Pe. Claudio Pighin
Padre Bruno Secchi:apaixonado por deus e pelas pessoas
O ano era 1986 quando dirigia a Pastoral Carcerária e dos Direitos Humanos da diocese de Macapá. Lembro-me de que estávamos saindo do regime militar e, assim, com a minha equipe decidimos realizar um simpósio sobre a violência, como contribuição para unir todas as forças políticas e religiosas do então território federal do Amapá em oposição à violência que estava avançando sempre mais.
Naquela ocasião, a figura de destaque do simpósio foi dom Helder Câmara, mas também participou como palestrante o padre Bruno Secchi. Quando o encontrei pela primeira vez, vi nele uma pessoa simples, bem magrinho e sorridente. Senti nele uma firmeza em narrar a sua obra República do Pequeno Vendedor em defesa das crianças e adolescentes de rua.
A partir daí, nunca mais o esqueci, embora nos primeiros tempos não tivemos mais contatos. Sempre seguia padre Bruno pela imprensa. Passaram alguns anos e o destino quis a nossa aproximação, porque fui transferido para a arquidiocese de Belém com a finalidade de dirigir a Pastoral de Comunicação.
Comungávamos ideais e vida fundadas na Palavra de Deus. Secchi mais experiente que eu me dava aulas de como viver melhor e mais concretamente a vida seguindo Jesus Cristo. Um desses testemunhos que sempre me deixavam profundamente firme era a sua humanidade. A Palavra de Jesus não podia ser abstrata, mas encarnada no ser humano.
E aquele seu sorriso confortador acompanhado da frase “menino, como vai?” Quantas vezes fiquei pensando sobre a expressão “menino” e entendi realmente que perante o nosso Mestre Nazareno somos sempre pequenos em segui-Lo, isto é, “menino”. A vida de Bruno foi defender os meninos e meninas. Homem de Deus, defensor dos direitos humanos fundamentados em Deus, nosso Criador.
Era isso que lhe dava paciência em nunca desistir. Sempre firme na sua fé, não se deixava distrair pelos poderes do mundo, em seguir este caminho de plasmar de novo a verdadeira vida perdida ou corrompida. Portanto, nosso padre Bruno foi um grande colaborador de Jesus Cristo por recriar e defender a VIDA, remando contra a correnteza das injustiças sociais.
O sorriso dele ainda está estampado na minha memória. Quando o via por demais concentrado e com rosto sisudo, aí percebia que algo o preocupava muito. E uma das coisas que o deixava bem triste e em silêncio era ver coirmãos e pastores da Igreja fazendo escolhas bem longe do Reino de Deus.
No entanto, ele sempre se deixava vencer pela Misericórdia de Deus.
Assim, acreditava cegamente que todo mundo, com o tempo, era vencido pelo amor do nosso Criador. Quando chegava a essas considerações, sempre o acompanhava aquele sorriso de compaixão e de bondade que invade o ser humano, injetando total esperança. E por que isso? Porque vivia tudo como bom discípulo do Mestre, aberto a todo mundo, sem preconceitos de credo religioso ou político.
Para o sacerdote amigo dos mais fracos da sociedade, todo mundo era irmão ou irmã. Ele acreditava nas pessoas também quando aprontavam porque focalizava mais no aspecto positivo e discernia neles a ação do Reino de Deus. Padre Bruno foi um apaixonado por Jesus Cristo e pelas pessoas, sobretudo daquelas que tinham mais dificuldades ou eram abandonadas.
Como a Itália enfrenta a Covid-19?
Os italianos estão enfrentando a covid-19 com todas as precauções possíveis. Não estão brincando em serviço. Inclusive, todos os sacerdotes da região do nordeste da Itália tiveram de fazer o teste para não deixar dúvidas sobre a presença ameaçadora do novo coronavírus. A severidade de controle é tão minuciosa que eu mesmo estou experimentando.
