na Bahia, não passa nada”. Era o resultado da paz.

 

Minha geração acreditou que, depois da Segunda Guerra Mundial, íamos ingressar num tempo de paz, num mundo mais justo, melhor e humano. E agora? O mundo é outro. Não podemos mais imaginar a guerra nos ruídos de rádios péssimos, mas podemos ver o clarão verdadeiro dos ataques nas telas de TV digital. Seria bem melhor se estivesse “chovendo na Bahia”.

 

A paz é fugidia. A guerra é persistente. Ela ficava bonita nas histórias de heroísmo, o cavaleiro Bayard defendendo sozinho uma passagem estreita contra dezenas de homens. Hoje não há heroísmo. Os instrumentos de destruição são os protagonistas da morte das vítimas civis.

 

Nenhum conflito é bom e nenhuma paz é ruim. Difícil é convencer os homens.

 

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A minha guerra

 

Na infância estão depositadas as memórias mais marcantes que foram guardadas em nossa vida. Muitas delas são lembranças puras, simples, lúdicas, que alimentam nossa personalidade no julgamento das cores, das belezas da natureza, no carinho com os animais e em nossos primeiros sinais da força de possessão do amor. Recordo nas Memórias de Além-Túmulo, de Chateaubriand, a lembrança dos seus carneirinhos.

 

Mas o de que eu queria falar mesmo é que tenho uma forte memória da II Guerra Mundial. O Maranhão foi uma base aérea, e eu, aos 14 anos, morava em um pensionato, de dona Rosilda Penha, por quem tenho gratidão pela acolhida que me deu. Ali dia de domingo — ela era muito católica — almoçava o reitor do Seminário, Padre Sales, que falava inglês e por isso mesmo fora recrutado pelos americanos para celebrar missa na Base Aérea do Tirirical. Ele me levou como coroinha algumas vezes. Dos soldados ele recebia o presente de um pacote de cigarros Malboro (ele fumava), e eu, duas barras chocolate.

 

São Luís, tão pacata e muito longe da guerra que se processava na Europa, fora tomada de uma paixão patriótica depois que o Brasil entrara na guerra, em 1942, após o afundamento do navio Baependi, onde morreram centenas de brasileiros. É que o Brasil, que havia flertado com as potências do eixo, pressionado pela opinião pública e pelos aliados, oscilara de posição, e os alemães haviam resolvido afundar navios como pressão brutal.

 

Como os aviões não tinham autonomia para atravessar o Atlântico, o Brasil passou a ser uma peça-chave para a batalha no norte da África e para a invasão da Itália, que, com Alemanha e Japão, formava o Eixo. Assim o Brasil permitiu bases americanas em Macapá, Belém, São Luís, Fortaleza e Natal para que os aviões, do Rio Grande do Norte, atravessassem o Atlântico, com um pouso na Ilha do Sal. Aqui desembarcavam armas e munições, fazendo uma rota alternativa para a reunião de Teerã entre o Stalin, Roosevelt, Churchill, entre outras de alto nível.

 

São Luís, de repente, encheu-se de soldados americanos, com suas boinas, que montaram um escritório no centro da cidade, o USO – United States Office.

 

Foi uma revolução. Aqueles homens loiros, altos, bonitos, apaixonavam as moças de tal modo que um colega meu, Chafir, ao responder em nossa classe àquela pergunta clássica: “O que você quer ser?”, ele respondeu: “Americano.” A professora de inglês namorava o chefe militar americano.

 

A cidade também se habituou aos muitos voos de dirigíveis, que eram chamados de zepelins, encarregados de patrulhar o Atlântico e afundar submarinos com bombas de profundidade.

 

A zona do meretrício que, naquele tempo, vivia um momento áureo, era dominada pelas tropas aliadas. Como se, nos Estados Unidos, não existisse mais essa prática dos prostíbulos.

 

A guerra provocou, através de propaganda, uma enxurrada de retratos do general George Patton e de muitos outros generais, cujos endeusamento foi feito no mundo inteiro, principalmente nas cidades onde estavam localizadas as bases para criar o sentimento de apoio aos aliados.

 

Uma tragédia que chocou a cidade aconteceu com um jornaleiro italiano que tinha uma banca de jornal na Praça João Lisboa, centro fofoqueiro da cidade, assassinado pelas costas por um fanático que passara a odiar alemães, italianos e japoneses.