Uns dez dias atrás, almocei com dois sacerdotes e, no dia seguinte, fui fazer o teste, que resultou negativo. Porém, um padre com quem almocei testou positivo cinco dias depois. Resultado: tive de passar também para a quarentena. Uma quarentena que me obrigou a permanecer em casa, sem receber visitas. E ainda tenho de controlar a temperatura duas vezes ao dia, suspender todas as atividades, inclusive as celebrações, manter a higienização do local e separar o lixo, que não pode ir naquele comum.
Ao mesmo tempo, sou vigiado por telefone, além de ter a clausura controlada diariamente pela polícia. Tudo isso porque estive perto de um contagiado. Este vírus, tão poderoso, determina a nossa vida e a nossa convivência. Este tipo de comportamento é ditado porque, efetivamente, não o conhecemos e, portanto, não sabemos ainda agir clinicamente. Nesta quarentena, me vieram a tona umas simples reflexões, relembrando a Sagrada Escritura.
Não sei se você se lembra dos leprosos no tempo de Jesus? Naquele tempo, a sociedade não conhecia a doença e a única solução era segregar o doente do convívio social para evitar mais contágios. Assim sendo, o pobre leproso, além de sofrer a doença sem expectativa de vida, tinha que enfrentar o sofrimento de estar longe de seus familiares e amigos. Totalmente abandonado. Por causa desta ignorância da medicina, continuam esses comportamentos exclusivos.
Eu me sinto nesses dias quase como um perigo público. Por exemplo: têm pessoas que chegam à porta da minha casa e, naturalmente, aviso da minha quarentena e logo elas dão um passo atrás. Este é um pequeno exemplo de como posso ter me tornado um perigo. Por isso, sinto-me assim muito abandonado. Além do mais, as pessoas que me trazem os alimentos devem deixa-los a uma boa distância para evitar a aproximação e o possível contágio, embora eu não tenha o vírus, mas esteve próximo de um que o teve. Sinto-me realmente só, humanamente falando.
A minha sorte é a minha experiência de fé que me permite intensificar o meu estado de oração. É isto que me dá capacidade de dialogar com Deus e fazer uma experiência efetiva da ação do Espirito Santo na minha pobre vida. Experimentar como o Espirito da Verdade me ajuda a relembrar as Palavras vivas de Jesus no momento certo pra ação certa. Lembro-me da passagem do evangelista Marcos: “Ao desembarcar, Jesus viu uma grande multidão e compadeceu-se dela, porque era como ovelhas que não têm pastor. E começou a ensinar-lhes muitas coisas.” A Palavra me ajuda a refletir e compreender que a compaixão de Jesus com as pessoas significa a presença de Deus em nós. Isto me conforta e me faz sonhar a grandeza da nossa Vida que não é limitada por qualquer precariedade humana.
A Covid-19 nos desestabiliza
A pandemia da covid-19 está deixando nosso pequeno planeta desnorteado, perdido. Todos estamos preocupados e sentidos, sobretudo quem foi atingido mais de perto pela doença ou pela morte. Eu estou aqui na Itália e somente nesses dias saímos do lockdown, mas sempre temerosos e com toda a precaução exigida pelas autoridades. Ao mesmo tempo, estou muito apreensivo com os meus amigos e amigas do Brasil. Quantos desabafos e tristezas: “Padre, quantos amigos se foram!” Assim me disse, com dor no peito, uma senhora que perdeu o único filho. Quanto sofrimento!
Ao compartilhar tudo isso, eu também desabafo com o meu Deus: “Senhor, por que tudo isso? Por que tantas mortes? Por que, Senhor?” Não tenho uma resposta imediata e, assim, me mergulho na oração e reflexão. Nos longos silêncios, começam aflorar pensamentos como: “Deus não tem culpa de tudo isso, aqui somos nós os responsáveis.” Como? Quando não estudamos suficientemente e não apostamos nas pesquisas científicas para poder ajudar o ser humano a se libertar das doenças. Quando não respeitamos a própria natureza e não buscamos uma convivência pacífica. Quando fazemos da nossa vida uma simples especulação de mercado, reduzindo a própria vida a uma mercadoria.