 

Tivemos blecaute para que os submarinos não detectassem a cidade e muitas passeatas exaltando o sentimento patriótico. Criou-se mesmo, nas Forças Armadas, uma pré-serviço militar obrigatório — eu guardo até hoje, entre os meus papéis velhos, este de menino alistado para lutar contra as forças do nazismo quando alcançasse a idade legal.

 

Outro dia, revendo papéis velhos, encontrei, entre as cartas que fiz para minha mãe, uma em que descrevia o meu medo da guerra, as atrocidades que estavam sendo cometidas na Europa e o meu medo de que essas batalhas chegassem ao Brasil.

 

“Minha mãe, apegue-se ao manto de Nossa Senhora, reze para o senhor São Bento e Santo Inácio para que essa guerra não chegue a São Luís, nem a Pinheiro, nem a São Bento.

 

Eu estou na Congregação Mariana rezando por meus colegas um terço todo dia para que acabe a guerra e chegue a paz entre os homens, como pediu Jesus.

 

Diga à Debun (nome da minha ama) que reze por mim, me tirando o medo dessas almas que mortas na guerra podem vir para cá.”

 

Tive vontade de rasgar essa carta, mas era tão bonita, tão cheia de fé e religiosidade que a guardei entre os papéis que guardo da minha querida e protetora Irmã Dulce.

 

Nossa guerra era uma guerra pura, sem bala e sem internet, sem televisão e apenas com a Rádio Nacional dando o boletim noturno de como iam as coisas no front ocidental.

 

Hoje a gente assiste à guerra em tempo real: a brutalidade com que ela se manifesta, a quantidade de vidas que ceifa, de lares que destrói, de aleijados que cria, de mortos que tiveram o sonho de viver interrompido.

 

Agora não tolero mais nem olhar jornais televisivos, revoltado com a brutalidade nos conflitos que envolvem países divididos por ódio cada vez mais profundo.

 

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O Pré-sal da Amazônia é feminino

A Amazônia nasceu sob o signo da controvérsia: era espanhola ou portuguesa? A dificuldade de se localizar a linha do Tratado de Tordesilhas se esgarçou com a união das duas coroas sob Filipe I. No século XVIII o Marquês de Pombal herdou a solução do Tratado de Madrid, a tese do uti possidetis. Ao designar para governar o Estado de Maranhão e Grão-Pará o seu meio-irmão, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, o instruiu, em cartas secretas, que seu objetivo maior era assegurar que aquelas terras fossem portuguesas e que sua missão principal era ocupá-las. Ele chegou ao ponto de mandar que as tropas portuguesas que fossem enfrentar as revoltas indígenas se “juntassem” com as índias para que o sangue português ficasse naqueles povos.

 

A segunda controvérsia era sobre a água: Pinzón, navegando pelas costas brasileiras em janeiro de 1500, encontrou, na foz desmesurada, que fazia doce a água muitas léguas mar adentro. Imediatamente, no costume de invocar nome de santos para os lugares que descobriam, deu logo ao rio o nome de Santa Maria de la Mar Dulce.  Nova controvérsia surgiu quando Orellana desceu de Quito rio abaixo, até o Atlântico. O frei Carvajal, que o acompanhava, registrou a presença da tribo das Amazonas, “muito alvas e altas, com o cabelo muito comprido, entrançado e enrolado na cabeça”, “fazendo tanta guerra como dez índios”. Na imaginação dos que chegavam àquelas novas terras de grandes rios e infinitas e frondosas árvores elas se tornaram as guerreiras das mitologias persa e grega. Teoria nunca contestada, mas também nunca confirmada, porque as amazonas só existiam na imaginação dos viajantes.

 

Agora, outra controvérsia surgiu século passado, esta envolvendo uma perspectiva de riqueza com que o Brasil há muito sonhara e nunca encontrara: petróleo, que aí não quis ficar em terra, nem em mar raso, mas em profundidades nunca pesquisadas, que os geólogos atuais já estão chamando de pré-sal equatorial, em disputa com o pré-sal do sul do país, que abriu uma nova perspectiva para o Brasil, colocando-o como o sexto país em reserva de hidrocarbonetos.

 

E ainda agora se abriu mais uma polêmica sobre o Amazonas: se para explorar esse petróleo se precisa de estudo para verificar se essa extração prejudica o meio ambiente e a Amazônia, já superada a disputa de ser pulmão do mundo.