Este tempo de sofrimento e deserto nos ajuda a rever toda a nossa concepção da vida, rever os valores prioritários que temos e assumimos até agora. Também nos iludimos com os avanços da ciência, da medicina, achando que a nossa vida não tinha limite e que a morte estava bem longe. Mas com a vinda de Covid-19, nossa expectativa de vida foi derrubada e agora a morte está achando graça da nossa ciência. Portanto, essa catástrofe da pandemia pode nos ajudar também a resgatar a sabedoria das Sagradas Escrituras, que nos diz: “Ensinai-nos a bem contar os nossos dias, para alcançarmos o saber do coração.” (Sl 89,12)
Quero lembrar aqui sábias palavras do Papa Francisco: “Queridos irmãos e irmãs, na provação que estamos a atravessar, também nós, com os nossos medos e as nossas dúvidas como Tomé, nos reconhecemos frágeis. Precisamos do Senhor, que, mais além das nossas fragilidades, vê em nós uma beleza indelével… Agora, enquanto pensamos numa recuperação lenta e fadigosa da pandemia, é precisamente este perigo que se insinua: esquecer quem ficou para trás. O risco é que nos atinja um vírus ainda pior: o da indiferença egoísta. Transmite-se a partir da ideia que a vida melhora se vai melhor para mim, que tudo correrá bem se correr bem para mim”.
E continua Francisco: “Começando daqui, chega-se a selecionar as pessoas, a descartar os pobres, a imolar no altar do progresso quem fica para trás. Esta pandemia, porém, lembra-nos que não há diferenças nem fronteiras entre aqueles que sofrem. Somos todos frágeis, todos iguais, todos preciosos. Oxalá mexa conosco dentro o que está a acontecer: é tempo de remover as desigualdades, sanar a injustiça que mina pela raiz a saúde da humanidade inteira! Aprendamos com a comunidade cristã primitiva: os crentes «possuíam tudo em comum. Vendiam terras e outros bens e distribuíam o dinheiro por todos, de acordo com as necessidades de cada um» (At 2, 44-45). Isto não é ideologia; é cristianismo”. (19.04.2020)
O ser humano é sujeito ou objeto da história?
Nesses tempos, mergulhado no silêncio, pude aprofundar muitas questões que, frequentemente, sou interpelado no decorrer do meu cotidiano de sacerdote e professor. Creio que a primeira coisa que temos de fazer é contextualizar o ser humano nos tempos de hoje. Todo mundo concorda que a vida dos nossos dias não é a mesma do passado. Realmente, as condições de vida, atualmente, são bem diferentes.
Um ser humano que é caracterizado pela sua peregrinação (definida como migrante, por alguns, em metáfora para entender a transitoriedade) e, portanto, a partir dessa nova atitude é que se constitui a formação dele.
Sendo assim, não podemos tirar conclusões fáceis a seu respeito. É bastante complicado enfrentar o ser humano na era moderna com os métodos tradicionais, qual a ética das intenções, a ética da responsabilidade etc.
Instrumentos esses que revelam fortes limites e frágeis orientações.
Sabemos também, e já escrevo isto há muito tempo, que o produto da ciência e a explosão tecnológica geraram não poucas dificuldades na vida das pessoas.
Sempre falei que o ser humano não é feito para ter todas essas mudanças tão repentinas. Ele precisa de um tempo e de um espaço à medida dele. E com certeza, podem acreditar, que com a expansão da tecnologia científica tão rápida irão aumentar as dificuldades. De fato, estamos assistindo à produção de supercomputadores que têm capacidades de fazer cálculos que, uns dizem, tentam imitar a função do cérebro humano. Naturalmente, desconfiamos de que isso possa acontecer. Mas, certamente, alcançando as metas intermediárias podem criar bastantes problemas.
Nesses dias, reli um texto do meu estimado ex-professor italiano de filosofia, Umberto Galimberti, que escreveu o seguinte: “Os anos que estamos vivendo viram se acabar um domínio, e deu início aquele processo migratório que irá confundir os confins dos territórios onde se orientava a nossa geografia. Usos e costumes se contaminam e, se ‘moral’ ou ‘ética’ quer dizer costume, é possível suporo fim das nossas éticas fundadas sobre noções de propriedades, território e confim a favor de uma ética que, dissipando cercas e certezas, vai configurando-se como ética do migrante que não se apela ao direito, mas à experiência, porque, a diferença do ser humano do território que há a sua certeza na propriedade, no confim e na lei, o migrante (ao contrário) não pode viver sem elaborar a diversidade da experiência (…) Sem meta e sem ponto de partida e de chegada, que não sejam pontos ocasionais, o migrante, com a sua ética, pode ser o ponto de referência da humanidade que virá, se apenas a história acelera os processos de recente encaminhados que são no sinal da desterritorialização”.
Assim sendo, podemos confirmar aquilo que sempre defendi: toda essa nova tecnologia não são simples instrumentos a nossa disposição, mas se tornam praticamente o novo ambiente onde o ser humano é fortemente condicionado em toda a sua essência de ser. A técnica, a essa altura, determina o curso da história humana, porque não vale tanto dizer “o que podemos fazer com a técnica?”, mas “o que a técnica pode fazer de nós?”. Veja como é diferente.
A questão, portanto, é: até que ponto conseguimos ser sujeitos da nossa história, ou simplesmente objetos? Revestindo-se de novas atitudes e costumes, o ser humano moderno não tem pontos determinados de referências, mas, sim, uma contínua busca referencial.
Universo cultural católico na politica de hoje
O mundo católico de hoje se apresenta como uma vivência bem composta e diversificada na política. Isto é, os católicos não são unânimes em seguir uma única linha política, mas cada um segue conforme o seu modo de pensar e viver. Eu, porém, tentaria enuclear asexperiências dos católicos na política sobre dois pilares que chamariaassim: laicidade/identidade e direita/esquerda. O primeiro pilarconjuga consciência-liberdade, mediação da identidade-obediência eintegridade. No segundo pilar polariza conservação, ordem, tradição,mercado, justiça, igualdade, comunidade, inclusão, entre outros. Sãonesses dois pilares que gira o mundo cultural católico no quadropolítico moderno.
Portanto, diria que existe um pilar de caráter eclesial e outro de caráter civil. E o cruzamento desses dois pilares se divide, por sua vez, em outras diferentes posições. A partir daí, podemos constatar, por exemplo, que a consciência da laicidade da política distingue os católicos chamados democráticos dos católicos sociais. Além do mais, em contraposição ao catolicismo democrático se poderia colocar a posição dos católicos intransigentes, que sustentam fé e política em versão de saudade da cristandade pré-moderna e refletem umconservadorismo, tradicionalismo em relação às questões políticasatuais, modernas.
De fato, os intransigentes rejeitam, em geral, a modernidade e usam a democracia como lugar para exercitar adefesa de interesses católicos, enquanto sustentam uma visão estática, atemporal do corpo social, não obstante que possam ser amavelmente prestativos em relação aos mais pobres. Efetivamente, existem católicos ou crentes que são intransigentes porque acham de encontrar soluções para os problemas atuais com a ‘própria’ fé,sem se preocupar tanto em mediações e pesquisas. Quais as consequências de tudo isso? Eu acho que a própria identificação no seu ‘credo’ veio se fechando, encolhendo. Sob o aspecto político, ficam parados a formas do passado, sem se preocupar às novastransformações da época atual.
Essas pessoas têm dificuldades dedialogar, saber escutar. Certamente, essa maneira de agir não é muito cristã, não consegue se identificar com o Mestre Nosso Senhor Jesus. Podemos viver o Reino de Deus se tivermos a capacidade e disponibilidade de buscar mediações necessárias e, portanto, abertos às colaborações, procurando o bem possível que nos leva ao bem absoluto que Deus nos doa no seu Reino.