 

Agora, a Ministra Marina diz que sim, que há prejuízo, que não pode ser prospectado. Já o Ministro de Minas e Energia entende que se pode estudá-lo sem prejudicar o meio ambiente. Enquanto isso o vaticano do Governo nessa área, a AGU – Advocacia-Geral da União, em parecer que acaba de proferir, afirma que não é exigível o processo de licenciamento determinado pelo Ibama para que essas riquezas sejam exploradas pelo Governo.

 

O Presidente Lula, que, como eu, é sonhador de um Brasil como um dos mais ricos países do mundo futuro, ao ser indagado se era a favor ou contra, respondeu: “Eu também estou sonhando.”

 

Essas discussões, como todas as controvérsias sobre a Amazônia, vão continuar e, graças a Deus para nós, elas se resolvem com palavras, e não com revoltas do Hezbollah e do Hamas e bombas de Israel, e sem medo da bomba atômica, porque, graças a Deus também, Alfonsín e eu firmamos o Acordo Brasil-Argentina proibindo que esses brinquedos do Diabo, que podem acabar com a Terra, por aqui transitem. E assim fizemos com que a América do Sul se tornasse o único continente do mundo que não possui armas nucleares.

 

Enquanto isso as amazonas continuam em nossa imaginação: “nuas em pelo, tapadas as suas vergonhas”, andando pela Amazônia com petróleo a dez mil metros de profundidade, esperando por nós, pelas nossas plataformas marítimas, e o Marquês de Pombal, na Eternidade, brindando com vinho do Porto, festejando que aquela região seja brasileira com DNA português.

 

E continua a controvérsia do nome: o rio que o Padre Vieira chamava das Almazonas é o Amazonas ou o das Amazonas? Com tacape ou sem roupa?

 

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Os Olhos de Gaza

 

Meu primeiro contato com Gaza data do meu tempo da Faculdade de Direito no Maranhão, onde me diplomei. Estava naqueles anos em que queria conhecer os grandes livros e caiu-me na mão um best seller de então, Sem Olhos em Gaza, de Aldous Huxley. O título vem da epígrafe, um verso de Milton que diz ter Sansão, capturado e cego pelos Filisteus, ido trabalhar em Gaza, em condições de tortura. Huxley escrevera um romance em que um sibarita se desiludia com a sociedade dissoluta.

 

Gaza teve um destino cruel como cidade: com dezessete mil anos de existência, sofreu ocupações, destruições e alternou períodos de paz e de guerra. Cresceu e encolheu e cresceu e encolheu. Seu nome se perde no tempo, em variações do cananeu Gazza, do hebraico Azza, em egípcio Ghazzat, forte ou preciosa. Foi egípcia, cananeia, filistina — origem do nome Palestina —, israelita, assíria, persa, grega, romana, árabe, cruzada, mameluca, otomana, inglesa.

 

Seu povo vive a memória sedimentada de muitas atrocidades e agora a História lhe guardou mais uma. Assim, nós, hoje, que assistimos em tempo real às crueldades que ali se praticam, podemos avaliar o que aconteceu quando sofreram, a cada conquista, o horror de ficar em ruínas.

 

Agora estamos no mundo inteiro esperando a merecida reação de Israel, covardemente agredida e sofrendo grande perda de vidas. É preciso deter o terrorismo monstruoso do Hamas, mas não é justa a matemática de que os civis mortos de Israel devam ser multiplicados numa progressão geométrica por civis mortos palestinos.

 

Responsabilidade maior cabe agora às potências e aos países que foram solidários com os israelenses de evitar que esta guerra siga os maus exemplos das intervenções coletivas. O do Iraque, onde o conflito teve o efeito bumerangue de entregar o poder à intolerância dos xiitas, que combatiam Sadam Hussain e agora comemoram sua desgraça. O do Afeganistão, onde as ondas de invasão, nos últimos duzentos anos, de ingleses, russos, buscando uma saída para o Mediterrâneo, americanos, destruir o Taliban, sofreram todas derrotas vergonhosas. Os Estados Unidos tiveram ali um novo Vietnam, lembrança que até hoje nos choca da multidão tentando pegar os helicópteros de fuga e das meninas queimando nas estradas — hoje escrevem livros sobre os seus sofrimentos.