Assim sendo, compromissados com as frentes de mudança social, preocupados com a grande desigualdade que está aumentada na nossa sociedade,compreendemos a necessidade de uma política que possa melhorar as condições de vida dos cidadãos, sem se deixar atrair pelo mal. É possível isso? Eu creio que sim. Porém, precisamos ser mais atentos em conhecer e aprofundar o nosso ser cristão para fazer uma sériaabordagem no mundo em que vivemos. Não podemos admitir ingenuidades nesta atuação. Tudo se deve verificar à luz da história permeada pela Palavra de Deus e pelo Magistério da Igreja.
A democracia de inspiração cristã
O catolicismo democrático nasceu e cresceu na Europa, no fim do século 19, porque os católicos se preocuparam com a vivência dos valores da própria fé, uma fé encarnada na sociedade como um todo. Como se deve identificar a democracia de inspiração cristã? Creio que poderíamos dizer: é bem reformista. Isto é, segundo a Enciclopédia Treccani, o reformista é aquele movimento político que repudiando tanto os sistemas revolucionários quanto os conservadores, reconhece a possibilidade de modificar o ordenamento político existente somente por meio da atuação de orgânicas, mas graduais reformas. Assim sendo, é uma democracia que se caracteriza pela capacidade de mediação. Porém, essa mediação não se define em agradar a todos, mas representar a todos, sobretudo os menos favorecidos e frágeis.
Não temos dúvidas em afirmar que aqueles que aderem a esse tipo de democracia, a laicidade na sociedade, vivem a maneira de ser cristão adulto. Gostei dessa definição de Pietro Scoppola, político e acadêmico italiano, que disse o seguinte a respeito da laicidade: “A laicidade não é apenas sobre os Estados, as leis, o modo de ser das Instituições. A laicidade é, antes de tudo, um modo de viver a experiência religiosa ao nível pessoal e interior; se falta esta condição interior também os aspectos institucionais da laicidade, eles serão enfraquecidos e, no fim, comprometidos”. O Magistério da Igreja daquele tempo se pronunciou a respeito disso, reconhecendo a importância histórica dessa experiência de fé na política. E essa inspiração cristã na democracia de então solidificou um planejamento em que se destacava a defesa da família, liberdade do ensino, referendos locais, centralidade dos municípios e formas de previdências sociais, representação proporcional e voto às mulheres, liberdade da Igreja e construção de uma ordem mundial nova.
Tudo isso não era um compromisso político, mas uma proposta de convivência social, a partir da Doutrina Social da Igreja. E a famosa Encíclica RerumNovarum, do papa Leão XIII, 15.05.1891, também inspirou esse movimento democrático: “A sede de inovações, que há muito tempo se apoderou das sociedades e as tem numa agitação febril, devia, tarde ou cedo, passar das regiões da política para a esfera vizinha da economia social. Efetivamente, os progressos incessantes da indústria, os novos caminhos em que entraram as artes, a alteração das relações entre os operários e os patrões, a influência da riqueza nas mãos de um pequeno número ao lado da indigência da multidão, a opinião, enfim, mais avantajada que os operários formam de si mesmos e a sua união mais compacta, tudo isto, sem falar da corrupção dos costumes, deu em resultado final um temível conflito…”
Já se passaram mais de cem anos e essa lição é tanto mais atual para os nossos tempos. Não por acaso, o mesmo Concilio Vaticano II, com a Gaudium et Spes, considera o compromisso político como uma vocação especifica na Igreja. E a democracia garante a participação dos cidadãos às escolhas políticas. Tudo isso iluminado pelos valores da Palavra de Deus e do Magistério da Igreja.
Papa Francisco, sempre ele
Estamos passando por um tempo muito difícil. A humanidade toda está de “joelhos”. Eu imagino que daqui a algumas décadas, quando lermos os livros de história, uma figura será mostrada em destaque como único e importante líder mundial de nossa época. Não tenho dúvidas de que será o papa Francisco. Ninguém se lembrará de outros lideres. Realmente, nesses tempos de coronavírus, que está matando muitas pessoas, sobretudo os anciãos, é o papa Francisco, com seus 83 anos, que dá esperança e conforto a todo mundo, sem exceção de ninguém.
Ele é um homem idoso, que está no grupo de risco, mas que nem por isso se poupa. Pelo contrário, nos sustenta, encoraja e não se preocupa de se resguardar de possíveis contágios. Um exemplo disso foi vê-lo, como se fosse hoje, caminhando claudicando pela praça deserta de São Pedro em direção à famosa basílica na Sexta-feira da Paixão. Seu rosto tinha ar de cansado e não escondia preocupação. Aquela praça deserta, símbolo de uma humanidade encolhida e sem rumo, confia em Pedro, Bispo de Roma.
Naquele dia, ele falou para todo mundo, fiel ou não fiel, aos pobres do pequeno planeta terra, qualquer que fosse a religião deles. É aqui que os poderosos não se alinham com Francisco. Ele fala claro para que todo mundo o entenda, preocupando-se com um mundo globalizado que se distancia sempre mais da proposta do Reino de Deus, que Nosso Senhor Jesus nos confiou. Por isso, o Santo Padre é uma pessoa que faz a diferencia e é o mais escutado e comentado. Firme da sua cátedra de São Pedro, ele emana tanta confiança e credibilidade que a humanidade o admira e reconhece Nele alguém superior a todos os outros lideres.
Por exemplo, Trump, presidente dos Estados Unidos, disse publicamente a respeito do atual papa: “É uma grande personalidade”, e quando em 24.05.2017 se encontrou com o papa Bergoglio lhe falou: “Não esquecerei aquilo que me disse”. Um papa que mergulhou no mundo globalizado para pregar paz e justiça. Ele reconhece também o grande perigo da vinda de outra grande guerra mundial, definida por ele de uma guerra combatida “em pedaços”.
Esta possível guerra mundial afetará, sobretudo, os mais pobres e aquela população que não conta nada. Não sei ainda ter uma visão clara e distinta dos rumos desses perigos bélicos, mas certamente reconheço que a vinda dessa pandemia de covid-19 colocou em crise todas as estratégias dos poderes humanos, deixando desestabilizado o pequeno planeta. Os poderes, e todo ser humano, devem refletir seriamente a provisoriedade do ser humano e de todos os seus poderes.
Nesse sentido, o papa Francisco, fiel à Palavra de Deus, nos dá esse testemunho de fixar os nossos horizontes naquele que é ressurgido, Jesus Cristo. Ele é a nossa esperança. É a partir disso que podemos sair das nossas ambiguidades e egoísmos. E como o Santo Padre Francisco espera que esses tempos de pandemia, tão dolorosos, possam propiciar uma reconstrução de outro modelo cultural, em que o evangelho possa ser assumido de verdade e seriamente. O mundo necessita desses valores que favorecem uma convivência mais fraterna, que promova cada filho/a de Deus também sob o aspecto socioeconômico e ambiental. A força e a sabedoria de papa Francisco nos trazem luz nessas trevas que estamos passando. É o Pedro de Deus!
A responsabilidade de quem comunica ao público
A palavra é um meio privilegiado para comunicar no papel, no audiovisual e no digital. Não tenho duvida de que quem comunica tem um poder relevante sobre o público. Aliás, tem uma grande responsabilidade que pode até determinar escolhas. Por isso, quem comunica deve sempre refletir a correta e objetiva comunicação.
Certamente, isto não é fácil, mas, pelo menos, deve agir na transmissão das mensagens, com total transparência. Isto se chama responsabilidade de comunicação, capaz de garantir conforto e luz para se viver melhor.
No entanto, se não tivermos responsabilidade, condicionaremos o próprio público a uma realidade de mentiras, de ansiedades e de desconfiança. Hoje em dia, a comunicação digital é determinante na vida comunicativa. Faz parte da essencialidade do nosso cotidiano. Se posso dar uma imagem do que representa essa comunicação digital, poderia compara-la a uma casa, porém, uma casa totalmente nova, onde passamos a maioria do nosso tempo nela. É aqui que se vive hoje, embora não a conhecemos muito bem. É nessa casa que devemos analisar passo a passo para que não aconteça tropeços.