 

O Papa Francisco, que não tem tido receio de condenar essa incompreensível violência, pede com a sua autoridade moral e religiosa que as nações se unam em todo o Mundo, que arregimentem apoios para exigir que a paz seja encontrada e que o ódio desapareça, encerrando os terríveis confrontos que nos enchem o coração de dor.

 

Juntemos nossas vontades e nossas orações às orações do Santo Padre para que a consciência mundial desperte e nós possamos, atendendo ao grito de revolta do Papa, gritar: — paz na terra aos homens de boa vontade!

 

 

Parem! Parem! Parem!

 

O homo sapiens tem o DNA da violência. A teoria da evolução pode substituir, com sua história, a expressão “sobrevivência do mais forte”, por “sobrevivência do mais violento”. Assim sua luta pela sobrevivência nada mais foi do que uma luta de destruição dentro da própria espécie.

 

Esse processo está muito ligado à religião, na disputa pela hegemonia do seu Deus. O mundo evoluiu e julgávamos que esta fase pertencia ao passado. A atual guerra de Israel em Gaza mostra que o homem continua o mesmo. A incursão de um inimigo sobre o outro volta a mostrar os métodos mais cruéis e as motivações religiosas ainda presentes, embora com outro componente atual e forte, que ainda move a economia mundial: o petróleo. Essa mistura profunda que envolve passado, presente, visões do futuro levam a um caldo de cultura que nos faz presenciar uma gama de atrocidades, justificadas por essa barbaridade dos terroristas palestinos de levar um ataque a Israel, cujas reações e consequências eram certas e previstas.

 

Os atos terroristas cometidos pelo Hamas, hediondos e sem nenhuma justificativa militar, e todas as justificativas de vinganças, jamais podem ser admitidas. Israel tem todo o direito de se defender, mas não deve ser seduzido pela estúpida máxima do Velho Testamento de “olho por olho e dente por dente”, resistindo à barbárie do Hamas de dizimar populações civis, já sabendo que esse seria o instrumento único, já muitas vezes utilizado por Israel. A novidade para avançar no terreno da violência é o fato de que nesta guerra não se está respeitando nem as leis da guerra – pois as guerras têm leis – e estão praticando, os dois lados, aquilo que na linguagem popular se resume como o “vale tudo”.

 

Isso destrói os conceitos morais, as condutas ditadas pelos direitos humanos resumidos por Jefferson na Declaração de Independência americana, de 1776, que consagra sermos todos detentores destes direitos: “que os homens são criados iguais, dotados pelo Criador de Direitos inalienáveis, entre os quais à Vida, à Liberdade e à busca da Felicidade.”

 

Acredito que noventa e nove por cento da Humanidade assiste revoltada às violações brutais que estão sendo cometidas no Oriente Médio. Não basta atender ao pedido do Papa Francisco: “Irmãos, parem! Parem!” Não basta a paz que todos desejamos, mas que o homem respeite as leis de Deus, os direitos humanos e pare de nos submeter diariamente à violência das imagens, pelos meios de comunicação, da crueldade que se pratica nesta guerra suicida e cruel. Que Deus tenha misericórdia da Humanidade e nos devolva os princípios morais e de convivência pacífica.

 

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“A amizade é um bem precioso”

 

A amizade é um bem precioso. Não é necessário que atinja o grau, como a de Michel de Montaigne e Étienne de La Boétie, em que nossas almas “se misturam e se confundem uma na outra”. Basta que estejam ligadas pelas circunstâncias da vida de uma maneira que “nossas almas conversem”.

 

Conheci Antônio Carlos quando eu era jovem e ele quase um menino. E logo nos entendemos pela semelhança de sentimentos em relação a valores caros a um e a outro:  à palavra escrita, ao Maranhão e a sua gente, aos grandes valores da Humanidade…

 

Esse acordo entre nosso universo intelectual foi se reforçando ao longo dos anos. Os tempos antes de nos conhecermos desapareceram para podermos dizer que éramos amigos da vida inteira. E se os seus foram muito curtos para o desfrute dos que ficamos, foram longos o bastante para podermos aproveitar sua inteligência viva e perspicaz, sua excelente memória, seu fino ouvido para a linha poética, seu excelente gosto literário, sua aguda sensibilidade social, sua generosidade permanente.

 

Como o outro Antônio, Antônio Gonçalves Dias, que amávamos em comum, era de baixa estatura. A um e outro isso permitiu mostrar que estavam muito acima dos preconceitos fáceis e que o que importa é a vida que se constrói. E a de ambos foi bem e solidamente construída.