Ter um conhecimento aprofundado tal dessa vida, nessa nova casa, que me permita evitar coisas ingratas e deturpantes. Não posso viver com o perigo e as ameaças, porque me tira a tranquilidade e a serenidade. Experimente pensar quando, por exemplo, uma porta de casa não se fecha ou uma torneira está vazando, logo a preocupação é tentar solucionar tudo isso. E, até que não seja resolvido, não vão ficar tranquilos. Assim é esse mundo digital que convivemos no dia a dia. Se não for bem conhecido, não conseguiremos domina-lo e, portanto, nos vai deixar perturbados e preocupados.
De fato, as fakenews são frutos desses não conhecimentos da realidade digital e, como consequências, se pode danificar a verdadeira notícia e todos que participaram nessa comunicação compartilhada. Desestabiliza a nossa vida! Assim sendo, é necessária uma educação digital que, por sinal, deve estar aberta para qualquer idade, a fim de que se possa entender toda a sua lógica, sua utilidade e natureza. Compreender como podemos conviver com ela para ter a máxima e correta capacidade comunicativa. Uma comunicação que exalta o ser humano e não que o degrade.
Criar regras que ajudem a ter comportamentos que se possam alcançar em favor da promoção das pessoas. Quando se comunica a vida não morre e, por isso, é sagrada a comunicação também digital enquanto favorece isto. Na medida em que se comunica, também nas redes sociais se cria vida. Mas, atenção: o importante é criar relação de união e não de divisão e conflito.
Entrar em relação com os outros é uma oportunidade para ter um intercâmbio de dons, de ajuda, como construção de uma vida de conjunto que favoreça, como nós estamos acostumados a dizer, a casa comum. Toda vez que nos abrimos aos outros para encontra-los também nessa comunicação digital temos uma grande chance de dilatar os nossos horizontes sem fim. É assim que se vai além da morte.
Dar alma à economia de amanhã
Um evento internacional em Assis, de 19 a 21 novembro, debaterá e estudará uma nova economia para fazer viver e não matar, incluir e não excluir. Estarão presentes mais de 2000 economistas e empreendedores, abaixo dos 35 anos, de 115 nações. Esta iniciativa é promovida pelo papa Francisco que “deseja que ajude a se encontrarem para se conhecerem e realizar um pacto para mudar a atual economia e dar uma alma à economia de amanhã”.
Essa crise mundial que estamos vivendo, provocada pelo coronavírus, põe em discussão também e, sobretudo, toda a economia. Portanto, como reanima-la? Em primeiro, lugar a escolha do lugar onde será debatido tudo isso. É a cidade de Assis. Ela nos relembra São Francisco e suas escolhas. Assis dá sentido a uma humanidade que precisa ser mais fraterna e solidária.
São Francisco se despojou de tanta materialidade para seguir Jesus Cristo, tornando-se pobre e irmão de todos. E, justamente, a partir dessa opção de vida, surgiu uma nova concepção de economia, que talvez pode ainda hoje nos iluminar e reger um mundo mais fraterno e atento a quem mais necessita. Um modelo econômico que possa ser fruto de uma cultura de comunhão e que se fundamente sobre a fraternidade e equidade. Isto é, que possa responder efetivamente ao projeto da Criação de Deus.
Não se pode ficar parado numa economia que visa maximizar os lucros e todo o resto não conta. Não pode existir uma economia que favoreça somente ‘alguns’. É urgente uma nova economia que possa favorecer as mudanças de vida que vão desde a ecologia até a convivência entre os povos e as próprias pessoas. Não podemos pensar numa economia integral sem uma vida integral dos povos. Nesse debate mundial de Assis, destaca-se que o papa faz ao contrário das grandes potências: no lugar de convocar economistas e empresários afirmados pela idade e experiência, convoca jovens que estão iniciando.
Creio que essa opção é maturada como a melhor e corajosa maneira de fazer mudanças na economia e no mesmo mundo a partir do projeto de Deus. Qualquer plano econômico deve sempre responder à Criação do mundo e ao seu Criador. Portanto, o papa Francisco, qual Pedro da Igreja, tem o direito de verificar e orientar para que uma a economia possa responder ao projeto de Deus.
Esses jovens têm as possibilidades de pensar e se questionar, inspirados por São Francisco, o que significa construir uma economia nova à medida para os filhos/as de Deus. Uma economia que exalte o ser humano como um todo. Será uma experiência bem profissional, que não deixa espaço à improvisação, em que terão reflexões, escuta de pessoas de alto nível profissional e reprovada afirmação no campo econômico e empresarial e, assim, tentar formular propostas de mudanças para a vida de hoje.
Precisamos reconhecer que uma mudança radical econômica inicia, reconhecendo que ouro e dinheiro não são os bens absolutos, mas são outros e que às vezes são invisíveis. Nenhuma economia funciona se antes dos produtos não sabemos discernir os bens.
Deus nos fala
“Entrou também o outro discípulo que tinha chegado primeiro ao túmulo. ele viu e acreditou.De fato, eles ainda não tinham compreendido a Escritura que diz: “Ele deve ressuscitar dos mortos.”
Depois do grande silêncio do sábado, que turbou e continua turbando ainda hoje a vida das pessoas, veio a Ressurreição do Cristo que ilumina a nossa história.
A Ressurreição de Jesus Cristo é o centro da fé, porém este evento tão importante teve dificuldade para ser entendido. De fato, os discípulos estavam desanimados, tristes e dominados pela experiência do sepulcro. Nós, seres humanos, somos demais atraídos e determinados pela dimensão terrestre. Somos capazes de fazer celebrações, fazer sepulcros, mas nada além disso. Por isso, vivemos incrédulos. Além do mais, diz o evangelho que dois discípulos correm para o sepulcro para averiguar a notícia que as mulheres lhe haviam dado.
O mais novo, João, chega primeiro, mas, reconhecendo Pedro, o escolhido por Jesus, o espera e não entra no túmulo. Depois que Pedro chegou e entrou, também ele quis ver. Isto significa que, na nossa caminhada de fé, tem uns que tem a capacidade de andar mais depressa que outros, porém o que importa é respeitar os tempos de cada um. O evangelista acrescentou que o discípulo amado viu e acreditou. A razão de o discípulo amado acreditar foi porque teve consciência de quanto Jesus o amou.
Portanto, para compreender a Ressurreição, é preciso passar pelo amor de Deus, como verdadeiro dom. É essa experiência do amor que nos abre os olhos e a mente pela verdadeira Vida.
A Ressurreição de Jesus é um acontecimento que contém também um julgamento: os homens condenaram Jesus com a cruz, no entanto, Deus o aprovou através da Sua Ressurreição. Isto significa que provavelmente as nossas maneiras de avaliar não são as mesmas de Deus.
Este grande evento, que está acima de tudo e de todos, nos leva a ter perspectivas de vida bem superiores daquilo que somos acostumados a ter. De fato, se mesmos os discípulos não tiveram capacidade de compreender as Sagradas Escrituras, que falavam da Ressurreição de Jesus entre os mortos, imaginem nós perante uma verdade tão extraordinária como a Páscoa?
Nem sempre a fé é fácil e nem sempre vive de resultados, às vezes, é pesada e ofuscada, mas a Ressurreição de Cristo nos guia e nos conforta sustentando a nossa caminhada como filhos e filhas de Deus. Assim sendo, para enxergar, perceber a Ressureição do nosso Mestre Jesus não são suficientes os olhos do corpo, mas precisa ter uma boa experiência interior, isto é, espiritual. Pergunto-te: como vives a Páscoa? É um compromisso de vida com Deus? Tem capacidade de deixar em segundo lugar os teus projetos de vida para deixar Deus falar na sua vida com todo o poder? Desejo-lhe feliz Páscoa, passagem para a vida nova que supera qualquer coronavirus.