 

A brusquidão de sua morte a torna talvez mais áspera e difícil de enfrentar. Mas no meu caso tenho uma lição da juventude, quando o golpe do arcanjo levou meu irmão: esperada ou inesperada, a dor da perda, se difere no raio que cai em dia claro, é chuva que nos irriga para sempre.

 

Com os anjos que me guardam, Antônio Carlos continuará a acompanhar meus dias e minha vida.

 

 

35 Anos de Constituição

 

O processo de reforma constitucional de 1988 iniciou-se com a longa discussão sobre as Constituições de 1967 e 1969, isto é, as duas Constituições outorgadas pelo regime militar. Independentemente de suas qualidades ou defeitos, estavam marcadas como ilegítimas. Era necessário, para a redemocratização do país, um novo marco institucional. Este postulado tomou forma como um dos pontos do “Compromisso com a Nação” assumido pela Aliança Democrática, que permitiu a vitória da oposição em 1985. Levado, por força da fatalidade, à Presidência da República, coube a mim convocar a Assembleia Nacional Constituinte. Em 28 de junho enviei ao Congresso Nacional Proposta de Emenda Constitucional dando aos parlamentares a serem eleitos em novembro de 1986 “poderes para elaborar e promulgar a nova lei fundamental e suprema do País”.

 

Criei, também, respeitando a vontade de Tancredo Neves, uma Comissão de Estudos Constitucionais para preparar um anteprojeto a ser encaminhado à Assembleia Constituinte. Para presidi-la Tancredo convidara Afonso Arinos de Melo Franco, o maior constitucionalista de sua geração, uma unanimidade nacional. Confirmá-lo foi para mim mais que uma obrigação política, um dever pessoal de quem nele tinha um amigo e um modelo.

 

Entregue em 1986, o trabalho da Comissão Afonso Arinos foi muito bom. É claro que não era, nem pretendia ser, perfeito. Ela optara pelo regime parlamentarista, e muitos veem nisso o motivo de minha decisão de não enviar seu anteprojeto à Assembleia Constituinte. Na realidade acredito que este é o melhor sistema de governo. Não remeti o trabalho à Constituinte porque seu presidente, Ulysses Guimarães, me pediu que não o fizesse. Ele me disse que o devolveria, um impasse que a frágil transição democrática não se podia permitir. Tive que atender a sua vontade.

 

Tendo convocado a Assembleia Constituinte de 1987, dei-lhe plenas condições de trabalhar em paz e liberdade. Foi a Constituinte mais livre do Brasil, sem peias e sem interferências, com medidas que tornavam o regime o mais democrático já vivido pelo país.

 

O trabalho da Constituinte, infelizmente, não caminhou bem. Para começar, o Congresso emendou o projeto de convocação, retirando a determinação de que a Constituição fosse promulgada no curso da primeira sessão legislativa, isto é, em 1987 — e acabou sendo a mais demorada de nossas Constituintes, estendendo-se por 20 meses. Criou-se um pretexto para lutas políticas com a discussão sobre a duração de meu mandato — que era, conforme o diploma expedido pelo TSE, de seis anos —, que tentei atalhar abrindo mão de um ano de mandato em maio de 87; mas essa discussão foi protelada até junho de 88. Pouco depois, na votação do 1º turno do projeto de Constituição, fiz um apelo para o seu reexame profundo. O projeto aprovado em primeiro turno colocava em xeque a governabilidade, ameaçava tornar o Brasil “o país do que poderia ter sido e não foi”. A Constituinte olhava o que devia ser “um instrumento de mobilização e de unidade do País” com a cabeça voltada para trás, olhos para o passado. Os interesses corporativos se instrumentalizavam em todo o texto constitucional.

 

Os riscos que eu via, não via sozinho. Afonso Arinos, que presidira a Comissão de Sistematização, disse, ao discursar na cerimônia de promulgação, que sua aplicação seria “extremamente duvidosa” e que “afirmar o contrário é ingenuidade, ilusão ou falta de sinceridade”. E mais: “Tudo decorre do desajustamento entre a generosidade da aspiração política e a dificuldade da sua implementação jurídica.”

 

Aprovada a Constituição, fui o primeiro a jurá-la. Lutei pelo seu êxito, não só durante o meu governo, mas ao longo destes 35 anos. No que se refere aos direitos sociais e civis, sempre a aplaudi, louvei e apoiei. Mas ela criou, na área da organização do Estado, um espaço de ingovernabilidade, por ser híbrida, ao oscilar entre o parlamentarismo e o presidencialismo, sem unidade.

 

Infelizmente, muito do que eu previ em junho de 1988 aconteceu. A carga tributária disparou. Os conflitos entre os Poderes são o pão cotidiano. As ações de inconstitucionalidade se acumulam no Supremo Tribunal Federal. O Poder Legislativo é sufocado pela competência legislativa do Poder Executivo, que carece de meios para governar, cerceado pelo Poder Judiciário. Este precisa se tornar também o Poder Moderador.

 

Dos problemas do texto constitucional é um sinal também o número de emendas que a ele se fizeram e a ele estão propostas. O Congresso Nacional já promulgou 131 emendas. Foram apresentados muitos milhares de projetos de emenda constitucional. Para termos uma referência, nossa Constituição mais duradoura, a de 1824, teve uma única emenda, o Ato Adicional.

 

Ao mesmo tempo a Constituição vem sofrendo — tendo como ápice a intentona de 8 de janeiro — o ataque sistemático a sua essência democrática. A pretexto de agendas morais — já Afonso Celso denunciara os falsos moralistas e seu efeito deletério —, cantou-se um canto de sereias às Forças Armadas e destruiu-se a credibilidade da política e dos políticos, formando um caldo de contínua chantagem sobre o Poder Executivo e o Poder Judiciário para submetê-los a pautas corporativas, gerando ingovernabilidade para justificar as Fake News dos assaltantes.

 

Os 35 anos da Constituição de 1988 devem ser motivo de reflexão e de ação. A Carta constitucional foi um passo imprescindível ao restabelecimento da democracia. Ao mesmo tempo é um desafio à governabilidade que se acentua com as transformações de nosso tempo. Ao transformá-la, precisamos evitar o risco de mais uma vez nos voltarmos para o passado: sem esquecer suas lições, devemos pensar no próximo século, nos próximos séculos, construindo instituições que sejam ao mesmo tempo estáveis e dinâmicas, que conciliem a inserção do Brasil no mundo com a realização plena do Estado de bem-estar social.

 

 

Dica cultural: Dom Quixote

 

Todos os domingos, a partir deste mês, o site A Página do Sarney vai trazer uma indicação cultural. A proposta é contribuir e incentivar o gosto pelas artes das novas gerações.

 

A iniciativa está em consonância com a vontade de José Sarney, escritor premiado e um entusiasta na divulgação da leitura e cultura em geral para ser aproveitada pelas próximas gerações.

 

Leia aqui como foi o encontro de José Sarney com estudantes em palestra na Academia Maranhense Letras

 

A primeira indicação é um clássico da literatura mundial, considerado um dos livros preferidos de José Sarney: Dom Quixote de La Mancha (EL Ingenioso Hidalgo don Quijote de la Mancha), do escritor espanhol Miguel de Cervantes (foto acima).

 

“Uma obra genial. A maior obra da literatura já escrita”, diz José Sarney, autor de obras premiadas e elogiadas mundial como Saraminda e O Dono do Mar, entre outras.

 

O clássico da literatura foi publicado em duas partes: a primeira em 1605 e a segunda somente dez anos depois, em 1615. Pelos estudiosos em literatura é apontado como o primeiro romance moderno, influenciando várias gerações de autores, inspirando poemas, pinturas e servindo como base para adaptação para diversos filmes.

 

Dividida em 126 capítulos, a obra traz Dom Quixote, um homem que, após se sentir inspirado por muitos romances de cavalaria, decide tornar-se um cavaleiro andante, lutar por justiça e proteger os oprimidos, além de provar seu amor por Dulcineia de Toboso, presença feminina perfeita que só existe na sua imaginação.

 

Com seu fiel escudeiro, Sancho Pança, o herói sai em sua jornada que mistura fantasia e realidade, transformando pequenos obstáculos em gigantes e exércitos de inimigos como sua luta contra os moinhos de vento.

 

Dom Quixote é um homem comum, com suas mazelas, insucessos e inseguranças. Essas características o diferem dos heróis clássicos, por isso é considerado, pelos estudiosos da literatura, um herói moderno.

 

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